Na edição nº 126 do jornal CadaMinuto Press convidou dois juristas alagoanos para expor aos leitores os seus argumentos contrários e favoráveis ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, cuja primeira ou a última etapa será votada neste domingo (17), pelos integrantes da Câmara dos Deputados, em Brasília-DF. Caso seja aprovado, o processo segue para o julgamento do Senado Federal. Se rejeitado, será arquivado de forma definitiva.
A voz favorável à aprovação do impeachment é Thiago Mota de Moares, mestre em Teoria e Dogmática do Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), especialista em Direito Processual pela Escola Superior da Magistratura de Alagoas (ESMAL), membro associado do Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal (IBRASPP), membro associado do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), professor universitário e advogado criminalista.
Quem defende o arquivamento do processo de impeachment é Welton Roberto, PhD em Justiça Penal Internacional pela Universidade de Pavia, na Itália, Doutor em Processo Penal pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), advogado criminalista e professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), nas cadeiras de Direito Penal e Processo Penal.
Confira a opinião dos especialistas:
O Processo de Impeachment da Presidente Dilma
Por Thiago Mota de Moraes
Como se sabe, está em curso na Câmara dos Deputados um procedimento concernente a análise de denúncia firmada em desfavor da atual Presidente da República, pela imputada prática de Crimes de Responsabilidade, subscrita pelos juristas HÉLIO BICUDO, MIGUEL REALE JÚNIOR e JANAÍNA PASCHOAL.
Da referida denúncia, instaurou-se uma Comissão Especial que, sob o parecer do Deputado Federal JOVAIR ARANTES, concluiu, por maioria de votos, pela admissibilidade jurídica e política da acusação e consequente sujeição do pleito ao plenário da Câmara, a quem compete dar a autorização para a abertura (ou não) do processo de impeachment, cabendo ao Senado, ulteriormente, fazer o juízo inicial de instalação ou não do procedimento.
No referido procedimento há, pois, claramente, a presença de material probatório suficiente a indicar, no mínimo, a prática dos seguintes crimes de responsabilidade pela Presidente da República: a) abertura de créditos suplementares por decreto presidencial, sem autorização do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 85, VI, e art. 167, V; e Lei nº 1.079, de 1950, art. 10, item 4 e art. 11, item 2); e b) contratação ilegal de operações de crédito. (Lei nº 1.079, de 1950, art. 11, item 3).
Explico. Quanto ao primeiro crime de responsabilidade firmado, tem-se que a Presidente da República, ao editar, nos anos de 2014 (entre 5 de novembro e 14 de dezembro) e de 2015 (entre 27 de julho e 20 de agosto – ou seja, na atual gestão), uma série de decretos sem número que resultaram na abertura de créditos suplementares, sem autorização do Congresso Nacional (art. 4º das Leis Orçamentárias Anuais de 2014 e 2015), uma vez que tinha conhecimento da inexequibilidade das metas de superávit estabelecidas nas Leis de Diretrizes Orçamentárias de 2014 e 2015, a Presidente DILMA violou a Constituição Federal (em seu art. 85, VI, e art. 167, V), a Lei n. 1.079, de 1950 (em seu art. 10, itens 4 e 6 e art. 11, item 2), e a Lei Complementar n. 101/2000 (em seu art. 8º, parágrafo único, e art. 9º).
Nesta mesma linha, ainda quanto à presença real de crimes de responsabilidade, tem-se a conduta da Chefe do Executivo, consubstanciada no ato de tomar empréstimos de instituições financeiras (a exemplo da Caixa Econômica, BNDES, FGTS e Banco do Brasil), bem como de não contabilizar tais ações, “maquiando” as contas públicas com a finalidade deliberada de transmitir ao país (e aos investidores internacionais) a sensação de que o Brasil estaria economicamente saldável.
Desta forma, ao autorizar operações de crédito ilegais perante as referidas instituições financeiras públicas, a Presidente da República agiu em descompasso com a Lei n. 1.079/50 (em seu art. 10, itens 7, 8 e 9 e art. 11, item 3) e com a Lei Complementar n. 101/2000 (em seu art. 29, III; art. 32, § 1º, I; art. 36, caput e art. 38, caput, e inciso IV, b).
