Tomei conhecimento, por meio do amigo Bene Barbosa, da recente opinião do senhor Roberto Pompeu de Toledo em relação às modalidades olímpicas. Como frisou Barbosa, em suas redes sociais, Toledo é de uma ignorância olímpica neste assunto. As alusões que o colunista cria para atacar algumas das modalidades que já trouxeram medalhas ao Brasil é algo medonho, surreal e de uma argumentação pueril. Inacreditável observar isto em uma coluna semanal de uma revista de alcance nacional! Mas, enfim... Toledo tem o direito a falar o que quiser e eu de achar o que ele fala, neste momento, uma imbecilidade.

Mas, vamos ao que Roberto Pompeu de Toledo diz: “Jogos Olímpicos são uma celebração da paz em que boxeadores se esmurram na cara, plantando-se mutualmente lesões cerebrais futuras; judocas mostram o modo mais eficaz de quebrar braços e pernas também fora do mundo ideal do tatame; esgrimistas ensinam a arte de nos picarmos uns aos outros;  e praticantes do tiro “esportivo” adestram o sangue-frio e a precisão úteis igualmente nas situações em que o alvo se insere no plexo solar de um ser humano”.

Bem, se dependesse de gente como Roberto Pompeu de Toledo só teríamos nado sincronizado nas Olimpíadas. Com adendo: para maior segurança os participantes teriam que usar bóias de ombrinhos e colete salva-vidas. Delimitaríamos ainda o tempo de prova. Afinal, alguma das mães dos atletas poderia reclamar ao Comitê Olímpico o fato de seus filhos amados estarem todos com os dedinhos enrugados diante de tanto tempo dentro d’água. Que maldade! 

Gracejos de lado, vamos ao que importa. Toledo desconhece o quanto estas modalidades esportivas são exemplos de superação dado por seres humanos a outros seres humanos. No Brasil, longe dos holofotes da mídia em tempos normais, estes atletas - por esforço e mérito próprio - conquistam bons resultados e até medalhas por acreditarem no que parece impossível. Tornam-se lições para milhares de criança que enxergam no esporte um conjunto de valores que acabam trazendo para a vida: o respeito ao próximo que deriva do espírito competitivo, a noção exata de que ganhar ou perder faz parte da luta, a disciplina necessária para atingir objetivos e que sem esforço não há ganho, logo o ser humano é responsável por suas conquistas e por seu próprio aprendizado na base da tentativa e erro até acertar. Estas são algumas lições do esporte. Elas estão presentes em várias modalidades, inclusive nas citadas por Roberto Pompeu de Toledo, ora bolas!

Eu era um garoto chato e introvertido na infância (não que eu não seja chato hoje. Ainda sou, mas creiam: melhorei muito). Tinha uma dificuldade de relacionamento tremenda por volta dos 11 anos de idade. O que me salvou e me ajudou a lidar com a timidez? O judô. Citado por Toledo como um dos “malefícios” dos jogos Olímpicos, o Judô funcionou para mim, assim como para muitos praticantes, como uma terapia. Caiu feito luva. Disputei competições. Como eu era muito ruim, nunca ganhei nenhuma. Mas o contato com pessoas diferentes e o respeito às regras de civilidade me ajudaram muito a melhorar meu grau de sociabilidade, aprender sobre disciplina e despertar em mim algo que tanto o Judô quanto outras artes marciais possuem: o respeito extremo ao adversário e ter um espírito pacificador. 

Fora isto, toda a filosofia que envolvia o esporte. 

Nunca esqueço do treinador que - ao final de cada dia de “combate” - contava algumas histórias ligadas ao esporte, dentre elas a velha metáfora do galho que se curva para derrotar a neve que se deposita nele, usando o peso da neve contra ela mesma e não quebrando, mas se mantendo firme e retornando a sua posição inicial. Quantos garotos pelo país afora não ouviram coisas assim, quantos não tiveram no esporte a salvação. Quantas redenções não surgiram destas modalidades esportivas que o senhor Toledo cita. 

