Já destaquei isso em outros textos de minha autoria – seja aqui nesse blog ou em outros espaços nos quais escrevo – e repito agora: vejo toda manifestação popular em torno de pautas que discutem o país como legítimas, desde que ordeiras, pacíficas e respeitando os limites do Estado Democrático de Direito para as expressões dessas vozes.

Dito isso, vejo como condenável as badernas, quebra-quebra, atos de vandalismo contra o patrimônio público e tudo que é constituído como ilicitude. Fora disso, o que cabe é concordar ou não com as pautas postas e assim analisá-las.

Portanto, mesmo uma manifestação – por exemplo – que seja contrária a pautas que eu defendo ou que venha a defender o que eu não concordo, é legítima por ser parte da democracia. Jamais tomarei as pessoas que ali estão por imbecis, idiotas etc. Há muita inteligência em vozes discordantes. 

Meu foco será a pauta, condenando apenas eventuais exageros, apontando a razão das divergências ou das concordâncias.

É que uma democracia tem lados e não apenas lado. Dentro de um espectro político é natural, portanto, que haja uma esquerda e uma direita e que – dentro dessas – cada uma possua seus degradês, pois nem tudo cabe numa caixinha partidária, ideológica ou partidária-ideológica. É o caso, por exemplo, numa direita haver o natural embate entre liberais (em sentido clássico) e conservadores.

Eu discordo – e isso não é segredo! - completamente da agenda de esquerda muito antes de existir o atual governo. É direito democrático!

No dia de ontem, 26, muitas pessoas foram às ruas em apoio ao presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL). Mas, não apenas isso. Pautas, que possuem até uma natureza complexa, aglutinaram pessoas que demonstraram a sua visão dentro da democracia. É legítimo. Fizeram isso de forma ordeira, pacífica e sem registros – até onde pesquisei, pelo menos! - de qualquer violência, baderna etc.

Em essência, essas pautas eram: o apoio à Reforma da Previdência elaborada pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes; à reforma administrativa, ao pacote anticrime do ministro Sergio Moro e com críticas ao Centrão, por entenderem que o bloco de deputados federais - que são mais fisiológicos que ideológicos - trava essas mudanças por conta de interesses político-partidários.

O Centrão quer manter uma estrutura estamentária de “governalibidade” na base da troca de cargos, favores, influências, que são práticas que descaracterizaram a independência entre os poderes, sendo estes pesos e contrapesos da democracia. Sobrou também para o ativismo judicial de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A Suprema Corte é hoje criticada por seus próprios atos. Há substância na crítica, como quando ministros tentaram calar vozes discordantes ou quando usurpam as funções do Legislativo.

Desde a fundação da nossa nova República (redemocratização) que o Congresso – assim como muitas casas legislativas pelo país – se acostumou a ser um “balcão de negócios”, dentro de um lobby político que, mais tarde, serviu de base para os mensalões da vida. Isso condenou o país a voos de galinha na Economia, ausência de reformas estruturantes que promovessem de fato uma modernização e criou uma casta, junto com “amigos do rei”, que fez do BNDES um cofre para quem estivesse mais próximo do poder.

Tudo isso sem contar com a burocratização e o centralismo das decisões, que são alimentadas pelo nosso pacto federativo. Nossa própria Constituição se tornou inflacionária, apesar de achar – registro! - que não temos condições de Constituinte tão cedo, pois o ambiente é perigoso.

E não é preciso nem um autor de “direita” para entender isso. O intelectual Raimundo Faoro, que é de esquerda, faz esse diagnóstico sobre o poder do estamento burocrático brasileiro em suas obras, com destaque para Os Donos do Poder. Esse livro é surpreendente. 

Some-se a isso tudo que ocorreu recentemente nesse país, com os maiores escândalos de corrupção como projeto de poder, e é de se entender a revolta popular com os congressistas e tantos outros políticos. Bolsonaro representou a ruptura com esse processo. Se vai se concretizar ou não, é com a História. Afinal, como todos os governos, esse também tem seus problemas. Pode ser que existam erros – por parte inclusive do Executivo – que produza mais uma frustração. No Brasil, a coisa mais difícil é a previsibilidade.

Que a população cobre diálogo mais transparentes e pautados pelos méritos das reformas e não pelos jogos de interesses secundários, é algo legítimo no mérito e na forma. O que não é legítimo, no mérito, é o que surge de algumas vozes minoritárias – que de fato existem – que pedem o fechamento do Congresso e do STF. Isto sim é antidemocrático. O próprio Jair Bolsonaro, em algumas de suas falas, como na entrevista concedida ontem à Record, afastou essas pautas e sinalizou com pontes para articulações (a legítima) com o presidente da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia (Democratas), assim como para o presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (Democratas), que assim seja. Agora, é hora da racionalidade em nome do país e não de político A ou B.

Se Executivo, Legislativo ou Judiciário tensionarem ainda mais essa corda, será péssimo para o país. Isso inclui o presidente Jair Bolsonaro ter mais cuidado com suas declarações. O tom adotado ontem, na entrevista à Record, é que é o correto.

