A entrevista da presidente do Sindicado dos Trabalhadores do Poder Legislativo, Zilneide Lages, me chamou a atenção. Há pontos que não ficaram claros em suas falas, na conversa que teve com a jornalista Vanessa Alencar, em matéria publicada no CadaMinuto.
Alencar fez uma longa reportagem sobre o recadastramento dos servidores efetivos (ativos e inativos), comissionados e pensionistas do parlamento estadual. Eis que é o segundo em três anos. Vale lembrar: houve uma auditoria recente em que foram identificadas irregularidades no parlamento estadual. Bem, de lá para cá, podem ter mudado os comissionados, mas os efetivos, nada mudou, a não ser aposentadorias que possam ter ocorrido.
É impressionante como, desde a década passada, são apontadas irregularidades no pagamento de funcionários na Casa de Tavares Bastos e estas persistem. Sejam comissionados ou uma parcela pequena de servidores ativos. Tais irregularidades prejudicam os servidores. Vale lembrar: tem gente recebendo menos do que devia também.
Além disso, são suspeitas de enxertos (efetivos que entraram depois da Constituição pela “janela”), de pagamentos indevidos (como é o caso da Lista de Ouro denunciada na legislatura passada, mas envolvendo comissionados) e, claro, “fantasmas”.
Toda auditoria surge como um compromisso. Essa, pelo menos, teve seus dados divulgados e o Ministério Público Estadual (MPE/AL) resolveu apurar com mais afinco as informações ali contidas. Sobre o assunto, falei no passado, inclusive detalhando pontos da tal auditoria feita pela Mesa Diretora já presidida pelo deputado estadual Luiz Dantas (PMDB). Os textos estão no arquivo do blog.
Um dado: o documento produzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontou inconsistências graves, envolvendo R$ 52 milhões em pagamentos e existência, na folha, de funcionários efetivos já falecidos e outros que entraram no serviço público menores de idade. O interessante é que tais pontos também precisam ser explicados pela Casa, que conta com uma Procuradoria Geral que também se debruça sobre esses dados. Isto não pode ser esquecido.
Que o MPE seja célere na investigação. Ela (a auditoria) se encontra no Núcleo de Defesa do Patrimônio Público, com os promotores José Carlos Castro, Napoleão Amaral e Karla Padilha. O recadastramento a ser promovido nada mais é do que uma nova “auditoria” na busca de possíveis irregularidades, como falta habitual ao trabalho, abandono de cargo, acumulação ilícita de cargos, empregos ou funções pública, ilegalidade de provimentos, lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público.
Até quando a folha da ALE vai ser alvo de investigação sem que existam medidas concretas para sanar possíveis problemas? Isso acaba estigmatizando e generalizando os servidores, pois há muita gente séria no parlamento estadual que cumpre o seu papel devido. Todas as vezes que se jogam suspeitas, infelizmente se joga sobre o todo. E é preciso separar o joio do trigo.
Mas, falei no início desse texto sobre a entrevista de Zilneide Lages. Li com bastante atenção cada linha da reportagem de Vanessa Alencar. A sindicalista enxerga o recadastramento como uma “oportunidade dos servidores atualizarem suas informações” e disse ainda que o levantamento feito há três anos cumpriu sua finalidade.
Cumpriu?
Se tivesse cumprido, a Procuradoria Geral da Casa naquela época havia identificado irregularidades - as graves e aquelas que são apenas questões administrativas - e teria apontado para soluções. E o resultado apontado pela FGV destoa disso. O que se tem é uma série de dúvidas justamente por conta das falhas nas fichas funcionais, desencontros de informações e inconsistências graves já ditas no texto. Nenhuma auditoria feita, nos últimos anos, e nenhum recadastramento cumpriu seu real papel.
Mais ainda: se tivesse cumprido, a Mesa da época - presidida pelo senhor Fernando Toledo - teria tomado medidas sugeridas pela Procuradoria. Não tomou.
