Comentei na postagem anterior, diante da minha divergência com a deputada estadual Jó Pereira (PMDB), que voltaria ao tema do Estatuto do Desarmamento e o projeto de lei do deputado federal Rogério Peninha (PMDB), que visa revogação do primeiro. É necessário, antes de qualquer coisa, que as pessoas tomem conhecimento do projeto que se encontra em tramitação no Congresso Nacional.
É incrível como, neste país, todas às vezes que um projeto de lei alcança o status de "polêmico", inicia-se um processo de discussão sobre ele sem que a letra da lei seja vista, exposta, analisada, criticada, elogiada, enfim...há um afastamento do que seria a fonte primária para debatermos sentimentalismos e subjetividades. Os estudos sobre a questão pouco importam. Basta colocar uma camisa branca, sair em passeata pela paz, e dizer que se é do bem. Quase sempre de forma a monopolizar as virtudes.
No dia de ontem, 16, na Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas vimos a deputada estadual Jó Pereira dizer que era subjetivo classificar um “cidadão do bem” pelo fato do deputado estadual Bruno Toledo (PMDB) afirmar que este “cidadão de bem” tinha o direito ao porte de armas por cumprir critérios objetivos da lei, não podendo ficar refém da discricionariedade. Toledo apresentou um argumento. Jó Pereira o relativizou.
E só cito Jó Pereira mais uma vez porque o argumento dela vem se tornando repetitivo entre desarmamentistas. Não sei se Pereira sabe disso. Pode ser coincidência. Mas, que várias vezes esse conceito de cidadão de bem é ironizado por parcela da esquerda, isso é. Todavia, logo depois eles chamam para si serem os do bem.
O interessante é que (e aí não falo da deputada, que em momento algum usou de ironia ou desrespeito, professando apenas sua crença, mas falo da regra geral) quando se torna propício e vital aos desarmamentistas, eles zombam do “cidadão de bem” em qualquer debate. Eu mesmo já passei por isto em um debate em que o opositor me perguntou: “Mas como é que você vai dizer quem é do bem ou não?”. Respondi: “Não sou eu que vou dizer. Se fosse eu, seria discricionário. É justamente isto que eu combato, pois ninguém tem inscrição na testa afirmando ser do bem ou do mal. Quem vai dizer são critérios objetivos e lógicos que mostram que o cidadão pode ter a arma e ele tem o direito à presunção de inocência ao mostrar seu “nada-consta” dentro outros elementos objetivos que constam no projeto”. É simples assim.
O amigo e escritor Bene Barbosa também passou pela mesma situação, conforme soube, na Câmara de Deputados em uma audiência pública. Quando o outro lado recebeu a dura resposta, veio pedir desculpas em “off”. O maior sinal de canalhice é a desculpa em reservado depois de feita a ofensa em público. É como solidariedade em privado.
Mas como disse anteriormente, usa-se essa relativização quando é propícia a eles. Porém, vejam o que fazem os desarmamentistas: O Vida em Paz – que é desarmamentista! – fez uma peça publicitária com o seguinte dizer: “Gente do bem não usa armas por que é do bem”. Vejam a superficialidade da coisa e, aí sim, o maniqueísmo. Num momento, os desarmamentistas afirmam que não se pode dizer quem é do bem. No outro, os desarmamentistas afirmam que eles são os do bem.
Faço aqui uma pergunta: policiais usam armas, não é? Em regra, para proteger a sociedade. Eles usam armas, logo – num silogismo simples – para O Vida em Paz são gente do bem ou não? Esse é o problema do maniqueísmo. Entendeu, deputada Jó Pereira? Como sair da letra da lei para debater ponto a ponto, como sair da série de estudos que relacionam armas e aumento ou diminuição de homicídios, como torturar as estatísticas para elas mostrarem o que se quer, e assim o resultado é sempre o discurso mais pobre.
Bruno Toledo foi à tribuna da Casa de Tavares Bastos com dados. Citou o estudioso John Lott – autor de Preconceito Contra As Armas e Mais Armas, Menos Crimes – Joyce Lee, um recente estudo de Harvard e até o estudo técnico da Câmara de Deputados (de número 23/2015), cuja conclusão é a ineficiência do Estatuto do Desarmamento. É que ao longo do tempo, mesmo quando o número de homicídios teve alguma baixa, o homicídio por arma de fogo cresceu. Toledo ainda citou dois estudiosos brasileiros: Fabrício Rebelo e Bene Barbosa. Há uma vasta literatura sobre o assunto. Que sejam confrontados com os estudos que existem do outro lado, mas não com chavões ou estratégias para parecer que determinados conceitos são objetivos, quando não são.
No caso em questão, o “cidadão de bem” é aquele que cumpre a risca os critérios da lei, tem uma conduta ilibada e um norte na vida que permite que ele seja diferenciado do bandido. Ou colocaremos no mesmo patamar? “Ah, mas o cidadão de bem pode cometer um crime”, diz o outro lado. Claro que pode! Quem é louco de negar isto. Mas o critério será a bola de cristal de juízes e burocratas? Todos nós podemos erra! Mas assistam a um filme chamado Minority Report e aprendam o que é presunção de inocência. Alguém só pode ser punido por um crime depois de cometê-lo. Vão mais além: leiam a lógica básica de Aristóteles. Leiam quando ele fala de ato e potência. Todo indivíduo traz em si potência, mas não significa dizer que vai realizá-las, pois é coagido por diversos fatores inclusive seus nortes morais e sentimentos. Desacreditar que as pessoas possuem nortes morais sólidos, é desacreditar na humanidade, e tomar por igual à imensa maioria das pessoas com os bandidos que praticam o mal de forma deliberada.
É por isto que existe todo um campo de filosofia moral no mundo, desde Sócrates até os dias atuais, passando por Kant. O uso da subjetividade para classificar determinadas coisas só favorece a quem quer ter o monopólio das virtudes sobre elas, como fez o Vida em Paz. Eles sabem o que é “gente de bem”, olha só? E eles atribuem ser “gente de bem” quem não usa arma. Desde quando – por lógica básica – uma arma faz de alguém uma pessoa boa ou ruim. Uma arma não nos impõe valores. Nós que temos valores, por sermos humanos, que podemos determinar como usaremos uma arma. Pois a arma em si é um objeto que pode ser usado para matar ou proteger. Jogaremos a lógica fora para atender aos interesses do discurso sentimental?
Fora isto, que são as preliminares do debate sobre o armamento ou desarmamento civil, entraremos no que de fato importa: o texto do projeto de lei. Vejam quantos mitos precisam ser quebrados para se chegar ao principal. O projeto de lei de Rogério Peninha em momento algum autoriza o comércio de armas de qualquer jeito. Se aprovado, você não encontrará armas no supermercado. De forma simples, é preciso que se diga: ele apenas torna objetivo os critérios e flexibiliza para que o posse/porte de arma não seja algo apenas das castas privilegiadas dessa sociedade. Ele devolve ao cidadão o direito à defesa. Se este vai exercê-lo ou não, é outra história.
Por isto que Bruno Toledo – no dia de ontem – foi muito feliz ao colocar que não se trata do dever da defesa, mas do direito. É por isto, justamente por entender com objetividade quem são as vítimas, que Peninha traça critérios para o exercício deste direito. Quem tiver dúvidas que leia o projeto aqui.
Este é o debate. A base dele é o projeto de lei e os estudos existentes sobre os assuntos armamento e desarmamento. Passeatas, chavões, subjetividades, são as armas próprias (com perdão do trocadilho) de quem tenta confundir. Eles atiram para matar o debate! Nós nos armamos de argumentos para proteger a lógica!
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