Além disso, foi perceptível que aqueles que cobram o fechamento de instituições formam a minoria da minoria, apesar de alguns tratarem fatos isolados – dentro de estratégias de narrativa – para classificar o todo. É uma bobagem dizer que os que estavam nas ruas ontem são analfabetos, truculentos, fascistas ou outros adjetivos que nascem por aí. Primeiro: é preciso reconhecer o direito legítimo das pessoas de se manifestarem em uma democracia, seja para o que eu concordo ou para o que eu discordo. Segundo: havia pautas cujos méritos foram debatidos, ainda que misturado a discursos de ordem ou inflamados, que faz parte de uma manifestação política. Todas elas possuem isso.

Nas ruas estavam estudantes, profissionais liberais, empresários, trabalhadores, enfim… todo tipo de pessoas. No meu caso, por exemplo, comungo da necessidade das reformas. Não sei tudo sobre tudo, por isso me coloco sempre na posição de estudante. Minha vida estudos diários, tendo lido inclusive obras de economia que vão de keynesianos à Escola Austríaca, passando por autores brasileiros etc, autorizam-me a deixar claro que não sou um analfabeto, muito menos truculento, muito menos defensor de qualquer tipo de regime abusivo, uma vez que rejeito todo processo revolucionário, seja ele fascista, nazista ou comunista.

Ao contrário, defendo a redução do poder coercitivo estatal para cima do indivíduo, o respeito à vida, às liberdades, à propriedade e o estímulo ao empreendedorismo e à geração de emprego e renda, para que tenhamos mais oportunidades para as futuras gerações, sem mentalidade estatista que tanto prejudicou o país nas últimas décadas. Por isso, acho que precisamos de uma outra lógica de previdência, de uma profunda reforma tributária que tire o Estado das costas do cidadão, que esse mesmo Estado foque em serviços – como Educação, Segurança e Saúde Pública – e descentralize seu poder de decisão, tornando municípios e unidades federativas mais independentes política e administrativamente.

Tudo isso depende de um governo? Infelizmente, não! A discussão é mais profunda!

Vi muita gente defendendo as pautas que eu defendo nas ruas, mas variando – obviamente – no grau de entendimento sobre as pautas, o que é natural em um país que não tem privilegiado a Educação como deveria. Uns sabiam mais que eu, outros menos. 

No mais: qual o problema das pessoas divergirem em diversos assuntos? É da democracia. Repito: ela se faz com lados e não com lado. Portanto, em vez de achincalhar pessoas, a discussão deveria ser de mérito, refletindo nas consequências da pautas. Nesse ponto, se alguém disser que é contra fechamento de Congresso e STF, eu já digo de antemão: eu também! Se alguém defende isso, tem meu repúdio já de saída.

É essa a discussão que torço para um dia existir no país: rica e em cima de pautas. Jamais, caro leitor, criticarei o legítimo direito à manifestação por parte de quem quer que seja. Acredito, por exemplo, que a oposição ao governo tem todo o direito de se manifestar e expor sua visão de mundo. Se concordarei ou não, é outra História. É óbvio que algumas críticas podem fazer sentido e serem verdadeiras, independente da origem.

No caso dos protestos que ocorreram contra o presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL) após o anúncio de “cortes” na Educação, friso: é um direito – dentro dos limites postos pela lei no ambiente democrático – que pessoas se manifestem. Muitas críticas feitas ao Ministério da Educação do atual governo federal são legítimas e possuem razão de existir. Eu mesmo já fiz algumas: acho que o MEC caminha de forma lenta, falha na comunicação e – durante o início da gestão – ficou refém de brigas menores, sem que o ex-ministro Ricardo Vélez conseguisse tomar posições. Foram somando-se os desencontros, os recuos e a pasta ficou ingovernável.

Resultado: mudança no primeiro escalão. Mas havia um “capital” acumulado em relação ao MEC do atual governo.

Com o novo ministro houve uma falha de comunicação insistente em relação ao que seriam os “cortes”. Somente depois ficou claro que são contigenciamentos, muitos destes já praticados por outros governos, inclusive os petistas, diante dos orçamentos deficitários, como ocorreu, na gestão de Dilma Rousseff (PT).

O contigenciamento – que é de 3,5% - foi tratado como um corte de 30%, o que não corresponde à verdade. Houve um público difuso ali: alguns preocupados de fato com uma pauta sensível, que é a Educação no país (esta acumula índices terríveis desde muito tempo), ainda que em meio a informações desencontradas, mas também aqueles que queriam “sequestrar” o momento para impor outras pautas, como o “Lula Livre” e a “Reforma da Previdência”. É inegável!

A esperteza das legendas de esquerda opositora levou muitos às ruas para uma recuperação da credibilidade, dentro de uma estratégia política e ideológica. Não digo, entretanto, que tenha sido o ânimo de todos os presentes. Acredito até que o presidente se comunicou mal ao criticar tais manifestações, jogando querosene na fogueira. Que ele tivesse reconhecido que houve sim ali o aproveitamento político por parte de partidos opositores, mas dentro de uma declaração mais cirúrgica e sem – como ele mesmo já colocou em outras falas - “caneladas”.

O presidente tem sim algumas responsabilidades sobre o desdobramento do que diz. Hoje, essa aumenta em função de não ser mais um candidato.

No mais, todo governo – seja Bolsonaro ou qualquer outro – existe para ser vigiado, fiscalizado e é passivo de críticas e deve aprender a lidar com elas, para separar o joio do trigo. Nem todo crítico é um adversário e nem todo adversário é alguém motivado apenas por interesses inconfessos. Achar que todo mundo que faça uma crítica ao governo é já um “comunista” é uma bobagem. Como disse acima, há degradês.

Estou no twitter: @lulavilar