Deu “reboliço” na internet a informação da compra do Diário de Pernambuco por alguém que é abertamente de direita. E daí? Como já pontuei aqui e em outros textos, reforço o que já é uma visão antiga: nada tenho contra que um veículo de comunicação ou jornalista assuma suas posições política e/ou ideológicas abertamente.
Tanto é assim, que eu faço isso: sou um conservador em sentido filosófico e os valores dessa postura são abraçados por mim, como a rejeição às ideologias seculares, a discordância com as pautas da esquerda, o repúdio completo ao comunismo, fascismo, nazismo, que são as atrocidades do século XX, como bem definido por Alain Besançon, no livro A Infelicidade do Século.
Creio até ser mais honesto com o leitor que isso seja assumido, de forma aberta. Assim, que tenhamos veículos liberais, veículos de esquerda, veículos conservadores etc e que essas vozes se choquem na democracia, na disputa de ideias e espaços. Aí, o leitor decida. Agora, qualquer postura no jornalismo deve ter por compromisso número um o respeito aos fatos. Diz uma assertiva antiga: “qualquer um tem direito às suas opiniões, mas não aos seus próprios fatos”. A honestidade intelectual passa necessariamente por isso.
Se um jornalista ou articulista em suas análises mentir, caluniar, difamar ou cometer qualquer crime, há de ser responsável por isso. Há penas morais, como a perda da credibilidade até as legais, quando extrapolar algumas fronteiras que lhe garante a liberdade de expressão. Simples assim.
Quanto a um veículo querer buscar o campo chamado da isenção, eis que é uma escolha também. O problema não é isenção em si, quando esta é uma ferramenta buscada honestamente. O problema é quando a chamada isenção serve de Cavalo de Tróia para que um jornalista ou veículo esconda suas reais intenções, suas convicções e posições prévias para se passar por isento sem o ser. É uma desonestidade condenável para o leitor.
Então, quem se espanta com o fato do Diário de Pernambuco poder se tornar - pois ainda é algo muito no campo hipotético, já que a convicção do dono muitas vezes não se espelha o corpo editorial - de direita, parece nunca ter se espantado com a maioria dos veículos de comunicação do país terem tendências à esquerda ou ao progressismo. Quer dizer então que um lado pode e o outro não? Que democracia é essa?
Nos anos da esquerda no poder, tivemos inúmeros veículos surgindo com um viés abertamente de esquerda e governista. Um dos exemplos é o Brasil 247, sem contar com toda uma blogosfera que se dizia “independente”. Nada tenho contra que eles existam, que empreguem jornalistas e que defendam suas bandeiras. A questão é quando o dinheiro público - de forma discricionária - sai alimentando essa rede. Sou contra essa grana alimentar uma rede seja de um lado ou do outro.
Por sinal, as verbas publicitárias - de qualquer que seja o governo - deveriam ser melhor repensadas. Por um motivo simples: é dinheiro público que poderia ser utilizado melhor de outra forma.
Não que seja contra verbas publicitárias, mas quero sim que elas sejam reduzidas e aplicadas com melhor critério técnico. Elas não podem servir para sustentar linhas editoriais ou para chantagens. Simplesmente isso. Dito isso, que todos os veículos de comunicação - com suas visões e linhas editoriais - passem a competir no mercado tendo como controle único de conteúdo a escolha do consumidor, que é o leitor. Liberdade total nesse sentido.
Desse ponto de vista, vejo como bom para a democracia que o Diário de Pernambuco - caso ocorra isso mesmo - venha com o viés assumido. Se fizer um trabalho ruim, pagará por ele. Se for bom, colherá os frutos.
Não subestimo o leitor. Quem acompanha os jornais impressos ou virtuais - hoje em dia - sabe muito bem que a interação tem sido um termômetro e, cada vez mais consciente, o leitor tem feito exigências e cobranças. É possível um jornalista separar as críticas e entender o que é joio e trigo nesse cenário. Afinal, quem vive da escrita sabe que tem que interagir com um público e a crítica à imprensa faz parte, como sempre fez. O jornalismo deve pensar e pensar a si mesmo também.
Repito uma sentença que já coloquei em diversos textos meus: democracia se faz de lados e não de um único lado. Ideias possuem o direito de existir. Por mais que eu repudie algumas, nunca, em minha vida profissional, preguei a subtração forçada delas. Apenas as denuncio quando as percebo como inconsequentes, já que ideias possuem consequências.
Com efeito, uma reflexão a mais:
Em um país onde a direita sempre foi demonizada como se fosse um corpo hegemônico, as discussões atuais trazem algo de positivo: desfazem mitos. Mostram a diferença entre liberais e conservadores e até mesmo as divergências internas nesses grupos.
Além disso, acaba com o espantalho medíocre de classificar ideias liberais ou conservadoras como “fascistas”. Já que o fascismo - de Benito Mussolini - quer o Estado tomando conta de tudo, quando vem com seu lema: tudo pelo Estado, para o Estado e com o Estado. Ora, nada mais avesso ao pensamento liberal (que o próprio Mussolini condenava) ou conservador. Se há um ponto comum entre liberais e conservadores é ambos quererem menos Estado na vida do cidadão.
Uma direita séria - pois picareta existe em todo lugar - se define como a defesa do livre-mercado, das liberdades individuais, da vida, da propriedade e - justamente dentro dessas liberdades - da livre expressão com a responsabilidade pelo que é dito, escrito e publicado.
Torço para que o Diário de Pernambuco se paute pelo bom jornalismo, que forme uma equipe - se for o caso - compromissada com a ética, com os fatos, que possa ser vigilante do atual governo federal, pois uma coisa é ser de direita e outra é ser governista. Isso não deve ser confundido mesmo quando um governo se declara de direita. Assim é possível elogiar os acertos e criticar os erros.
Lembro - que mesmo tendo minha postura - não posso fugir aos fatos e por isso já elogiei aqui pessoas que estão em campo de pensamento oposto ao meu quando acertaram, assim como já critiquei - quando achei que devia - pessoas que defendem bandeiras semelhantes às minhas. Já elogiei até o PT pela unificação dos programas sociais e por ter mantido uma matriz ortodoxa no início de seus governos. São pequenos acertos que se perdem em tudo de errado que foi feito, mas não deixam de ser acertos.
Quem se espanta demais por conta da possibilidade de existir um único jornal de direita no Brasil acaba por deixar claro o quanto prefere a hegemonia mesmo, por mais que se finja democrático de plantão…