Se questionar não ofendesse ou incomodasse, o filósofo grego Sócrates não teria sido condenado. É que Sócrates ousou buscar a verdade junto aos sofistas que - naquela época - eram os detentores de todos os dados. É verdade que, por vezes, Sócrates usou da ironia, essa ferramenta que deixa as coisas mais visíveis. Porém, as perguntas objetivavam as feridas na busca pela verdade. Sócrates - com isso - deu uma grande lição ao jornalismo.
E por qual razão cito Sócrates em tempos tão pós-modernos? Porque a publicidade é sofista, mas o jornalismo não deve ser. E é isso que o senhor secretário de Saúde, Cristhian Teixeira, deveria entender. É que o governo de Alagoas, em uma estratégia, tenta afastar o atual titular da pasta dos escândalos revelados pela Polícia Federal após a Operação Correlatos.
Não estou dizendo com isso que ele tenha algo a ver. Claro que não! Estou dizendo apenas que a sensação criada pelas matérias oficiais é que a Saúde do governo Renan Filho começa em Teixeira. E aí, a ex-titular da pasta é jogada aos leões pelo próprio governo, por meio das entrelinhas…
É verdade que ainda é cedo para falar de culpabilidades. É verdade que o que foi divulgado - fracionamento de compras e possíveis fraudes em licitações - é uma prática que vem desde 2010, mas que se intensificou nos anos de 2015 e 2016. Logo, não é apenas o atual governo. Porém, é igualmente verdade que a Polícia Federal não descartou ir adiante e vem ouvindo fornecedores e outros informantes sobre a pasta da Saúde.
Paralelo às questões apontadas pela Polícia Federal, há um reclame justo de pequenos fornecedores que prestaram serviços à pasta, mas estão sem receber. Além disso, situações de desabastecimento que foram vivenciadas por hospitais públicos. E tudo isso, como tinha que ser, foi amplamente divulgado por setores da imprensa. E foram (e são) problemas da atual gestão também. Os questionamentos devem existir ainda que o governo fale de um “mundo maravilhoso” nas peças publicitárias destinadas à Saúde.
Mais recentemente, as notícias governamentais focaram no abastecimento do Hospital Geral do Estado (HGE) e o garoto propaganda foi o próprio secretário, falando de mais de 15 mil atendimentos e da presença de insumos e medicamentos. O foco da matéria: um salto de qualidade nos 200 dias de gestão de Christian Teixeira. Ora, a construção é clara: Teixeira não faz parte do passado da pasta. Mas, vale lembrar: o passado da pasta faz parte do governo peemedebista presente. Simples assim.
E prestem atenção nesse trecho da matéria da Agência Alagoas:
“As dificuldades e entraves administrativos apontados no HGE são outro foco das ações do Governo do Estado. A primeira medida do governador Renan Filho foi a nomeação do próprio secretário, advogado por formação, especialista nos trâmites jurídicos que envolvem a gestão pública”.
É o governo que escreve. Não sou eu. Então quer dizer que, a primeira medida do governador Renan Filho para resolver os “entraves administrativos” - que incluem os fracionamentos de compra e o desabastecimento, que aqui viraram meros entraves! - só se deu com a nomeação do Cristhian Teixeira? Por que o governo esperou tanto em tão para executar mudanças na pasta se esta foi a “primeira medida do governador”? É o governo que assume isso.
Então, antes, de 2015 a 2016 - já na gestão de Renan Filho - estava tudo errado? É, estou usando o método socrático. Por isso que citei o filósofo Sócrates no início da matéria.
Mas, sigamos…
O secretário diz que sua missão é dar mais capacidade de gestão à Secretaria da Saúde para que “as licitações possam ocorrer de forma mais célere e com menos burocracia, porque nós estamos tratando de vidas”. Que bom que o governo percebeu, não é? E que interessante falar em celeridade em processos licitatórios e menos burocracia depois de uma ação da Polícia Federal que apontou justamente falhas nesse “meio de campo”.
Cristhian Teixeira ainda diz que tem que “usar a criatividade, sem fugir da legislação”. Se o começo da sua fala se entende por uma missão, indago: essa missão não existia antes? Ninguém acompanhava antes as necessidades do HGE, conversava com servidores e com pacientes? Pois isso também é destacado como parte dessa missão.
E aí, ainda se fala que o HGE - “nos últimos dias” - vem recebendo novos insumos e medicamentos indispensáveis para o funcionamento da unidade. Que bom, secretário. É justamente isso que imprensa cobrou ao mostrar o desabastecimento. Afinal, aquela situação crítica era grave e merecia toda a atenção da imprensa, independente de ser governo A ou B, secretário X ou Y. É que - como coloca o próprio titular da pasta - se trata de vidas.
Mas, Cristhian Teixeira, que dá esclarecimentos sobre o abastecimento melhorado nos últimos dias, confirmando assim que o problema existia, acha que - conforme entrevista concedida ao blogueiro Edivaldo Júnior - a imprensa tratou o HGE como saco de pancada. Não, senhor secretário. O governo é que tratou pacientes e servidores como saco de pancada. E torço para que o senhor consiga achar as soluções para que estes assim não mais sejam tratados.
É que o abastecimento é obrigação do Estado que recebe os nossos impostos para isso. E ele diz que a imprensa só mostra o HGE “quanto tem algum problema. Quanto tem serviço não mostra”.
Não é verdade!
Se o secretário fizer uma rápida pesquisa no Google vai observar que vários veículos de comunicação cobriram as agendas positivas do governador na área da Saúde, o que inclui anúncios de melhorias para o HGE. Eu encontrei diversas matérias. E a imprensa está correta em fazer isso. Afinal, quando há algo positivo precisa ser mostrado. Mas, quando há algo que merece crítica tem que ser criticado também.
A prova disso é que a própria imprensa sempre ouviu o secretário.
A diferença é que o problema sempre vai chamar mais atenção, pois há uma preocupação direta com as vidas que precisam ser salvas.
Destaco mais uma fala de Cristhian Teixeira em entrevista ao blogueiro Edivaldo Júnior. É a seguinte:
“Isso é um problema histórico do HGE. Agora que tem um secretário que mostra disposição, boa vontade, que procura fazer o que diz a lei, isso incomoda…”
Antes não tinha?
Outra:
“Estamos fazendo modificações aqui justamente para que aja um planejamento na Secretaria, para que a gente não tenha dificuldades em relação ao desabastecimento e isso incomoda algumas pessoas”.
É, a sensação que fica é que a Saúde de Alagoas começou em Cristhian Teixeira, ou então que o governo do Estado quer passar uma borracha na parte do passado que o pertence…
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