Réu em ação penal que julga desvios de recursos federais investigados na denominada Operação Carranca, o engenheiro civil Ederaldo José Santos de Araújo Barros assentou-se em cadeiras poderosas na cúpula do Departamento Estadual de Trânsito de Alagoas (Detran/AL) nas últimas semanas. Depois de surpreender o presidente do Detran, Antônio Carlos "Cacá" Gouveia, ao ser nomeado como chefe de seu gabinete, Ederaldo passou a comandar o Conselho Estadual de Trânsito (Cetran) em 12 de abril, com direito a cobertura midiática oficial da Agência Alagoas.

Conhecido da família Calheiros, Ederaldo Barros comandava a Comissão de Licitação da Prefeitura de Murici, durante a administração do governador Renan Filho (PMDB) no município. E defende-se da acusação do Ministério Público Federal (MPF) em Alagoas de ter atuado “frustando o caráter competitivo do procedimento licitatório” em convênios com a União.

A Justiça Federal de Alagoas aceitou, há quase seis anos, a denúncia do MPF contra o substituto eventual de Cacá Gouveia na Presidência do Detran, juntamente com mais 11 pessoas, por considerar que Ederaldo Barros deveria responder por crimes de formação de quadrilha, fraude à concorrência na licitação (por cinco vezes) e fraude na execução de obra ou serviço (por três vezes).

Na ação penal proposta pelo MPF em 2008, os procuradores da República Rodrigo Tenório e Daniel Ricken afirmaram que Ederaldo Barros “ajustava” licitações em benefício próprio e de Ronaldo Farias de Lacerda, acusado de controlar pelo menos quatro empreiteiras que atuavam no esquema criminoso descoberto pela Operação Carranca, deflagrada pela Polícia Federal (PF) em 2007, após investigação de contratos nos municípios de Mata Grande, São Luiz do Quitunde, Murici, Batalha, Chã Preta e Matriz do Camaragibe.

Ederaldo Barros teria presidido a comissão de licitação da Prefeitura de Murici, quando foram firmados convênios com a União, que somam R$ 5,5 milhões em recursos da (Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e do Ministério das Cidades, para obras de drenagem, pavimentação e infraestrutura, e construção de um ginásio.

As irregularidades denunciadas pelo MPF foram levantadas em relatório de fiscalização do município de Murici pela Controladoria Geral da União (CGU), que resultou na abertura de procedimento – já arquivado – também no Tribunal de Contas da União (TCU), contra Ederaldo e outras pessoas, entre elas o então prefeito Renan Filho.

Ascensão ao poder

Ederaldo é funcionário da Companhia Alagoana de Recursos Humanos e Patrimoniais (Carhp) e, de acordo com o Portal da Transparência do Estado de Alagoas, recebia cerca de R$ 7 mil em salário líquido desde julho de 2012, valor que subiu para cerca de R$ 9 mil em março de 2015 e se estabilizou em R$ 11 mil líquidos, desde maio do primeiro ano de governo de Renan Filho.

Entre julho e outubro de 2015, o Portal da Transparência registrou o repasse de R$ 4 mil para Ederaldo, a título de "pagamentos antecipados" por itens empenhados especificados pela Carhp sem a clareza necessária ao entendimento de quem consulta o portal, relativos a processos com descrição codificada por números.

Em março deste ano eleitoral, o acusado de crimes pelo MPF passou a chefiar o gabinete do presidente do Detran, e tem representado seu assessorado em eventos públicos. Além disso, já no primeiro mês de trabalho, por meio do Decreto 47.760, assinado por Renan Filho, Ederaldo Barros respondeu interinamente pela presidência da autarquia, entre 15 e 17 de março, em virtude do afastamento de Cacá Gouveia para participar do Encontro Nacional dos Detrans, em São Paulo-SP.

O Blog do Davi Soares apurou que Cacá Gouveia tem suportado com naturalidade a convivência com a desagradável surpresa de ter como chefe de gabinete alguém que responde pela acusação de formação de quadrilha e fraude. Segundo fontes do Detran, o presidente da autarquia só foi apresentado ao seu assessor após a nomeação ser publicada no Diário Oficial do Estado.

Nos últimos meses, Ederaldo vem sendo reconhecido nos corredores do Palácio dos Palmares pelo seu estilo inconveniente de viver reafirmando a “grande amizade” que tem com Renan Filho. E por não esconder de ninguém o sonho de assumir o comando efetivo da Presidência do Detran.

Ederaldo Barros, tornou-se presidente do Cetran de Alagoas por decisão de Renan Filho (Foto: Ascom/Detran)

“Governador não prejulga”

Governo do Estado assume com naturalidade que a indicação de Ederaldo para a chefia do gabinete do Detran foi do governador Renan Filho. “Ele já foi do Detran em outra oportunidade, é engenheiro civil efetivo do Estado de Alagoas, responde a um processo pelo exercício da função de servidor público, mas nunca foi em toda a vida (cerca de 60 anos) condenado. O governador não tem prejulgado as pessoas. Se a Justiça condenar, o cenário muda. Mas o sentimento é de que não será o caso”, respondeu o governo ao Blog do Davi Soares.

O chefe de gabinete da Presidência do Detran não respondeu aos questionamentos enviados para seu contato do aplicativo WhastApp, na manhã desta sexta-feira (29). Ele foi convidado a comentar esta reportagem, e, segundo os registros do aplicativo, leu o pedido de informações sobre o teor de sua defesa. Mas não respondeu se pode se considerar apto a ocupar as funções no Detran e no Cetran, enquanto se defende das denúncias do MPF.

Segundo o sistema de consultas de processos da Justiça Federal de Alagoas, a ação penal pública nº 0000204-43.2008.4.05.8001, em que Ederaldo consta como réu, está conclusa para sentença do juiz titular da 8ª Vara Federal, Cristiano de Jesus Pereira Nascimento, desde 14 de julho de 2015.

Tá aí uma oportunidade que o governo de Renan Filho dá ao alagoano de se lembrar do lema "moralidade dez, política zero", propagado no Detran de Alagoas pelo ex-presidente e desembargador aposentado Antônio Sapucaia, que deu início ao processo de construção da nova sede do Detran, na gestão de Teotonio Vilela Filho (PSDB), inaugurada pelo atual governo peemedebista. 

A proposta inicial também propagada por Cacá Gouveia era de manter o Detran de Alagoas imune à usurpação da classe política, que passou anos tratando a autarquia como uma extensão da Assembleia Legislativa, por causa do valioso espaço político e da polpuda arrecadação. Para cumprir esse propósito de transparência e gestao proba, o atual presidente vinha afirmando ter aberto as portas do Detran para órgãos de controle como a Polícia Federal.

O governo de Renan Filho acredita que Ederaldo Barros possa ajudar nesta missão. Alguém duvida?

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