Uma bibliografia das mais básicas a respeito do Fascismo é do professor de Sociologia da Universidade de Califórnia, Michael Mann. Na obra, há um vasto estudo sobre características e raízes do fascismo.

Autor também de O Império da Incoerência, Mann destaca o quanto o termo foi vulgarizado no tempo para definir qualquer remoto traço de autoritarismo em uma postura, esquecendo de alguns pontos básicos inerentes a doutrina do fascismo, que é a estatização radical e os meios paramilitares para atingir isso, perseguindo o inimigo até mesmo com a eliminação física.

Outro estudioso, que é Zeev Sternhell, frisou que só é possível falar de fascismo diante de um corpo doutrinal sólido, que inclui a visão anti-liberal e o doutrinamento ideológico para levar massas à submissão do Estado. Mann salienta que o estatismo é o terceiro ponto no tripé que define o fascismo, estando associado ao ultranacionalismo orgânico para implantação de um socialismo de fronteiras estabelecidas e ao paramilitarismo.

Fora disto, diz Mann, a palavra tornou-se "forma vaga e xingamento". É verdade, como registra o autor, que o fascismo italiano atacou as esquerdas, mas por enxergar nela o que era um "materialismo burguês passivo", pois eles entendiam que "os trabalhadores de todas as classes deveriam se unir contra inimigos improdutivos, em geral identificados como capitalistas financeiros, estrangeiros ou judeus".

"A nação deveria ser representada por um Estado corporativista e sindicalista. Ela seria capa de transcender a decadência moral e o conflito de classes na sociedade burguesa (...) e oferecer uma terceira via estatista entre o capitalismo e o socialismo" marxista, eis o que frisa Michael Mann.

Mas, é no terceiro capítulo de sua obra chamada Fascistas que Mann retrata a origem do movimento na Itália. Na página 132, ele ressalta: "No Partido Socialista, a liderança se opunha à guerra, o que deixava o partido isolado. Isto levou os principais socialistas patrióticos, entre eles Benito Mussolini, a romper com o partido e juntar-se a nacionalistas radicais, intelectuais futuristas e sindicalistas na fundação do movimento fascista".

Eis a origem de Mussolini, que depois foi bem claro quanto a sua doutrina: tudo pelo Estado, para o Estado e com o Estado. Portanto, qualquer um que venha a pregar a redução da máquina pública e maior liberdade econômica pode ser tudo, menos fascista.

Outro estudo básico é O Livro de Ouro das Revoluções do professor e historiador de Stanford, Mark Almond. Ele também ressalta as origens do pensamento de Mussolini no marxismo, somente depois rompendo com a esquerda. Benito Mussolini chegou a ser jornalista marxista. Artigo de Mussolini defendiam uma revolução comunista contra a monarquia.

Almond coloca: "o rompimento de Mussolini com o marxismo não significou que tivesse abandonado inteiramente sua herança esquerdista. Ele alegava que seu novo nacionalismo e o apoio à entrada da Itália na Primeira Guerra criaria uma crise no sistema existente". Sua tese era de que precisava ser adotado método socialista de organização de massa, tomando dinheiro de grandes fábricas que se sentiam felizes em subornar quem ficasse contra a Alemanha.

Em 1919, fundou seu próprio movimento buscando uma terceira via que se distanciasse tanto de liberais, conservadores e todos os demais, incluindo os comunistas.

O vereador Lobão, ao chamar alguém de fascista, tem que levar tudo isso em conta. Claro, ele tem todo o direito de não votar em Jair Messias Bolsonaro (PSL) para a presidência da República e até de achar ele autoritário, de discordar de frases atabalhoadas etc. Há muitas declarações de Bolsonaro que também repudio veementemente.

Porém, nobre vereador, quanto ao programa de governo que Bolsonaro apresenta, não há característica alguma que aponte para raízes fascistas, muito pelo contrário, já que hora ele é justamente criticado pela posição privatizante, que significa redução do poder do Estado. Sem contar com sua defesa do armamento civil. Só mesmo um louco daria o direito à população de se armar para logo em seguida aumentar o poder coercitivo do Estado, financiando forças paramilitares.

Bolsonaro é, em muitos momentos tosco, e já fez declarações muito infelizes e que merece a reepreensão pública. Todo político deve ser criticado. Eles são como fraldas e devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo, com raras exceções. Espero que o vereador Lobão seja uma destas exceções. Afinal, tem um trabalho prestado à sua comunidade e o parabenizo por isso.

Portanto, não me assusta alguma rejeição que Bolsonaro tenha. Não voto nele por concordar 100%. Espero um dia poder votar em alguém melhor até. Mas está muito mais próximo de um poder coercitivo estatal maior quem promete controle de preços, regulação de mídia e aumento da máquina pública ou quer definir questões morais por meio de todo tipo de estatuto estatal, segregando-nos por meio de supostos direitos, como ocorre com as propostas da candidatura do PT.

Mas faço aqui um ponto que acredito ser possível o vereador tentar: baixar o programa de governo de Bolsonaro - que é a fonte primária pela qual ele pode ser cobrado pela população - e apontar os quesitos onde ele acha que há fascismo. Veja, não estou falando dos pontos que ele discorda. Pois, discordar por discordar eu posso discordar também. Estou falando dos pontos onde há carcterísticas que remetam ao fascismo enquanto definição exata do termo e não mero xingamento.

A partir desta fonte primária é possível estabelecer o debate. Eu me disponho a ele. Uma coisa, nobre vereador, é o senhor discordar de alguém e pontuar exatamente porque discorda. Ao fazer isso, o senhor contribui com a democracia. A outra é associar alguém a todo tipo de xingamento diante da coragem que a distância dá para descredibilizá-lo sem apresentar qualquer prova em concreto.

Reitero: Bolsonaro tem sim pontos criticáveis. Se não surgirem para o vereador após o exerício da leitura, eu até me predisponho a dizer quais são, substanciando a sua posição na tribuna. Agora, garanto, só será de fato uma crítica justa se o senhor também lembrar que do outro lado está o maior escândalo de corrupção material e moral vivenciado nesta recente República pós-democratização, quiçá antes disso. E tais escândalos tendo por protagonistas justamente aqueles que se arrogaram os mais éticos dos éticos.

Do outro lado, nobre vereador, estão também aqueles que chamaram de golpista o seu padrinho político, o deputado federal Maurício Quintella Lessa (PR), mas que depois - afinal, eleição provoca amnésia - o apoiaram. Mas, só por curiosidade, indago: o senhor acha que Maurício Quintella errou ao votar pelo impeachment e por isso quer agora o retorno do PT ao poder? Perguntar não ofende.

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