Quem gosta de política e de economia já se deparou com as teses conflitantes e confrontantes dos economistas e pensadores John Maynard Keynes e Frederich August von Hayek e viu o quão rico é o debate. Eu fico com Hayek e sua maravilhosa obra O Caminho da Servidão, mas ainda tenho amigos keynesianos, o que nos rendem longas conversas sobre o tema.

Na internet, o debate entre as ideias de Hayek e Keynes virou até rap. Vou colocar o vídeo aqui nesta postagem. O fato é que desde o fim da Primeira Guerra Mundial, Keynes se tornou um dos principais personagens da economia moderna, com o seu livro As Consequências Econômicas da Paz.  Naquele momento, acertadamente (em minha visão), Keynes advertia os “Aliados” pelo preço que estava sendo cobrado pela paz. O sacrifício imposto à Alemanha – já dizia Keynes – seria uma porta aberta para uma nova guerra ou um novo regime totalitário.

Vejam que o Nazismo comprovou isto. É por esta razão, que dentro do prisma histórico, creio que As Consequências Econômicas da Paz seja um livro importante. O problema é que as próprias ideias de Keynes, defendendo o intervencionismo estatal na economia e a ampliação de gastos públicos em programas para a ampliação de empregos em tempos de crise, também se mostravam caminhos abertos para a tirania, pela forma como um governo se agigantava para cima do indivíduo. Eis o motivo pelo qual passo a concordar com a visão de Hayek em relação ao livre mercado.

Hayek era um ferrenho defensor do livre mercado. Porém, após a Primeira Guerra Mundial, a influência de Keynes é que foi sentida na economia americana desde Franklin Delano Roosevelt. As ideias “hayekeanas” entraram na economia americana com uma contrarrevolução com Ronald Reagan, por exemplo, como também foram bastante utilizadas por Margareth Thatcher na Inglaterra. A Dama de Ferro sempre fez elogios públicos a Hayek, por exemplo.

Confrontar os dois economistas já rendeu até discussões em mesa de bar. Eu sempre indagava-me como alguém nunca havia pensado por qual razão – de forma simples e acessível, para quem não é economista – esta discussão nunca tinha virado um livro explorando detalhes das vidas de ambos, bem como das teses que defendiam, já que Hayek e Keynes trocaram correspondências. Ainda há os fatos curiosos em relação a depressão de Hayek e sua personalidade forte, bem como a polidez egocêntrica de Keynes. Enfim, muito pano para a manga...

Mas eis que meu pedido foi atendido. A Editora Record trouxe para o Brasil a obra Keynes X Hayek: O Confronto que Definiu a Economia Moderna. Uma obra do jornalista Nicholas Wapshott. Há alguns pontos da tradução sobre os quais me questiono. Creio que esta poderia ter sido revisada por um economista. Não se foi. Mas, isto não tira o brilhantismo do livro editado no país.

Uma obra importante para o pontapé inicial no entendimento dos movimentos da economia moderna e das crises enfrentadas em 1929 e em 2008, por exemplo. Como o intervencionismo estatal teve, também, sua responsabilidade nestes processos e como os governos reagiram. A culpa de tudo é jogada sempre no capitalismo e no livre mercado. O livro também ajuda a quebrar o “mito” de que nos EUA impera a defesa do livre mercado. Eu vivo dizendo que isto não é uma verdade, em função do significativo aumento dos gastos públicos, do orçamento deficitário, dentre outros pontos. Mas, a obra deixa isto ainda muito mais claro.

O livro de Wapshott é uma obra importante para o público geral, mas em especial para jornalistas que muitas vezes são obrigados a falar sobre economia, sem ter muito entendimento a respeito do assunto. Estou entre estes, obviamente. Nós, jornalistas, precisamos – em muitos momentos – de obras que tornem alguns temas palatáveis, acessíveis, para que sejam o ponto de partida para leituras mais densas. Creio que a obra de Wapshott cumpre muito bem este papel. Por isto virei um estudioso do tema há alguns anos.

Não é um livro técnico, mas torna as ideias – de um modo geral – de Keynes e Hayek perfeitamente compreensíveis, bem como o motivo da divergência e como ela se construiu. Mostra algo ainda muito importante: que o debate se dá no campo das ideias. Eis uma lição que ainda estamos precisando no Brasil.

Um ponto positivo na obra: Wapshott não sai em busca de um vencedor no embate, apesar do capítulo final abrir esta discussão. A posição do jornalista é inteligente, pois o debate de ideias oriundas tanto de Hayek quanto de Keynes ainda seguem.

Para quem ainda acha que liberais e conservadores são iguais, a obra também desmistifica isto ao apresentar o texto de Hayek em que o economista decepciona os conservadores americanos ao rejeitá-los. É um texto chamado “Porque não sou conservador”. Hayek rejeita a posição moralista que enxerga no conservadorismo e diz que o liberalismo atenta a princípios e não a uma moral. Uma discussão que nasce lá, mas pode ser comprada em outras obras, como em Roger Scruton com os seus Como Ser Conservador e/ou O Que É Conservadorismo.  Eis uma discussão rica que é – obviamente – um dos pequenos pontos de Keynes X Hayek.

A obra passeia ainda pelo pensamento de Mises e Milton Friedman: outros importantes economistas. Todos estes sendo apresentados em uma dimensão humana diante de uma coletânea de fatos de suas vidas que não são tão conhecidos do grande público.  Logo, em função desta junção – aspectos humanos e grandes ideias – leva à curiosidade a respeito de toda a Escola Austríaca.

Enfim, uma obra que vale muito a pena.