Não duvido das boas intenções e da quantidade de amor que a deputada estadual Jó Pereira (PMDB) carrega em seu coração. Até comove! Logo, a questão não é esta. Que bom que ela cultiva esse sentimento e deseja a todos nós. Desejo o mesmo a deputada estadual, do fundo do meu coração. Todo amor do mundo!

Mas aqui a questão é a associação que a parlamentar busca fazer – dentro de um maniqueísmo pueril – entre o amor e o bloqueio de acesso às armas de fogo. É que na cabeça da deputada estadual, pelo texto que se observa em suas redes sociais, se você ama não precisa de armas na mão. Se precisa, é porque não ama. Estará alvo fácil de um destempero por falta de amor. Que sujeito cruel é você que quer ter um direito seguindo critérios objetivos de uma lei? Quanto desamor! É isso mesmo?

Nunca deve ter passado pela cabeça da parlamentar Jó Pereira que a legítima defesa é um ato de amor. Por exemplo, quando um homem reage à ação de um bandido, por estar armado, pode ser um ato de amor a si próprio ou em relação àqueles que ele defende, como a família e em muitos casos a uma coletividade que aquele cidadão sequer conhece. Quantos policiais fora de serviço não passaram por situações assim? Casos como este se espalham pelo mundo, onde uma pessoa com o porte da arma – por ato altruísta ou de sobrevivência - resolve reagir a uma ação criminosa e salvar a vida de várias pessoas.

Afinal, é um ato de amor a defesa de si, da propriedade privada e da família, estando em condições extremas. Mais que isto é uma observância a valores.

É um absurdo achar que o “amor” está obrigatoriamente associado à ausência de armas. Armas de fogo não provocam amor ou ódio. São apenas objetos que, na visão dos desarmamentistas, ganham cada vez mais a capacidade animada. Quem é bom ou perverso é o homem que a possui; e, em regra geral, os maus não estão nem aí para o Estatuto do Desarmamento para ter uma arma ou não. Não é o objeto que molda o caráter. Eles, os perversos, terão armas do mesmo jeito, pois já não respeitam a lei. São os bandidos.

Logo, não cabe ao sujeito burocrata ou intelectual – que se acha cheio de amor – impedir os meios pelos quais o outro tem direito à legítima defesa, caso este cumpra todos os critérios objetivos da lei para ter acesso às armas de fogo. Entre estes critérios estão testes de avaliação da psique, testes de aptidão para o manuseio da arma de fogo, idade mínima, não ter antecedentes e por aí vai. O que ocorre com o Estatuto do Desarmamento hoje é que ele cria dificuldades para que não se tenha a objetividade, mas uma discricionariedade em relação a este direito. Desta forma, contraria o que pensa a população, como se vê nas pesquisas de opinião e se viu na própria votação do referendo.

A outra discussão é se aumenta ou não a violência e o número de homicídios. Bem, existem estudos – e já falei deles em outros textos – que mostram a ausência de relação direta destes pontos. Cito novamente os estudos dos brasileiros Fabrício Rebelo e Bene Barbosa. Indo além, John Lott é um ótimo pensador sobre o assunto.

Mas desprezando tais estudos, há sempre pessoas que “amam demais” e que sabem o que é melhor para você...

A derrubada do Estatuto do Desarmamento não provocará um armamento em massa. Isto é falácia. A derrubada do Estatuto – que será substituído (assim acontecendo) por uma nova legislação – disciplinará de forma objetiva o acesso às armas de fogo para aquele cidadão que preza por seguir a lei e tem a aptidão para o manuseio. E aí, entram os casos de populações ribeirinhas que só contam mesmo com a proteção de Deus para defenderem a família e a propriedade. É que nessas regiões o amor de Jó Pereira – que não é onipresente – não chega. Infelizmente, deputada. Eu adoraria que chegasse. Seria lindo um mundo sem armas e só com o amor, não é? Mas talvez seja mais fácil um mundo com unicórnios do que sem o mal presente.

Situações como essa, dos ribeirinhos, se espalham pelo país. Além disso, nos centros urbanos, o cidadão que anda dentro da lei e que cumpre todos os requisitos objetivos da legislação tem o direito ao seu porte, por várias questões, dentre elas, as garantias da liberdade individual. Querer que o Estado esteja presente no controle de tudo, julgando previamente o cidadão e impedindo (ou restringindo) seu direito à legítima defesa, me lembra um ditador que dizia que queria “tudo por dentro do Estado”. Ele se chamava Mussolini.  

O debate sobre novo projeto de lei do deputado federal Rogério Peninha (PMDB) – que quer derrubar o Estatuto do Desarmamento – tem que acontecer com o foco no texto da matéria e não no sentimentalismo tóxico. Peguem o projeto e digam claramente onde está sendo proposto o armamento civil generalizado, sem critérios, sem ponderações etc.

