Existem divergências de teses jurídicas em relação à prisão em segunda instância. Um olhar sem paixões de fato permite essa discussão. Como não sou um especialista em Direito, não entro nesse campo. Entendo até onde vai a minha competência. O que tenho questionado – aqui e em outros textos – é o elemento político que mobilizou o Supremo Tribunal Federal (STF) e passou a ganhar relevância em função do réu, quando já havia um entendimento firmado em 2016 por uma Corte que praticamente não mudou sua composição.

A única exceção é o ministro Alexandre de Moraes, no lugar do falecido Teori Zavascki.

Como foi registrado durante o julgamento em alguns momentos, o país precisa ter estabilidade e segurança; e não que os entendimentos fiquem ao sabor da importância ou relevância do réu. Simples assim. Dito isso, compreendo as discussões jurídicas e busco ler atentamente os dois lados, avaliando os argumentos. Conheço juristas que estão longe de serem defensores do ex-presidente condenado Luiz Inácio Lula da Silva, o Lula (PT), que são contrários ao entendimento consolidado pelo STF. Respeito-os.

Particularmente, acredito que bandido bom é bandido preso. E Lula não será um preso político, mas um político preso. Condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, Lula é o responsável por um projeto de poder que se desenvolveu em cima de uma corrupção sistêmica, que – como método – distribuiu benesses dentro de um estamento que um dia o PT disse combater. O PT se apropriou desse estamento, pois de fato não inventou a corrupção, dentro de moldes gramscianos, sendo “protegido” por um discurso ideológico de uma intelectualidade orgânica que acabou por segregar o país na luta do “nós contra eles”.

Além do crime da corrupção material, há os aspectos danosos intangíveis, como a corrupção moral, intelectual e o uso de sindicatos, universidades e outras instituições como peças de uma grande engrenagem de engenharia-social. Lula era a referência de tudo isso. Aliás, era não, ainda é.

Das esquerdas jurássicas às revisionadas (com algumas exceções), Lula virou o símbolo disso. O ex-presidente condenado colheu o que plantou, apesar de ainda ter alguma capilaridade que é superestimada por seus defensores nos discursos inflamados.

Entre esses defensores de Lula, está o senador Renan Calheiros (MDB). Calheiros – em seu mais recente discurso – falou de ataques à Constituição Federal por se permitir a prisão de Lula após o julgamento em segunda instância. Como disse no início do texto, eis uma discussão que pode ser feita do ponto de vista jurídico.

Mas, Renan Calheiros fala do altar de uma paixão lulista simulada. É que o enxadrista-mor da política alagoana, quiçá a brasileira, não dá ponto sem nó. Tornou-se um lulista ferrenho em função de querer aproveitar uma onda diante da capilaridade que Lula ainda tem no Nordeste, por exemplo.

Mas quem é Renan Calheiros para falar de Constituição? Bem, é o homem que, na condição de animal político com expertise, ajudou a salvar os direitos políticos de Dilma Rousseff (PT), quando esta foi alvo do processo de impeachment. Uma vez sofrendo o processo e tendo o resultado proclamado, Dilma além de perder o cargo, deveria perder os direitos políticos. Mas, por sorte, ela contou com Renan Calheiros e outros, que agiram como agiram diante do então presidente do STF, Ricardo Lewandovski.

O problema é que alguns enxergam a nossa Constituição como uma colcha de retalhos cujos retalhos são usados conforme as conveniências e assim ela é retalhada mais ainda.

Renan Calheiros tem o direito ao entendimento pessoal dele, mas não pode estranhar quando alguns senadores o questionam e não o levam a sério neste quesito, pois não possui a estatura devida para apontar o dedo diante do que fez no passado. A briga que Renan Calheiros protagonizou no Senado Federal no dia de ontem remete ao seu protagonismo na época do impeachment, quando era presidente do Senado e tentou dar uma de “isentão”, mesmo tendo posição definida e assim tentou colocar um pé em cada canoa, só endurecendo o discurso para cima do presidente Michel Temer (MDB) bem depois.

É certo que em muitos momentos, nas críticas que fez a Temer, possuía razão. Um desses momentos quando afirmou que o governo era fraco, por exemplo. É claro que é um governo péssimo, cheio de problemas e com suspeitas de atos de corrupção que devem ser investigados, esmiuçados e quem for podre que se quebre. Mas, o que esperar do MDB? Afinal, era uma das peças do estamento burocrático que deu sustentação aos governos do PT.

Não por acaso, Temer era visto como o vice perfeito pela própria Dilma. Aceitou ser vice para agora querer se vender como diferente? Ora, Temer também colhe o que plantou. Não é – e nem pode ser visto – como confiável, em que pese alguns acertos de sua gestão. É o mesmo estamento.

Além disso, erra Renan Calheiros ao usar o argumento de “ataque ao homem” e às ideias, quando tenta descaracterizar um membro do Senado por ele ter sido suplente. Acaso Calheiros não tem suplente? O suplente faz parte da regra do jogo. Se os brasileiros votam sem entender isso, é preciso que entendam. Ou ao escolher o seu suplente, Renan Calheiros buscou um nome que não tivesse condições de representar seus eleitores em caso de impedimento, de licença para ocupar algum cargo e/ou de outras circunstâncias que podem levar um suplente ao Senado Federal.

Este argumento de Renan Calheiros não faz qualquer sentido. É a famosa picuinha de vencer o debate sem precisar ter razão, como já denunciado pelo filósofo Arthur Schopenhauer. É erística pura, Renan Calheiro!

Se Renan Calheiros acha errada a presença de suplentes no Senado que apresente projeto para acabar com a existência deles, assumindo assim – em circunstâncias de ausências – o que ficou menos votado no pleito que elegeu os titulares, como ocorre na Câmara de Deputados e em outros legislativos.

O senador suplente, pelas regras do jogo, é igual a Renan Calheiros dentro do Senado. Tem poder de voz e voto e é a democracia que lhe garante isso, pois a democracia é maior que Renan Calheiros e ainda bem que é assim.

Estou no twitter: @lulavilar