Vejam esta colocação: “os esgrimistas ensinam a arte de nos picarmos uns aos outros”. De fato, né? Depois das Olimpíadas teremos um monte de gente comprando espadas para sair picando os outros pelo meio da rua, não é senhor Toledo? Como diria Maria do Rosário: “mas o que é isso?”! A beleza da esgrima é clássica. Por sinal, acho que um dos poucos esportes que guardam em si a beleza tal qual Roger Sucrton a descreve: a plástica dos movimentos regidos por regras; pela observância e vigilância do atleta, que precisa encontrar a falha do outro para agir e marcar o ponto. Nada tem de violento nisto. 

É o mesmo raciocínio pueril de que os “jogos de video-game” vão criar crianças violentas. Joguei Mário Bros durante a minha adolescência. Nunca sai de casa metendo a cabeça nos tijolos a espera de um cogumelo. O que motiva a violência nas ruas não é a esgrima, mas estarmos em um país da impunidade, com uma população completamente refém de uma segurança estatal falida, sem o direito à legítima defesa e - a cada passo para o futuro - mais distante de uma alta cultura inspirada pelo tripé defendido por Ernest Renan: o direito Romando, a filosofia Grega e os valores da base judaico-cristã. O desapego a isto é que tem nos levado a uma tragédia cultural e moral profunda. 

Esta sim, como diria Hannah Arendt, nos faz banalizar o mal e não mais nos assustarmos, como deveríamos fazer todos os dias, ao estarmos em um país de 60 mil homicídios por ano. A banalização do mal que nos leva confrontar 50 mil mortos no trânsito sem nem entender direito o que isto representa; a banalização do mal que faz com que comerciantes tenham que atender os seus clientes por trás das grades, como acontece na periferia de Maceió; a banalização do mal que transformou nossas casas em fortalezas, a banalização do mal que faz com que tenhamos que sair de casa escondendo o celular, já que nesse país, quem é roubado é “vacilão”, e assim vamos invertendo sempre quem é culpado e quem é vítima no processo. 

Mas para Toledo, o mau-exemplo é a modalidade esportiva X e Y, cuja prática do esporte se faz por um conjunto de regras, filosofia, disciplina, estímulo ao empreendedorismo individual, respeito ao adversário, e a integração entre povos, enfim...não nego que há riscos em determinados esportes. Em uns mais que os outros. Mas, riscos fazem parte da vida, ora! Seres humanos desafiam seus próprios limites a todo instante. Os sadios fazem isto buscando o melhor de si. Isto é algo que o esporte também promove. Por isto que muitos atletas são verdadeiros heróis, pois aliam este exemplo de superação ao caráter. Isto se encontra em toda e qualquer modalidade, inclusive nas citadas por Pompeu. 

Sobre o tiro esportivo, nem vou falar. Tenho a impressão que tudo que ele citou foi só adorno para mostrar o perigo das armas. Sempre estas armas malvadinhas que atiram sozinhas e levam o homem a cometer o mal, não é? Cansei! Este é um assunto para o maravilhoso Bene Barbosa. Leiam o blog dele, aqui no CadaMinuto, e se deliciem ao entender a tolice falada por Roberto Pompeu Toledo. 

Por fim, sobre superação. Um registro que fiz ontem ao assistir a derrota da seleção brasileira de futebol feminino. Eu poderia ter parabenizado a alagoana Marta, que é minha conterrânea. Mas eu parabenizei a jogadora que me fez ficar com os olhos marejados, pois representou naquele momento o que eu acredito. Esta jogadora atende pelo nome de Andressinha e talvez seja uma das menos conhecidas da seleção. Não acompanho muito futebol.

Eis o que disse: “A reação da Adressinha diante do resultado adverso é emocionante. Uma pessoa que chama para si a responsabilidade e mostra que lutou o que pode dentro de suas capacidades. Ela perdeu o pênalti, mas demonstra ser alguém que merece aplausos.Perder ou ganhar é consequência de lutar! A forma como lidamos com a derrota e com a vitória diz muito de quem somos e do compromisso que assumimos. Parabéns, Andressinha! Eu tenho orgulho de ver isto em atletas”.

Mais tiro esportivo, Mais, Judô, Mais Esgrima, Menos Roberto Pompeu de Toledo! 

Estou no twitter: @lulavilar