O sentimentalismo que Jó Pereira promove – querendo ou não – apenas generaliza o debate separando o bem do mal, os que amam dos que não amam, que é a tática empregada por muita ONG por aí...

Claro, o mal é aquele cidadão que quer estar dentro da lei e ter acesso às armas. Para Jó Pereira, este cidadão parece sofrer uma deficiência que o impede de amar ao próximo? É por falta de amor tal pleito? É mesmo? Então me explica por qual razão, diferente do bandido!, este cidadão respeita à lei, quer fazer tudo por dentro do regramento do Estado Democrático de Direito, não partiu para bandidagem, não se envolve em crimes, mas apenas luta para ter o acesso às armas? É que o Estatuto nega o acesso às armas a ele e não ao bandido. Este segue livre, leve e solto... e todo armado.

Será que para Jó Pereira este bandido é “vítima da sociedade” que não teve amor suficiente do cidadão que respeita a lei? Claro que contextos influenciam em comportamentos, mas o ser humano é um ser que faz escolhas. Claro que temos que ofertar oportunidades e buscar combater injustiças sempre. Ma, repito!, o ser humano faz escolhas.  

Vale lembrar que Jó Pereira é aquela mesma deputada estadual que disse – em uma sessão da Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas – que o conceito de “cidadão de bem” é meramente subjetivo. Incrível! Vejam bem: ela considera o cidadão de bem algo meramente subjetivo, mas é capaz de afirmar objetivamente que o amor (que é um sentimento indescritível que toma conta do outro no campo da subjetividade) pode ser dimensionado por não ter armas na mão. É uma graça...

Eis o texto de Jó Pereira:

“Amor no coração e nenhuma arma na mão. Amar e ser amada, por familiares, amigos, e conhecidos, se sentido igual à grande maioria e mulheres. Sinto a beleza e a força da frase e compartilho com vocês, de alguém que com certeza tem a paz no coração. Porque para ser amado precisa amar. Se todos amam não sobra espaço para a violência e sobra entendimento para evitar atos de destempero. Desejo que sempre, diariamente sinta-se amada ou amado. O amor constrói um mundo melhor”.

Bem, se Jó Pereira diz “amor no coração e nenhuma arma na mão”, eu digo que eu não vivo no mundo utópico de Pereira ou de muitos burocratas, que apesar de falarem isto não abrem mão de suas seguranças privadas. Não sei se é o caso dela. Eu digo: “amor no coração, capacidade de buscar o bem e de andar dentro da lei e o direito de ter armas, caso se atenda a critérios objetivos de uma legislação. Pois, isto não diz nada de sua capacidade de amar ou não. Aliás, talvez até diga na medida em que você toma esta atitude para proteger a si mesmo e aos seus”.

Diferente do que Jó Pereira diz não há beleza nem força na tal frase. O que há é sentimentalismo piegas na tentativa de convencer o outro de algo sem levantar qualquer tipo de argumentação ou estudo, como já fizeram os pensadores John Lott e Joyce Lee. Aconselho a deputada estadual a lê-los e fico aberto à sugestão de leitura das fontes de estudos dela, que comprovem a eficácia do desarmamento. Mas, desde já digo, já li muitas e nunca fui convencido que o Estatuto do Desarmamento reduziu a criminalidade.

“Se todos amam não sobra espaço para a violência e sobra entendimento para evitar atos de destempero”. Bem, Jó Pereira poderia tentar convencer o PCC e/ou o Comando Vermelho com tal discurso por um experimento: será que o florescer do amor no coração daqueles bandidos impedirão às barbáries que fazem desde décadas passadas e que se intensificou no Brasil nos últimos anos diante da forma como os burocratas de plantão lidam com segurança pública? Afinal, cara deputada, o cidadão que segue a lei e quer ter o acesso às armas espera – em regra é isto e claro que podem existir exceções e estas devem ser punidas exemplarmente como manda a lei – nunca ter que usá-las.

Eu cresci em uma casa cheia de armas. Nunca vi meu pai dar um tiro em ninguém. É que morávamos em Zona Rural, distante de tudo e, sobretudo da polícia. Logo, meu pai assumiu para si o risco de defender a família num gesto de amor supremo no qual colocaria a própria vida em perigo para proteger os seus. Faltou amor a ele, deputada? Deve ter faltado por ter tido armas na mão, né? Faça-me o favor!

No mais, eu desejo a deputada que ela se sinta amada diariamente. Inclusive, desejo o mesmo para todas as mulheres. E mais: por amor e admiração a elas, desejo que não tenham seu direito à defesa cassado, pois uma arma de fogo pode igualar a situação diante de um confronto com um estuprador ou qualquer outro ato de violência. Por fim, toda vez que um político, intelectual ou burocrata se mostra disposto a “construir um mundo melhor”, eu corro longe. É que a História mostra os resultados disso em suas tentativas de construir – por meio de crenças utópicas – paraísos na terra.

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