Tais operações de crédito perpetradas pela União, a partir do não repasse de recursos da conta do Tesouro ao Banco do Brasil, à Caixa econômica Federal, ao BNDES e ao FGTS, levaram tais instituições a utilizar recursos próprios para o pagamento de diversos programas de responsabilidade do Governo Federal.
Com isso, a Presidente da República violou frontalmente o art. 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe peremptoriamente que uma instituição financeira possa “financiar” o ente da federação ao qual esteja vinculada. Além disso, o Governo Federal ainda omitiu deliberadamente os referidos passivos, o que representa ofensa ao princípio da legalidade, previsto na Constituição, bem como desconsiderou os pressupostos de planejamento, de transparência e de gestão fiscal que deveriam reger a administração.
Tais condutas, reitere-se, foram compreendidas pelo Tribunal de Contas da União como irregulares quando, de forma histórica e técnica, recomendou a REJEIÇÃO das contas de 2014 do Governo Federal, pela inobservância clara dos mesmos princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal, das normas constitucionais, legais e regulamentares na execução dos orçamentos da União e nas demais operações realizadas com recursos públicos federais, conforme estabelece a lei orçamentária anual.
Além do mais, revela-se nítida a necessidade de se mencionar também que, para fins da caracterização da ilicitude correspectiva com a violação ao art. 36 da LRF, é preciso que a conduta efetivada na existência de saldos devedores para com uma instituição financeira pública tenha a finalidade de impor um financiamento forçado. Ou seja, o que diferencia a conduta da Presidente DILMA de seus antecessores, é a prática sistemática e deliberada de deixar de enviar bilhões de reais aos bancos públicos e exigir deles que suportem as obrigações do Tesouro com seus próprios recursos.
Com isso, como foi reconhecido no parecer da Comissão Especial de impeachment da Câmara, desde a elaboração das leis orçamentárias, cujas metas e resultados foram alegadamente baseados em números que não espelhariam a realidade, até a execução da lei orçamentária anual e o atendimento às metas constantes da Lei de Diretrizes Orçamentárias, não haveria fidedignidade nas informações, por ato do próprio Governo, em suposta violação à lei orçamentária e à probidade na administração.
Mas não foi só. Existem inúmeras outras questões de substancial gravidade apresentadas na denúncia que somente a partir do seu devido processamento pelo Senado da República é que poderão ser descortinados. Mais a mais, independentemente disso, resta clara a incidência da Presidência da República nos crimes de responsabilidade previstos no artigo 85, incisos V, VI e VII, da Constituição Federal, nos artigos 4º, incisos V e VI, 9º, números 3 e 7, 10 números 6, 7, 8 e 9, e 11, número 3, da Lei 1.079/1950.
O golpe dos esquizofrênicos
Por Welton Roberto
Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. Essas duas básicas lições são dadas no primeiro dia de aula aos alunos de Direito da cadeira de Ciências Criminais de qualquer faculdade do mundo. Talvez alguns tenham perdido a primeira aula, e por mera compreensão das ausências desses alunos relapsos, vamos tentar descortinar aqui o golpe parlamentar midiático que se desenhou para destruir a jovem democracia e desdenhar do voto popular no Brasil.
É claro que o processo de impeachment segue um modelo jurídico-político sob o prisma constitucional e, por si só, em face desta configuração de legalidade, tem sua previsão garantida como instrumento de controle dos atos de determinados atores políticos e de membros da mais alta corte de justiça do país.
Cristalino também dizer, que o processo de impeachment instaurado contra a Presidente Dilma Rousseff carece de finalidade legítima já que foi motivo de barganha pelo inescrupuloso Eduardo Cunha para tentar se safar de cassação no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados após recebimento de regular denúncia contra ele de corrupção e demais crimes, cuja soma de penas atinge quase 200 anos de cadeia, segundo peça do Procurador Geral da República.
