O CadaMinuto desta edição – em parceria com a Rádio Jornal AM-710 – traz uma entrevista com a secretária municipal de Assistência Social de Maceió, Celliany Rocha. Durante a conversa, ela fala das dificuldades que a pasta vem enfrentando de manter os programas federais diante da crise econômica que o Brasil vem vivenciando.
A maioria dos programas da pasta depende de verbas federais. Há casos em que – pelo menos um deles – vem sendo mantido quase que exclusivamente pela Prefeitura de Maceió. Esta é uma preocupação em relação ao futuro da pasta que pode até colocar em risco a estrutura de apoio do Bolsa Família, por exemplo.
“As verbas federais estão escassas e a assistência social, que é uma política pública que é algo que depende dos três entes e do governo federal essencialmente, deve sofrer muito com isto, como vem sofrendo. Nós trabalhamos as políticas sociais com o que chamamos de pisos e para alguns pisos nós não recebemos verbas federais desde outubro do ano passado”, destaca a secretária. Confira a íntegra da conversa.
A crise econômica pela qual o país passa pode vir a afetar, como se tem comentado nos bastidores, os principais programas sociais que são geridos pela pasta que a senhora comanda no município de Maceió. Quais são as dificuldades e como o governo municipal tem lidado com isto?
Bem, é realmente uma situação muito difícil. As verbas federais estão escassas e a assistência social, que é uma política pública que é algo que depende dos três entes e do governo federal essencialmente, deve sofrer muito com isto, como vem sofrendo. Nós trabalhamos as políticas sociais com o que chamamos de pisos e para alguns pisos nós não recebemos verbas federais desde outubro do ano passado. Então, a gente tem travado uma batalha para não permitir que os nossos serviços parem. O prefeito (Rui Palmeira/PSDB) tem sido muito categórico em afirmar que não vamos parar os serviços. Enquanto a gente aguarda os novos repasses do governo federal, o município vem mantendo os programas de uma forma que é “aos trancos e barrancos” porque dependemos da União até em questões tributárias, como é o caso do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que tem sofrido esta redução que todo mundo tem visto.
E o que anda mais ameaçado diante desta realidade?
Alguns pisos a gente está sem receber recursos. Hoje, o que está em grande ameaça – não só em Maceió, mas também em outras cidades, é o serviço de fortalecimento e convivência de vínculos. É um serviço que funciona ligado ao CRAS e a gente vê que as crianças que participam, que se alimentam por meio deste programa, participam dele em um horário diferenciado da escola. Se a criança estuda pela manhã, ela vai ao CRAS na parte da tarde. E não atende apenas crianças, mas idosos e jovens. Tem todo um público definido em que é levado em conta a situação de vulnerabilidade. Eles vão buscar uma formação, seja profissional ou social, para mudar de realidade. Lá são contratados pedagogos, orientadores, pessoas que trabalham com teatro, música e outras questões lúdicas. Este serviço é basicamente custeado por verbas federais e é um serviço, sem sombra de dúvidas, ameaçado pelo atual momento.
Como então a secretaria vem mantendo um programa como este que deve ser caro? Verbas próprias?
Isto. A gente vem mantendo com verba própria e ainda tem saldo de repasses anteriores. A nossa sorte é que gestões anteriores não utilizaram 100% deste recurso federal e isto tem possibilidade que a gente corra atrás destas verbas para manter um programa como este. Nós fizemos uma solicitação para usar os recursos que já deveriam ser devolvidos porque eram de anos bastante anteriores.
Este programa – em Maceió – atende a quantas pessoas?
