Não canso de dizer isto em minhas redes sociais: o trabalho que o editor Carlos Andreazza tem feito na Editora Record é algo louvável. Andreazza tem garimpado talentos e fornecido ao mercado editorial verdadeiras obras de arte, como o romance de Rodrigo Duarte Garcia (Os Invernos da Ilha), e obras de filosofias como a de Francisco Razzo (A Imaginação Totalitária). Algo muito bom no momento em que vivemos. 

Entre estes lançamentos, por ser jornalista, os livro-reportagens me encantam. São um universo a parte, pois cada um deles é uma lição para quem está no batente. Uma aula de como apurar, de como fazer a leitura das fontes primárias, de como coordená-las dentro de um enredo que seja atrativo e ao mesmo tempo intelectualmente honesto, inovador em meio a revisitações. 

Este é o segundo trabalho editado por Andreazza que leio. 

Desta vez, uma obra que traz todos estes elementos já citados acima é o recente “Celso Daniel: Polícia, corrupção e morte no coração do PT”. O jornalista Silvio Navarro constrói - dentro da narrativa jornalística - uma reflexão importantíssima do “tudo pelo poder” e - além disto - mostra o quão está corrompida a nossa República; o quanto os interesses mais mesquinhos, muitas vezes nem mesmo ideológicos, mas simplesmente eleitoreiros ou partidários, vão maculando a busca pela verdade e jogando as “cinzas” para debaixo do tapete, sem que nunca conheçamos de fato a realidade sobre os fatos marcantes de nossa História. 

O caso Celso Daniel é um microcosmo que ilustra o macro da nossa República, desde sua fundação com fatos mal contados e golpes articulados, até a necessidade de grupos políticos dominantes refazerem a verdade - tal como mostra o Grande Irmão de George Orwell, em 1984 - para a perpetuação no poder. 

Por isto que nosso período imperial é tão pouco revisitado, por isto que Getúlio Vargas foi tão pouco esmiuçado verdadeiramente apesar da quantidade de obras no período (a exceção é a biografia de Lira Neto, que traz reflexões importantes), dentre outros períodos de nossa História que escondem tanta coisa a ser dita, mas tão pouca gente com coragem de por o dedo na ferida. 

Recentemente escritores estão fazendo isto. É o caso de Laurentino Gomes - em 1808, 1822 e 1889 - e a série Guia Politicamente Incorreto da História de Leandro Narloch. Navarro faz isto em sua obra e, ao lado de Assassinato de Reputações de Romeu Tuma Jr., escreve um importante livro sobre o homicídio do prefeito de Santo André, mostrando uma verdadeira rede de corrupção ligada a um partido político e ao que há de pior no crime organizado. 

Chamo atenção para uma das frases do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, o Lula (PT), que se encontra presente na obra: "estou convencido de que você, Celso Daniel, não foi vítima do acaso é que não foi um incidente. Possivelmente, sua morte foi planejada, possivelmente tem gente graúda por trás disso". Lula nunca mais repetiu algo assim ao falar da morte de Celso Daniel. Não é por acaso. 

Lula está certo, mas não da forma como queria está certo. 

Navarro também compara as investigações iniciais com o que foi feito pela Operação Carbono 14, uma das fases da Lava Jato. Mostra o imenso mosaico de indícios que fez com que os órgãos de investigação “batessem cabeça” sem nunca chegar a verdade. 

O livro é bem escrito e remete a uma série de fontes primárias que embasam o trabalho jornalístico. Trata de um crime sem resposta, mas com muitos elementos que mostram onde a resposta se encontra. Não tenho dúvida disto. O próprio PSDB de Alckmin contribuiu para esta ausência de solução, quando teve medo da repercussão política e também ajudou na tentativa de sepultar o assunto junto com o cadáver.

Todavia, trabalhos como o de Navarro são insistentes, cirúrgicos e necessários, pois colocam na História as interrogações que alguns - em nome do poder - querem transformar em ponto final.

Estou no twitter: @lulavilar