Nascido e padecendo de vício inicial fica claro que a recepção da denúncia fora feita de forma parcial, posto que o objeto desta fizesse referência a atos de mandato já findo em 31/12/2014, daí porque já não se poderia falar em suposta conduta criminosa quando do novo, novíssimo e “estranho” entendimento do TCU acerca das malfadadas “pedaladas fiscais”. Explicamos de forma didática, pois parece que a esquizofrenia golpista não quer raciocinar sob o manto e prisma da legalidade estrita.
O TCU afirmara sempre que as sobreditas pedaladas, coisa corriqueira praticada por todos, frise-se, todos os antecessores de Dilma Rousseff, eram meras irregularidades contábeis que não infringiam, e ainda não infringem, a lei orçamentária governamental, logo a conduta “criminosa” imputada a ela, baseada em novo entendimento, ou melhor, mero parecer do TCU, não se faz capaz de configuração de conduta DOLOSA para efeito de crime de responsabilidade a que estaria sujeito o instrumento jurídico – pressuposto – para desencadear o processo político – formatação – do impeachment no sistema brasileiro. Aqui procuraram pelo em ovo e parece que na esquizofrenia golpista entenderam haver uma vasta cabeleira na concepção da criação ovípara.
Fosse só por aí já seria ridícula, para não dizer desprezível, o processo de impeachment recepcionado pelos probos processados e, na sua maioria, condenados por corrupção, deputados federais, ora julgadores desta causa. Parece ser absurdo, mais aqui os réus são os juízes! A coisa é mais aberrante. Não houve qualquer ofensividade jurídico penal na conduta da Presidente Dilma Rousseff e como se sabe, ou talvez, não saibam os relapsos faltosos das aulas iniciais de Direito Penal (inclua-se também de Direito Financeiro) a ofensividade é requisito básico para se caracterizar a conduta criminosa através do bem jurídico afetado. Qual seria o bem jurídico afetado? A solidez e saúde financeira dos bancos públicos que adiantaram o pagamento do bolsa família e do crédito rural e depois foram pagos regiamente? Por força lógica que não! A credibilidade dos bancos públicos? Também não! A formalidade das contas públicas que ainda sequer foram JULGADAS pelo Congresso? Por óbvio que não. Qual o bem jurídico tutelado pela tipicidade normativa do crime de responsabilidade fiscal? Ninguém conseguiu apontar ainda qual seria o grande CRIME da Presidente, mas na esquizofrenia paranoica do “FORA DILMA, FORA PT” estão aceitando até gato por lebre para solapar mais de 54 milhões de eleitores que foram às urnas de forma democrática em outubro de 2014 dando ao projeto vencedor a legitimidade devida para sua continuidade.
Não há crime, pois não há afetação a bem jurídico algum. Os bancos públicos que adiantaram o repasse vão bem obrigado, tendo cada vez mais solidificadas suas finanças. As pessoas que precisavam se alimentar foram alimentadas, quem precisava do crédito rural recebeu devidamente seus repasses e o Brasil segue seu curso normal de desenvolvimento, salvo pela corja de corruptos que se instalou no Congresso Nacional atrás de cargos, benesses, dinheiro e poder tentando dar um golpe paraguaio porque não souberam e não se contentaram em perder de forma democrática nas urnas. Para eles, igual a menino amarelo só vale se o candidato deles finalmente ganhar. E para isso tá valendo tudo: dedo no olho, puxão de cabeço, ladrão julgador, golpista conspirador, judiciário aparelhado e, lógico, aquela forcinha da mídia para dar ares de que tudo isso está dentro da mais pura legalidade.
O golpe dos esquizofrênicos abusa do Direito Penal, do Direito Financeiro, solapa a democracia e tenta apear do poder aquela que não se encontra em qualquer lista de corrupção, que não possui offshores em paraísos fiscais, mas que ousou pagar o bolsa família aos miseráveis e o crédito rural aos pequenos produtores. E você, se fosse Presidente do Brasil, na escolha entre deixar seu povo morrer de fome e ajustar a contabilidade dentro do ano contábil de forma tardia, como foi feito, o que faria?
Esquizofrênicos, não vai ter golpe!