Ele atende cerca de quatro mil crianças fora os idosos, mas deve chegar a cinco mil pessoas neste programa. Ficar sem ele é um problema grave. Pois nós temos problemas graves no município em função da fragilidade desta falta de vínculos onde há mais vulnerabilidade social. Temos convênios com Juvenópolis, entidade Dom Bosco, que são parcerias importantes que fazem parte deste programa de convivência. Há programa de capacitação de mulheres custeado por estes recursos. Há 15 dias estive em Brasília para questionar sobre a manutenção deste trabalho. Fui lá e perguntei: e aí, o recurso vai retornar ou não vai? Eu fecho as portas ou não? Porque se não pensar em médio e longo prazo vai chegar uma hora em que o município não vai poder funcionar com esta estrutura estando sozinho.
E como lidar com esta realidade de não poder mais ofertar um programa? Esta reflexão é necessária porque na hora em que um programa deste sofrer de fato ao ponto de não poder ser executado, vai todo mundo bater panela na porta do município...
Na verdade, a gente trabalha com pessoas. Quando eu vou fazer um apelo ao governo federal é preciso ter certo tato para não criar arestas ou espécies de raiva que prejudiquem ainda mais a situação. A gente fica numa situação complicada.
E em relação ao Bolsa Família que é o principal programa social do governo federal. Como está a realidade do Bolsa Família em Maceió? Os critérios? Enfim, hoje em dia parece ser uma moeda eleitoral sem critério algum.
Em Maceió, são 11 milhões injetados na economia por meio do Bolsa Família. Só por esta razão, o programa já é válido. Existe transferência de renda e pessoas com poder aquisitivo para ter serviços e bens. As pessoas com este poder aquisitivo faz aquecer a economia. São 80 mil famílias hoje e há pessoas para entrar e para sair. Critérios existem, mas a grande questão é que o Bolsa Família funciona de forma auto-declaratória e a fiscalização só ocorre depois disto. Parte-se do princípio que as pessoas vão lá para contar a verdade e – na maioria das vezes – as mulheres são responsáveis por esta gestão de recurso. Quando entra no sistema são feitas visitas técnicas, agora não dá para visitar as 80 mil famílias que hoje estão no programa. Então, a fiscalização por amostragem ou por denúncias. A gente trabalha com muitas denúncias, algumas feitas pela Polícia Federal. Após a denúncia, o sistema é informado e a pessoa é excluída do sistema. Mas há critérios e eu garanto que as condicionalidades do Bolsa Família – aqui em Maceió – também funcionam. A criança que não vai à escola, a Secretaria de Educação nos manda a informação. É algo bem afinado. Os conselhos municipais também auxiliam.
São mais de 320 mil pessoas participando – em média – do programa. É o mais forte programa social do Cadastro Único em Maceió. E o número assusta quando levamos consideração à quantidade de pessoas que residem em Maceió. Como a nossa sociedade possui uma vulnerabilidade social extrema. O que me preocupa é que o programa deveria ser – dentro desta realidade – um campo de passagem para reinserir o cidadão, mas ele parece mais um funil, onde é fácil de entrar e muito difícil de sair. Aí vem o grande desafio: como corrigir isto?
O Bolsa Família fez 10 anos. Nós que trabalhamos com assistência social acreditamos que os reflexos do programa vão surgir a partir de agora, com a escolaridade das crianças que foram beneficiadas há 10 anos e agora são adolescentes. Acreditamos que a vida escolar desta criança é que será capaz de mudar o cidadão. Então, os grandes reflexos do Bolsa Família ainda está por vir. Então, é uma geração que teve mais acesso de Educação e Saúde. Agora, claro, o Bolsa Família tem que ser este campo de passagem que você cita, não pode ser um estacionamento para uma família. Quem se desliga voluntariamente do programa – pois existem estes desligamentos – sabem que se entrarem em situação de vulnerabilidade, obrigatoriamente retorna. Agora, as que são desligadas por fiscalização não retornam automaticamente. Enquanto tivermos pessoas vulneráveis, vamos precisar trabalhar para garantir que estas pessoas tenham esta assistência. Nossa política pública de transferência de renda é extremamente necessária.
Estou no twitter: @lulavilar