Como não leio o que está para além de linhas - e por vezes - entrelinhas, não falarei aqui das intenções do Conselho Reginal de Psicologia de Alagoas (CRP/AL) ao divulgar, nas prévias carnavalescas, um panfleto que ensinava o uso das drogas ilícitas de forma a reduzir o danos. O troço é tão aberrante que eu custei a acreditar que era um material de fato produzido pela entidade. 

Não há ali nada de conscientização. E isso começa (detalharei no texto) pelo "(res)PIRA" presente no panfleto. 

A dúvida só me foi tirada quando o TNH1 fez matéria sobre o assunto e ouviu a presidente do CRP-AL, Leuza Farias. Na reportagem, ela confirma a veracidade do panfleto e diz que a intenção da Comissão de Direitos Humanos foi esclarecer sobre o uso de drogas ilícitas e lícitas e garantir a redução aos danos, conforme determina o Sistema Único de Saúde. 

O problema é que o ato acaba ganhando uma "cara" de apologia, uma vez que ensina a "melhor" maneira de usar. 

Não há polêmica nisso. Uma vez que as drogas são ilícitas e são muitos os trabalhos - inclusive na área de psicologia - destacando os efeitos destas, muitas vezes associados  a atos de violência, dentre outros males derivados da perda da consciência. É um desserviço. E isto acaba ficando notório na fala da própria Leuza Farias. 

Para mim, não há polêmica. O foco dos profissionais da Saúde deve ser outro.

Vejam o que ela diz ao TNH1:

"Nossa função é esclarecer, não é incentivar o uso de nenhuma droga, mas reconhecemos que na sociedade o uso existe. Falamos sobre substâncias psicoativas, que todo mundo sabe que existem, mas quem usa não diz". 

O esclarecimento deveria ser - dentro dessa óptica - justamente dos males causados, buscando a conscientização para o não uso das substâncias ilícitas. Afinal, se a própria entidade entende que tem por objetivo não incentivar, o que ela acredita que acontece a partir das dicas sobre a melhor forma de usar reduzindo os danos?

Reconhecer que um mal existe na sociedade - e o próprio Conselho sabe dos males de substâncias como cocaína e LSD (que constam no panfleto) - é combatê-lo de forma objetiva. Crimes existem em sociedade. Em função disso, se faz material dizendo qual a melhor forma de realizá-lo ou refletindo sobre as consequências? Na minha visão, trata-se de escolher a segunda opção. 

Ela diz ainda que há pessoas "que acham que é errado. As pessoas acham que não falando a respeito das coisas é como se elas não existissem". Não se trata disso, senhora Leuza Farias. É claro que o assunto deve ser abordado, como faz por exemplo, o PROERD nas escolas e o trabalho de diversas entidades apontando os males causados por essas drogas ilícitas. 

Quanto às lícitas, veja que o mesmo trabalho é feito no sentido de desestimular o consumo, como o caso do álcool associado à moderação e as campanhas antitabagistas. Ora, se é assim com as lícitas, imagine as ilícitas. Basta olhar as imagens no fundo das caixas de cigarro. 

Ninguém está dizendo que não se deve discutir o assunto, senhora Leuza Farias. Apenas que materiais didáticos sobre o uso "correto" das substâncias não é o efetivo combate a essas, quando se sabe os males causados não só para quem usa. Portanto, não se trata de eliminar a discussão da sociedade, mas criticar a forma como o CRP-AL resolveu fazer sem medir as consequências de seu ato. 

Custava um panfleto claro e objetivo fazendo referência às consequências dessas drogas para a Saúde do usuário e para a sociedade? Ou elas não existem. O dependente químico precisa de conscientização e ajuda e não de estímulos. 

Farias ainda compara às campanhas do uso da camisinha. Não faz o menor sentido. O preservativo é uma forma de evitar consequências graves do sexo casual consentido ou da gravidez, tanto no casual como nos relacionamentos outros. Ali se fala em DSTs, por exemplo e não em efeitos alucinógenos que podem colocar em risco o usuário e terceiros. É uma comparação absurda. 

Tanto que quem critica as campanhas de preservativos - e eu não sou um deles! - o faz por conta de outros fatores, como o incentivo a sexualidade precoce etc. Mas não por representar uma questão de saúde pública, combater DSTs e gravidez indesejada, o que muitas vezes resulta em aborto. Portanto, separemos as coisas ao invés de criar comparações exdrúxulas para justificar uma "polêmica". 

Quando a senhora diz que "educação é saúde", coisa que eu concordo, reflita se ensinar o uso "certo" de drogas ilícitas de forma a reduzir danos é promover saúde, ora bolas. É válido lembrar que "reduzir danos" é saber que eles estão lá, incluindo a não redução dos maiores problemas dos vícios nessas drogas e o que eles alimentam no corpo social, mesmo quando causam menos efeitos nocivos no usuário. Simples assim. Entende? 

O CRP-AL errou! Com qual intenção cometeu o erro é coisa que não sei, mas digo: errou! A conscientização deveria ser sobre os males dessas drogas em si, sejam elas lícitas ou ilícitas. Isto sim seria um benefício à sociedade a partir dos conhecimentos científicos que esses profissionais possuem. 

Acaso se um dependente procurar um psicólogo ou psiquiatra, o trabalho será no sentido de livrá-lo dos maiores danos do vício ou de eliminar este da vida do paciente? A resposta mostra claramente o objetivo primordial do Conselho. E é claro que é possível estimular a discussão e fazer projetos, panfletos e propagandas dentro desse objetivo. 

É tão presente isso que muita gente custou a acreditar que o material distribuído nas prévias carnavalescas fosse algo sério e ligado ao Conselho. 

Afinal, analisem o próprio texto produzido pelo CRP-AL e verão que nada há de conscientização sobre o uso em si. 

Isto começa pelo título, no qual se lê a seguinte mensagem: " (res)PIRE: reduzir para aproveitar". O "res" vem entre parênteses e em caixa baixa, enquanto o PIRE vem com mais destaque. Ora, qual o sentido de PIRAR mesmo em quem busca os alucinógenos? 

E o tal "reduzir para aproveitar"? O que seria aproveitar? Aproveita-se aquilo que é bom, entrega-se aos efeitos disso - nesse contexto - que é diversão. Em uma festa popular, tal diversão deveria ser estimulada a ser sadia. Afinal, isso é saúde. Entendem ou não o problema do texto montado? Até aqui não há a tal conscientização defendida pela presidente. 

É o texto do próprio CRP-AL.

Depois se fala de "Ação educativa para a redução de danos" e são citadas as drogas maconha, loló, thinner, lança perfume, cocaína, LSD, ecstasy, MDMA. Vamos das leves às pesadas com ensinamentos de como usar. Em nenhum momento do texto se fala dos malefícios destas à saúde, que deveria ser o foco prioritário. 

É uma peça publicitária de péssimo gosto. E é o texto desse conteúdo por si só que desmente a presidente Leuza Farias. Seria mais honesto pedir desculpas e ressaltar que a intenção era outra. Isso mostraria que o Conselho respira antes de projetar suas ações na sociedade. Respirar é melhor que (res)PIRAR, presidente.  

Estou no twitter: @lulavilar