Enfrentar a crise financeira não tem sido nada fácil para o alagoano que, a cada momento, percebe o aumento do alimento, confecções, roupas e outros utensílios necessários para o seu dia a dia. E não consegue ajustar o seu salário com essas despesas. Para quem está empregado, essa situação já é complicada, e para quem perdeu seu posto de trabalho, o quadro pode ficar ainda grave.

Muitos alagoanos resolveram trafegar na contramão da crise, apostado em novos investimentos, utilizando do seu jeitinho de enfrentar a realidade e colocando em prática, já há alguns meses, o tão criticado lema proposto pelo presidente interino da República, Michel Temer (PMDB): “Não fale de crise, trabalhe!”.

É caso do Edervan Souza que poderia estar engrossando as filas à procura de um emprego depois que ficou desempregado, no entanto resolver pegar suas economias e abrir um negócio.

Outra história de sucesso está na sociedade de Leonardo Albuquerque e Tony Henrique. Os amigos planejaram um negócio no ramo da alimentação justamente no momento em que a crise “estourava” em todo país. E, hoje, além de conseguir o lucro investido na empresa, proporciona garantia de renda para cinco famílias.

Os exemplos não são fenômenos isolados. Enquanto empresas fecham suas portas ou fazem demissões, a Junta Comercial de Alagoas (Juceal) vem registrando a cada mês um aumento positivo de abertura de novas empresas. Até o final de abril foram abertas 6.702 empresa, sendo que sua maioria, 5.153 são de porte de Micro Empreendedor Individual (MEI), 1.134 de Microempresa (ME) e 232 de Empresas de Pequeno Porte (EPP).  Um número restante de 183 não teve o porte classificado.

O número de empresas fechadas não supera o de novos empreendimentos. Relativo ao mesmo período já citado, foram 2.910 empresas extintas, sendo 2.063 MEI, 612 ME e 92 EPP.

Traduzindo esses números, o que se pode perceber que muitas pessoas que perderam seus empregos resolveram abrir um negócio. O presidente da Juceal, Carlos Araújo, explica que os setores de comércio, alimentos e alojamentos tem sido os ramos mais procurados no órgão.

Segundo ele, a retirada da burocracia, a vinda da agilidade e facilidade para abrir uma empresa contribuíram bastante para as pessoas que resolvessem abrir um negócio e garantir linha de crédito. “Hoje ficou muito fácil abrir uma empresa em Alagoas, pois não requer muita burocracia nem necessita que uma pessoa que mora no interior se desloque para Maceió para protocolar seus documentos”, explicou Araújo.

De acordo com Juceal, a constituição de novas empresas tem ocorrido em todo o estado, através do programa Facilita, que atende cada novo empreendedor em suas respectivas cidades.

O fenômeno da migração do desempregado para a microempresa

Dados do Cadastro Geral de Empregador e Desempregados (Caged), divulgados pelo Ministério do Trabalho, mostram que nos últimos 12 meses, Alagoas perdeu mais de 20 mil formais em todo o estado.  Somente no mês de abril, foram 7.102 empregos celetistas desligados, o que representou uma diminuição de 2,03% em relação ao estoque de assalariados com carteira assinada do mês anterior.

Houve uma queda principalmente no setor da Indústria de Transformação (-5.960) postos, devido à influência de fatores sazonais relacionados à cana-de-açúcar. 

O economista Rômulo Sales explica que o cenário do desemprego em Alagoas é preocupante, pois para cada posto de trabalho desligado são mais 3 a 4 empregos perdidos. 

Para o especialista não tem sido apenas no setor do comércio que os trabalhadores tem sentido o peso da demissão, mas em outras áreas tidas como próspera, como a educação e a construção civil. “Hoje nós vemos faculdades particulares demitindo seus professores por estarem em dificuldade garantir uma linha de crédito para atrair novos alunos. Dessa mesma forma tem sido com os engenheiros na construção civil”, comentou o especialista.

Apesar dessa realidade, a vontade de sobressair da crise tem feito muitos desempregados migrarem para formalidade e abrirem um negócio. Sales conta que era comum às pessoas perderem os empregos e apostarem em um negócio próprio, mas dentro da informalidade. Todavia a necessidade de conseguir uma linha de crédito para fazer novos investimentos e, até mesmo ampliar, tem feito muitos informais se formalizarem.

Esse movimento pode ser considerado muito positivo, pois muitas dessas pessoas acabam não voltando mais para o mercado de trabalho e acabam promovendo a abertura de novas vagas com suas empresas. 

Novos empresários vão da apatia à expansão dos negócios para outros bairros

Foto: Gilca Cinara/CM

 

Além da coragem e da identificação das oportunidades em meio à crise, Edervan Souza e os sócios Leonardo Albuquerque e Tony Henrique têm algo em comum: o plano de ampliar os negócios para outros bairros de Maceió. Contando um pouco de sua história, Edervan relembra que passou três meses desempregado, depois que perdeu o emprego de gerente em um restaurante na parte baixa da cidade.

Durante esse período, ele ficou em casa pensando como poderia reverter aquela situação. “Eu sempre tive a vontade de abrir um negócio somente meu. Quando fiquei desempregado coloquei isso em prática, pois não poderia ficar parado dentro de casa até arranjar um novo emprego e gastando o dinheiro que tinha para pagar as contas”, disse Edervan.

Atualmente sua jornada de trabalho tem sido em sua lanchonete, localizada no bairro do Graciliano Ramos. Além da mobília e os equipamentos para armazenar os alimentos, o novo empresário conta que o único investimento feito por fora foi de divulgação.

Edervan apostou na panfletagem como um trunfo para alavancar as vendas e chamar a atenção das pessoas para sua lanchonete “O Imperador”. “Tem dado muito certo. Estou conseguindo tirar as despesas, pagar minhas contas e ainda recebendo um lucro. O meu projeto é ampliar e abrir outras lanchonetes desse mesmo jeito em outros bairros, aqui em cima mesmo, e conseguir empregar outras pessoas”, afirmou Edervan.

Dessa mesma forma, Leonardo e Tony já colocaram em prática o projeto de lançar um novo produto no ramo de alimentação na praça. Ambos trabalhavam em ramos totalmente diferentes, que com a crise financeira estavam diretamente afetados sem a procura de novos investimentos e crescimento.

Leonardo conta que o projeto de abrir um negócio de fornecimento de comida foi planejado durante oito meses. “Nós estávamos em ramos totalmente saturados e pensando em algo em que as pessoas pudessem consumir todos os dias. Foi aí que surgiu a ideia de colocar um espaço para distribuição de alimentos”, conta ele.

O negócio deu tão certo que, nos primeiros 38 dias de funcionamento, além de empregar cinco funcionários, eles saíram da ideia inicial que era distribuição de comida através de um disque entrega e colocaram, mesmo que de forma pequena, mesas para servir as especialidades de carnes variadas ali mesmo, dentro do Carnes a Bafo, na Santa Lúcia.

A nova aposta dos sócios é o food truck. Diariamente eles produzem mais de 100 refeições, o que superou bastante a expectativa para seu início. “Logo quando começamos queríamos manter o negócio, mas estamos tendo uma surpresa muito grande”, comemorou Leonardo.