MP põe Alfredo Gaspar acima da lei, após ignorar 36 presos em única cela

16/07/2015 12:22 - Geral
Por Davi Soares
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Antes da decisão judicial em que o juiz de Direito da Comarca de União dos Palmares, Antonio Rafael Wanderley Casado da Silva, determinou a “reinterdição” da Delegacia Regional de União dos Palmares, sua única cela abrigava 36 presos, sendo quatro menores e duas mulheres, apesar da existência de duas decisões judiciais que já haviam interditado o xadrez daquela unidade da Polícia Civil, em fevereiro de 2014 e em fevereiro de 2015. Estes são fatos que, até a terceira decisão judicial da última sexta-feira (10), eram contemplados pela inércia administrativa do Estado e pela falta de atuação eficaz do Ministério Público Estadual (MP) e do próprio Judiciário.

Mesmo diante daquela afronta à Lei de Execuções Penais e à segurança da comunidade palmarina, o que se tornou “lamentável e repudiável” foi o fato de o juiz ter determinado o bloqueio de R$ 100 mil da conta pessoal do atual gestor e responsável pela Secretaria de Estado da Defesa Social e Ressocialização (Sedres), Alfredo Gaspar de Mendonça Neto. Na manhã da quinta-feira (15), o secretário e promotor de Justiça recebeu apoio e solidariedade de colegas do MP, por meio de visita do procurador-geral de Justiça, Sérgio Jucá; do diretor da Escola Superior do MP, o ex-secretário e procurador de Justiça Eduardo Tavares; e da presidente da Associação do Ministério Público de Alagoas (Ampal), promotora Adilza Inácio de Freitas, além do promotor de Execuções Penais, Flávio Gomes Costa, e dos promotores de Justiça Luiz Medeiros, Norma Medeiros, Marluce Caldas e Manoel Carvalho.

“Agora, o magistrado resolveu aplicar esta sanção, que é esquisita porque seu autor é um juiz de direito (!!!). Quem não sabe que para fazer uma obra se leva mais de 30 dias? Existe um processo de licitação, que é algo longo e complexo. Quem proferiu esta decisão ignorou a existência de lei que trata do assunto, a Lei de Licitações”, arvorou-se Jucá, em defesa do colega de profissão que comandava o Grupo Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gecoc) durante sua gestão do MP.

Sem citar a absurda ilegalidade de se manter adolescentes, mulheres e adultos em única cela superlotada, Jucá justificava o processo burocrático para a reforma da delegacia, depois de Alfredo Gaspar afirmar em nota oficial, ainda na sexta-feira (10), que aguardava o término da reforma de um módulo do Presídio Baldomero Cavalcanti para fazer a transferência, executada imediatamente após a decisão judicial, que apesar de repudiada, teve eficácia instantânea. Para Alfredo Gaspar, tudo estava previsto e calculado, e a decisão que também bloqueou R$ 1 milhão do Estado seria “repudiável por desprovida de razoabilidade”, apesar de esperar quase cinco meses desde a última determinação.

“Precisamos deixar os presos trancafiados, mas jamais descumpri decisão judicial. Não posso me transformar em porteiro de delegacia. Sou um gestor de segurança pública. Busco repassar todas as determinações judiciais, a fim de que sejam cumpridas de imediato. Sou um trabalhador, um assalariado. Abandonei minha família, meus amigos, minha rotina pessoal para cuidar, 24 horas por dia, da segurança dos alagoanos, e não posso acordar com esta multa por algo que está muito além das minhas responsabilidades”, disparou o titular da Sedres.

Na maioria das manifestações em defesa do secretário e em sua própria nota oficial, a responsabilidade do secretário, que vai muito além da portaria de delegacias, é minimizada e compensada com a citação das ações coordenadas por Alfredo Gaspar, que reduziram em mais de 20% os números oficiais de crimes violentos letais e intencionais em 2015, prendendo e matando mais criminosos. Outras culpadas eleitas são a lentidão da Justiça e suposta falta de entendimento entre juízes de União dos Palmares e de Execuções Penais, na capital.

Confronto irresponsável

Mas a Associação Alagoana de Magistrados (Almagis) bem lembra que os caminhos a serem seguidos diante discordância de decisões judiciais são os recursos cabíveis, após o cumprimento das mesmas. Para a entidade que saiu em defesa do juiz Antonio Rafael Wanderley Casado da Silva, o secretário faltou, no mínimo, com a educação e a ética, ao afrontar a decisão judicial e considerá-la esdrúxula em nota pública, dando péssimo exemplo aos demais alagoanos. Cidadãos estes submetidos a uma gestão da segurança pública que confronta politicamente uma medida que visa o cumprimento da lei, objetivo que deveria ser comum ao Judiciário e ao gestor público, seja ou não promotor, tenha ou não competência para promover a redução da violência.

A postura do MP e de seus representantes tem um tom maquiavélico e nocivo à relação entre as instituições que devem atuar na promoção da paz, desprovidas de vaidades e atitudes irresponsáveis que possam resultar, por exemplo, em rebeliões, desrespeito à legislação ou fugas em massa que ponham em risco as comunidades próximas a delegacias. Porque, como também sinalizou a nota da Almagis, a redução dos índices de criminalidade, por meio da atuação da Sedres, não legitima nenhum agente público ou entidade representativa a colocar em segundo plano o respeito às decisões judiciais.

“Que se não busque tirar o foco dos demais problemas estruturais com o sucesso alcançado em algumas áreas de atuação”, eis a conclusão da Almagis, que tem a concordância plena deste jornalista.

(Na manhã desta quinta-feira, um agente da Polícia Civil afirmou que a única cela da delegacia de União dos Palmares não recebeu mais presos. E informou que, antes da decisão judicial, havia 36 presos na cela, com a presença das mulheres e dos adolecentes junto aos adultos)  

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