Após o acordo de livre comércio firmado pelo Mercosul e a União Europeia – imensamente comemorado pelo governo federal do presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL) – entra em cena, mais uma vez, a confusão entre os termos “globalismo” e “globalização”. É que o atual governo – em especial nos discursos no ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo – já assumiu um discurso antiglobalista.

Para alguns, ao participar do fechamento de acordo, Bolsonaro cairia em contradição, pois a União Europeia é vista como um mecanismo do globalismo. Antes de mais nada, é preciso que se diga que o acordo firmado entre Brasil, Mercosul e União Europeia se dá após 20 anos. E aí, todos os que ajudaram nessa construção possuem seus méritos, como por exemplo, membros do governo de Michel Temer (MDB) e os personagens do governo de agora, como a ministra Tereza Cristina, Ernesto Araújo e o próprio presidente.

Isso sinaliza que saímos daquelas alianças de “anão diplomático” em que as relações do país eram estreitadas pelo viés ideológico, nos levando a apoiar e financiar – por meio de empréstimos fraudulentos, por exemplo – ações na Venezuela, Cuba e outras republiquetas. Só isso já é um ganho no cenário internacional.

Além disso, o acordo propicia margem de tempo para adequação da indústria nacional – em muitos setores – e assim encarar a concorrência, desenvolvendo e investindo em tecnologia. A aliança firmada entre Mercosul e União Europeia tem muitos pontos. Aconselho o leitor que observe cada um deles e como estes podem se desdobrar nos próximos anos. O que há de mais fácil nesse momento é assumir posições por conta de “paixões políticas” que desprezam os fatos para imporem suas narrativas.

Quanto mais liberdade econômica um país puder ter, mais desenvolvimento e investimento ele atrairá e isso impacta diretamente na qualidade de vida de seus cidadãos, na geração de emprego e renda, no fortalecimento do setor produtivo e na independência em relação ao poder coercitivo estatal.

O Estado deixa de ser uma babá, um empresário, e passa a se concentrar na prestação de serviços e na infraestrutura necessária para receber tais investimentos. Nesse quesito, se no Brasil fizer a lição de casa, reduzindo a máquina pública, cortando gastos, privatizando o que tiver de ser privatizado, ganharemos no cenário internacional também, seja por acordos multilaterais ou bilaterais.

Estaremos entre os grandes e não entre os anões diplomáticos.

Agora, no que se diferencia a globalização do globalismo?

Bem, a globalização é um fenômeno sem volta que coloca os países – necessariamente – em um processo de diálogo para acordos firmados que possuem resultados econômicos, pelas trocas em mercados, ou culturais em função da absolvição de valores, produtos, enfim. Sendo assim, tomando por exemplo o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, se o acordo tem por norte o livre mercado, o comércio entre os países, a troca de produtos ou até mesmo mudanças em relação a forma como lidarão com suas fronteiras para países aliados, temos um processo de globalização.

Nenhum país que queira prosperar pode estar isolado do mundo. É preciso estabelecer esses diálogos e buscar ao máximo o jogo do “ganha-ganha”, pois – como é lição básica da economia – não há jogo de soma zero, onde só um lado ganha e só o outro perde. A diplomacia dentro da globalização busca esses resultados. Agora, a busca se faz sem perder a soberania nacional e sem deixar que países estrangeiros ou mecanismos internacionais interfiram nos poderes constituídos pela democracia do próprio país para impor uma agenda política e/ou ideológica.

É aí onde reside a diferença.

O globalismo é a construção de mecanismos de controle internacionais que visam interferir diretamente nas soberanias nacionais por meio de acordos. Ultrapassa a questão econômica e as demais expostas aqui para se ter uma agenda política imposta, independente do mérito desta. O país que adere a visão globalista é obrigado a aceitar todas pautas do bloco ao qual pertence. E aí, entram acordos climáticos, de legislações a serem impostas, de mudanças de valores e de uma série de coisas que são discutidas por burocratas não eleitos, passando por cima dos parlamentos locais, empurrando de cima para baixo.

Em menor escala é o que o Foro de São Paulo tentou fazer – e aina tenta – na América Latina. O problema não é a ONU em si, o Mercosul em si ou a União Europeia em si, mas como estão esses agentes no jogo político e qual o papel do Brasil nessas relações, a que se submete ou não.

É o que ocorre, por exemplo, com a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). Não importa o mérito dessa agenda, pois ela vai sendo disseminada dentro das nações sem levar em conta o poder legitimado pelo povo. Assim, se impõe mudanças em relação ao aborto, à concepção de direitos humanos, a restrições de liberdades etc.

Se o acordo firmado entre o Mercosul e a União Europeia deixa o globalismo de fora, é uma vitória do governo e não tem contradição alguma com o seu discurso. Agora, para isso é preciso observar todo o acordo assinado, analisar ponto a ponto e perceber quais foram as concessões e quais foram os ganhos.

Infelizmente, estamos em períodos que as pessoas simplesmente ouvem uma palavra – como ‘globalismo’ e ‘globalização’ - e já vão as encaixando em qualquer discurso, muitas vezes sem saber o que elas significam realmente.

É óbvio que há linhas tênues, pois o globalismo se impõe justamente por dentro do processo da globalização. A linha é tênue, mas os efeitos não. A globalização pode fazer um país se desenvolver e alcançar posição de destaque para negociar com o mundo diante do fato de se tornar uma referência em setor ou setores. O Brasil – por exemplo – possui diversos potenciais inexplorados onde pode se tornar destaque, bastando desenvolver tecnologia e romper amarras.

O globalismo – por outro lado – torna o país submisso dos interesses de blocos internacionais dentro de uma geopolítica cujos grupos de comando possui interesses próprios. Isso ocorre com o bloco dos metacapitalistas – formado por George Soros e outros – que atingiram o topo da riqueza e não são muito fãs do livre mercado justamente por entender que é preciso impor regras para eliminar eventuais concorrências naquilo que controlam. Para isso, usam da política e de mecanismos internacionais, ONGS e o todo o terceiro setor para imporem as suas agendas.

Não há um só globalismo. Pois qualquer corrente política que trabalhe para impor sua visão ao mundo e assim assumir o controle do máximo que puder é uma espécie de globalismo. É o caso, por exemplo, da visão eurasiana de Vladimir Putin, que trabalha suas alianças com Rússia e China e quer o enfraquecimento da União Europeia para poder ampliar domínios no Leste Europeu. Há um livro – recém-publicado no Brasil – que trata disso: chama-se Na Contramão da Liberdade de Timothy Snyder. Lá se observa o motivo do interesse de Putin em se aliar a determinadas direitas na Europa.

Se o leitor se aprofundar no assunto, vai descobrir outros projetos globalistas. Uma dica introdutória são os livros do brasileiro Alexandre Costa: Introdução à Nova Ordem Mundial e O Brasil e a Nova Ordem Mundial. Vale a leitura também de Nicholas Hagger, chamado a A Corporação, ou ainda as obras de Cliff Kincaid. São aulas de geopolítica.

Infelizmente, nessa área há muito joio e trigo, o que faz com que se alimentem versões conspiracionistas estapafúrdias. Então, é preciso cuidado nas leituras. Mas, se o leitor quiser se aprofundar, deixo aqui uma lista: A Invasão Vertical dos Bárbaros de Mário Ferreira, Desinformação de Ion Pacepa, Contra o Cristianismo: a ONU e a União Europeia como nova ideologia de Eugene Roccella e A Conspiração Aberta de H.G Wells.

Será um bom início para – do ponto de vista histórico – entender como o mundo político funciona.

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