O que se conta, nos bastidores, é que, ao contrário, o recadastramento produziu filas de pessoas que sequer eram vistas no cotidiano da Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas. Sabe-se lá por qual razão…Claro: com irregularidades graves na folha de comissionado, como o famoso caso das “lavadeiras”. Lembram?
A deputada estadual Thaíse Guedes (PMDB) chegou a afirmar que não sabia quem tinha nomeado pessoas em seu gabinete. Podem procurar na imprensa e acharão essa notícia. Um fato grave que nunca teve explicação. A sensação é de que o parlamento estadual não se emenda. E os recadastramentos viram aquela coisa para “inglês ver”. Tomara que este recadastramento seja diferente e que o resultado seja público. E que, também, a Procuradoria - autorizada pela Mesa - coloque a mão na massa para corrigir o que deve ser corrigido.
A própria jornalista Vanessa Alencar lembra que, na época do recadastramento passado, a atualização cadastral parecia um desfile de pessoas “ilustres” que jamais foram trabalhar na Assembleia, como políticos sem mandato, parentes de deputados e socialites que recebiam sem trabalhar.
Mas, a atual presidente afirma que “não conhece servidores fantasmas no Poder Legislativo, até porque os funcionários são distribuídos em diversos setores da ALE e também no gabinete dos deputados. Ou seja, todos trabalham”. “Todos”, disse ela. Colocou cedo demais a mão no fogo, presumo. Porém, que a presidente do Sindicato esteja certa e eu errado! Veremos…
É que depois de Taturanas, Lista de Ouro, inconsistências em auditoria - que só se tornou pública por pressão da imprensa! - e recadastramento passado que não deu em nada, creio que a sociedade tem todo o direito às dúvidas que Lages parece não ter. E repito: se houver irregularidades, são de uma minoria como aponta a própria auditoria realizada recentemente. Algo bem diferente do que já chegou a afirmar - de forma infeliz - o presidente Luiz Dantas ao destacar que se a auditoria mostrava que estava todo mundo de forma “errada”.
Ponto eletrônico
Outro ponto que envolve diretamente o recadastramento é o ponto manual de controle de frequência. Muitos funcionários - que preferem não se identificar - afirmam que ele é “seletivo”. Ou seja: não é todo mundo que precisa se submeter a ele. Entendo que há exceções que são de responsabilidade dos gabinetes dos parlamentares, mas não pode haver uma seletividade que cobre assiduidade de alguns, criando uma casta de favorecidos.
A presidente do sindicato diz que a assiduidade é contrapartida de quem recebe salário. Eu diria que a produtividade é a contrapartida também. Mas, ela não tocou nesse ponto da “seletividade” e sei que foi indagado pela jornalista Vanessa Alencar.
A presidente ainda fala do recadastramento. Ela diz o seguinte: “O que esperamos é que os problemas que foram detectados sejam solucionados com a maior brevidade, pois os servidores da Casa de Tavares Bastos já estão cansados de serem considerados uma classe de privilegiados e inoperantes, e essa mesma sociedade precisa saber que somos uma classe que sofre grandes perdas ao longo dos últimos vinte anos, trabalhadora e que cumpre com suas obrigações funcionais”.
Ela está correta na cobrança. O que for problema tem que ser detectado e solucionado com brevidade. O que for irregularidade - eu acrescento - tem que ser tratado como tal também. Concordo ainda com a reclamação que ela faz de que “os servidores da Casa são tratados como classe de privilegiados e inoperantes”. É verdade, pois todos acabam pagando por conta de alguns. E é isso que a auditoria deixa claro. Por isso a cobrança feita inúmeras vezes neste blog para que se separe o joio do trigo e não se generalize.
Lembro que - em 2014 - a Procuradoria Geral da Casa fez uma série de recomendações à Mesa Diretora, que na época era presidida por Fernando Toledo. Entre as medidas, a adoção do ponto eletrônico e a frequência de todos os funcionários. As práticas nunca foram efetivadas, embora tivesse havido convocação para assinatura biométrica. E agora?
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