Por qual razão insisto em resgatar a memória do político e intelectual alagoano Aureliano Candido Tavares Bastos? Considerado o precursor do pensamento federalista no Brasil, Bastos é sinônimo de coragem na exposição das suas ideias sem se render ao pensamento dominante de um tempo.

Ele confrontou oligarquias e pagou um preço. Há – evidentemente – muito de sua obra que soaria datado aos dias atuais, pois retrata um país do século XIX.

Todavia, era um visionário que aliava algumas posições liberais a outras conservadoras (mas não era um conservador!) para falar de verdades que não se banham no rio do tempo e, desta forma, defender a liberdade de um povo, a livre iniciativa e o empreendedorismo, quando a palavra nem era usada.

Autor de A Província e Cartas do Solitário, o escritor fez questão de conhecer o Brasil profundo e defender a sua integração sem impor uma centralização, mas destacando as potencialidades de cada região, como nas viagens em que fez ao Amazonas.

Bastos já falava – ali – da necessidade de não deixar alguns brasileiros para trás no processo de desenvolvimento. Ao invés de tratar raízes culturais como peças de zoológico, via nelas a necessidade da preservação histórica sem dissociar do progresso. Entendia que o potencial de cada região – como a defesa da agricultura – era o motor de desenvolvimento para a atração de novas tecnologias, não deixando o país preso ao conceito de mero fornecedor de matéria-prima.

Para isso, o intelectual alagoano já frisava em longínquos tempos: é necessário que o poder federal seja menos descentralizado e que os políticos tenham mínima influência sobre o setor produtivo, garantindo aos homens às condições de trabalho livre para gerarem riqueza e assim compartilharem do que produzissem. O pensamento de Bastos fez dele um pioneiro no abolicionismo e na ideia de uma inversão de pacto federativo para a resolução dos problemas.

O cidadão e seus valores deveriam estar acima do Estado e não o contrário. Na obra de Bastos, encontramos um pouco do pensamento político de Frédéric Bastiat de que a lei deve existir para proteger o individuo do poder coercitivo estatal. Para Tavares Bastos, o estado centralizador era um corruptor de tudo, inclusive da moralidade rebaixando os homens às vontades imposta por seus governantes.

Uma das grandes lições do escritor é afirmar que o Estado gigante corrompe as elites com benesses e domina os mais pobres pela distribuição de migalhas. Assim, ao usurpar a esperança de todos na crença de um futuro, rouba a autonomia de um povo e mata o seu senso de moralidade. Qualquer semelhança com o Brasil atual não é coincidência.

Como mostra um autor mais moderno – o escritor Raimundo Faoro, em Os Donos do Poder – criamos, ao longo do tempo, um verdadeiro estamento burocrático travestido de democracia, onde as lideranças econômicas se associam as lideranças políticas para limitar as escolhas dentro de um projeto de poder oligárquico.

O poder ficou tão centralizado que fundamos uma capital – Brasília (DF) – que se isola no centro do país. Por lá, Executivo, Legislativo e Judiciário concentram decisões de forma encastelada. Tomamos o caminho, na História, que era tão criticado por Tavares Bastos. O Estado fica cada vez mais caro e mais ineficiente em seus serviços e o que deveria ser assistência social vira assistencialismo.

As consequências nefastas das visões oligarcas se fazem presente ainda pelo interior do país, no qual cidades inteiras não possuem autonomia administrativa e financeira e acabam reféns de repasses de um pacto federativo que coloca todos os recursos nas mãos da União. Bastos era um republicano, mas não um positivista como os militares que golpearam o império para implantar a nossa República.

Se vivo, na época, teria sido um opositor da visão de Marechal Deodoro e Floriano Peixoto. Porém, morreu cedo: aos 36 anos de idade.

É esse Tavares Bastos que precisa ser resgatado para além dos elogios em sessões especiais. Necessitamos de suas obras presentes em livrarias, de ensaios sobre o seu pensamento, da sua discussão sobre o federalismo, dos textos em que tratou da problemática da Educação. Enfim, é uma voz do passado que tem muito a dizer para o presente e para o futuro.

Como coloca o filósofo Edmund Burke, não há progresso sem subirmos nos ombros dos gigantes. Em que pese o pouco tempo de vida que teve, Aureliano Candido Tavares Bastos foi um gigante.  

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