O ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e líder do Podemos em Alagoas, Omar Coêlho, concedeu entrevista exclusiva ao jornalista Ricardo Alexandre, aqui no CadaMinuto. Primeiro ponto: a entrevista é excelente.

O jornalista não se furta de colocar o dedo na ferida ao tentar esmiuçar o que é o Podemos, pois mesmo surgindo como novidade no pleito é uma reformulação de uma nanica legenda que era, e dizer o contrário é hipocrisia, uma legenda de aluguel em muitos cantos do país.

Poucas vezes li uma entrevista tão boa.

Não há como querer que o eleitor afaste esse ranço de uma hora para outra e agora enxergue na legenda uma opção viável em função da presença deste ou daquele político. Ao dirigente partidário Omar Coêlho coube a tentativa de explicar a necessidade de mudança de nome e que não se trata apenas de uma mudança de nome.

Coêlho avaliou o cenário político e me pareceu ser bastante franco em suas posições, o que é bom para o processo.

Tão franco que abre espaços para questionamentos que tomo a liberdade de fazer por meio de análise.

Ao falar de “democracia direta” – como se ela fosse algo possível e não meramente utópico nos dias atuais, diante do nosso sistema representativo – ele fala, na realidade, pela busca de uma participação mais efetiva dos filiados da legenda e um contato maior com os eleitores. É algo bom. Só não vejo isso como sinônimo de democracia direta, tal qual como o conceito derivado dos gregos.

É válido lembrar que democracia é um processo sujeito a reformas quando há uma ameaça à liberdade, uma crise de representatividade etc. Democracia é um processo e jamais um produto. E assim tem que ser para que sempre tenhamos democracia.

Concordo com as entrelinhas exposta por Omar Coêlho: estamos diante de uma crise de representatividade e não é uma mera reforma eleitoral que vai resolver. Todavia, uma instância partidária precisa de um objetivo mais sólido que esteja sedimentado, alicerçado, em convicções prévias que reúnam seus filiados em torno de interesses comuns. Não pode ser algo tão maleável e moldável a sugestões a serem dadas conforme as pautas que virão.

Dou exemplo: se uma agremiação tende a uma visão liberal, essa passa a ser o sustentáculo de ações futuras, propondo redução da máquina pública, da carga tributária, defendendo liberdades individuais, o livre mercado etc. Isso pode variar em graus, mas não em essência. Se tende uma visão mais conservadora, vai se preocupar com valores, com a tradição, com visões mais transcendentes e a certeza de que um racionalismo não resolve a tudo e que a política é um subsistema da sociedade, sendo decisões tomadas de baixo para cima em um governo cada vez mais descentralizado. E aí, há até pontos em comum com a visão liberal.

Do outro lado, se mais à esquerda, teremos partidos que defendem um estado maior, mais presente, com mais poder de decisão em diversas questões da comunidade etc. Nem tudo é ideologia, mas um estatuto partidário define metas e projetos onde as divergências internas possuem linhas mestras. Na entrevista de Omar Coêlho fica a impressão de um partido tão aberto que as linhas mestras podem variar de uma ideologia para outra conforme a participação nas redes sociais ou humor de filiados junto à opinião pública.

São espectros políticos que variam em graus. Mas não há como fugir deles.

É nesse vácuo que surgem os que pagam de “isentão”. Não que Omar Coêlho seja isso. Não é! Sempre teve posições definidas e às vezes paga um preço por isso. Mas, para mim é uma qualidade positiva, por mais que venha a discordar de uma dessas posições.

Diz Omar Coêlho: “(...) o Podemos não tem uma ideologia determinada e que para cada causa ele terá uma posição, ouvindo todas suas bases”.

Não falo nem de ideologia aqui, mas vamos a posições simples: entre a intervenção econômica do Estado em tudo e o livre mercado, o que pensa previamente o Podemos? Vamos votar em um partido que depois é que saberemos o que ele pensa conforme a participação de uma “democracia direta”?

Outras questões: o que pensa o Podemos sobre aborto, sobre redução da maioridade penal, sobre o Estatuto do Desarmamento, sobre carga tributária, sobre pacto federativo, sobre reforma da previdência etc. São temas caros a um Congresso Nacional. É claro que há temas circunstanciais ou imprevisíveis que podem surgir ao decorrer de uma legislatura que leve o partido a uma reflexão para decisão posterior. Mas até esses dependem de uma convicção prévia.

O que mais irrita nos partidos é o fato de terem perdido credibilidade justamente por ausência de posições sólidas ao invés de especulações genéricas como pautas “contra a corrupção”. Ora, contra a corrupção todo mundo é. Publicamente, até o mais corrupto será.

Para não votarmos no escuro, o Podemos precisa ser mais claro. Afinal, durante a entrevista, o próprio Omar Coêlho – acertadamente – reconhece que o problema de muitas legendas brasileiras, diante de um mar de tantos partidos, é não terem posições claras, sejam elas conduzidas por ideologias seculares ou não.  

Eis a fala de Omar Coêlho: “As pessoas que chegam para lhe ajudar, chegam em busca de recursos e não querem outra coisa, como se a ideologia  não tivesse valor, querem apenas saber do voto e quanto ele custa. Isso é muito triste e desanima qualquer cidadão de bem a entrar na política”.

Por isso pergunto o que o Podemos pensa em relação a tanta coisa. Afinal, para não ser o que Coêlho crítica, o partido precisa ter posição e algumas delas independem da democracia direta, pois são a razão da agremiação existir caso queira representar alguém. O nome é “partido” justamente por não ser um “todo” e sendo partido, em tese, representa uma parte que já sabe o que pensa e assim se submete à democracia.

Tenho um respeito enorme por Omar Coêlho. Julgo ser inclusive um bom nome no pleito. Respeito suas convicções mesmo quando temos divergências e não nego que já declarei publicamente quando votei nele para o Senado Federal. Todavia, não escondo: até aqui o Podemos me parece algo flácido, se moldando a realidade na tentativa de se ofertar como algo fora dos “extremos”, para dar uma impressão de quem nem é direita, nem é esquerda, mas uma terceira via que ninguém consegue definir claramente o que é por se esconder por trás da expressão “democracia direta”.

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