No uso da tribuna legislativa, no dia de hoje, 17, o deputado estadual Davi Maia (Democratas) fez um excelente discurso e marcou sua posição liberal na Casa de Tavares Bastos de forma conceitual. Maia atacou a ideologia de esquerda substanciado em argumentos, dados históricos e se valendo de autores. Independente de qual seja o lado, pois em uma democracia, sempre haverá de existir esquerda e direita, substanciar o que se pensa para construção de um discurso em um parlamento deveria ser atividade diária. Infelizmente, não é!
Maia foi à tribuna para falar sobre o preconceito contra o ser humano em função de sua orientação sexual. Ora, como qualquer outro preconceito, é sim um ato repudiável. Ninguém pode ser discriminado por conta da etnia, classe social, posição política ou questão sexual. O ser humano precisa ser respeitado pelo simples fato de ser humano. O parlamentar destacou isso muito bem. Todavia, não esqueceu de pontuar que muitos que se arrogam monopolizadores de virtudes apenas instrumentalizam as causas – algumas até justas, como o combate ao preconceito – para interesses políticos, sejam partidários ou ideológicos.
Ideologia passa a ser – então – um conjunto de ideias que escondem um fim político inconfesso, que muitas vezes abriga até meias-verdades. Logo, é comum, muitos grupos associados às esquerdas se colocarem como os únicos defensores de determinadas pautas, que englobam as liberdades individuais, e jogar nos outros – que discordam de suas ideias – o rótulo de “fascista” e todos demais termos que acabam em “fóbicos”.
Davi Maia lembrou que a premissa da defesa das garantias das liberdades individuais está associada a clássicos do liberalismo, que enxerga o indivíduo como a menor minoria, tendo ele direito a viver sua vida como bem entenda, desde que sua liberdade não prejudique aos demais, pois enxerga o direito à vida como supremo e até pré-civil, como ocorre com a liberdade e com a propriedade. Uma das provas disso são os escritos de Frédéric Bastiat, como na obra A Lei.
Sem citar diretamente, o deputado estadual mostrou o conceito de “moral elástica”, que é quando as bandeiras passam a ser seletivas em função das circunstâncias políticas ou de quem seja o governo. É como no recente caso envolvendo Cuba, onde uma manifestação LGBT foi reprimida por forças policiais, mas imperou o silêncio entre muitos ideólogos de esquerda.
O bem e o mal humano não podem ser divididos em caixinhas ao sabor de ideologias, como se uma visão política institui-se o monopólio das virtudes em quem a professa. Não é uma causa simplesmente que enobrece o homem, mas sim como ele vive a sua vida e como enxerga o próximo. Sendo assim, encontraremos pessoas ruins na direita e na esquerda. Ao defender suas ideias, Maia pontou que, como liberal, defende o respeito ao ser humano independente de qualquer coisa. Não sou um liberal, mas nisso concordo com ele.
O deputado estadual ainda pontou os regimes totalitários do século XX que desrespeitaram completamente a liberdade individual e perseguiram pessoas, incluindo homossexuais, como fez o tirano Joseph Stalin. As ideologias do século XX – como bem coloca o pensador Alain Besançon – foram de fato nefastas, gerando milhões de mortos. Nazismo, fascismo e comunismo são verdadeiras tragédias da humanidade, com genocídios em tempos de paz.
Ficou absolutamente claro, no discurso, que a postura do pensamento da direita liberal é pelo respeito ao próximo acima de tudo, sem prejulgamentos em função de questões que não ditam caráter. Todos precisam ser respeitados em sua dignidade, terem direitos iguais, serem iguais perante a lei e todo preconceito deve ser tratado na forma dessa mesma lei, num combate constante a qualquer tipo de discriminação. Se há discriminação, há crime previsto em nossos códigos. Quem o fizer, responda. Independente de qualquer matiz ideológica.
Eis alguns pontos pelos quais parabenizo o discurso de Maia.
Agora, tenho uma crítica: o deputado estadual acaba cometendo o erro que tanto condena, que é – querendo ou não – trazer para sua posição política a virtude máxima da defesa da liberdade e do respeito à diferença. Ele – em sua fala – jogou o conservadorismo filosófico no colo de ideologias autoritárias. É um desconhecimento profundo da posição que tem, em sua herança, verdadeiros defensores da liberdade.
Há divergências entre liberais e conservadores? Sim! Mas isso não autoriza Davi Maia a colocar o conservadorismo como uma ideologia de esquerda. Que ele tenha sua divergência com os conservadores, ora bolas! O bom debate se faz justamente no campo das ideias. Mas que não propague o erro tão comum em quem quer apenas demonizar um outro lado.
Se Maia pegar o pensamento de um Roger Scruton vai observar ali a defesa da liberdade, do indivíduo e da pluralidade na sociedade, reconhecendo apenas que há uma moral objetiva que não permite que relativizemos tudo. O mesmo se dará em Edmund Burke, que foi uma das primeiras vozes a se insurgir contra a tirania praticada pela Revolução Francesa, em nome da razão. Scruton foi outro que – em sua rica obra – criticou densamente pensadores de esquerda. Cito dois livros dele: Tolos, Fraudes e Militantes e Os Novos Pensadores de Esquerda.
Aconselho a Maia essa leitura.
O que o conservadorismo filosófico critica – como bem posto por Michael Oakeshott – é a crença cega em um racionalismo político que visa construir a sociedade perfeita, o novo homem, como prometido pelas ideologias. Nisto, o conservadorismo filosófico se volta a uma crítica ferrenha às esquerdas por enxergar muitos de seus intelectuais como “engenheiros-sociais” querendo dizer qual a melhor forma de viver com base em teorias.
O conservador é um tanto cético em relação a fé demasiada na política e entende – por princípios – a defesa da liberdade econômica, bem como de outras liberdades. Enxerga a vida como valor supremo e transcendente e quer um Estado de poder coercitivo limitado para que o indivíduo não seja sufocado. Ele entende a importância da História para que delas tiremos lições e valores para – em nome de revoluções – não jogarmos fora o bebê com a água suja do banho.
Afinal, sempre estaremos subindo nos ombros dos gigantes que vieram antes de nós para aprendermos com os erros e as conquistas da História. Sendo assim, observar os valores para – como diz Ortega y Gasset – entendermos o que não se banha no rio do tempo é uma postura no mínimo inteligente para garantirmos o progresso. E neste progresso, todas as pessoas devem ser respeitadas.
O conservador não é – deputado Davi Maia – um reacionário avesso às mudanças e preso ao passado. Esse mito é desfeito em um livro simples chamado As Ideias Conservadores de João Pereira Coutinho. Sendo assim, não se pode jogar a postura na esquerda. Seria o mesmo que um conservador – por conta das divergências com liberais – classificá-lo como um comunista.
Mas, fora essa ressalva, parabenizo o deputado Davi Maia pela explanação feita na Assembleia Legislativa e por defender a liberdade das pessoas viverem suas vidas e sejam respeitadas, por combater o preconceito e discriminações de qualquer espécie. Afinal, amar ao próximo é dever. Ter sempre em si humanidade também. Respeito é palavra de ordem!
Maia tem sido um bom quadro no parlamento estadual. Propôs a Frente Pela Liberdade, tem sido combativo e oxigena o debate. São qualidades que respeito. Porém, como homem público sabe que também está sujeito à críticas. Aqui busco travar esse debate e solicitar que Maia leia mais sobre as outras posições de pensamento dentro da política para não acabar utilizando-se de rótulos, pois como liberal deve saber o quanto também sofre com isso.
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