Era mais que óbvio que o senador Fernando Collor de Mello (PTB) também reagiria à ação da Polícia Federal (PF), que esteve nas empresas e casa do petebista, na tribuna do Senado Federal. Collor não só usou a tribuna como recebeu o apoio dos colegas, inclusive o presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB).
Ambos - juntamente com o terceiro senador alagoano: Benedito de Lira (PP) - figuram na lista dos investigados. Claro, podem ser inocentes. Defendem suas inocências. Devem fazê-lo. Devem ser ouvidos. É o Estado Democrático de Direito. Logo, só serão considerados culpados se condenados. Até lá, divulgação dos fatos e cobrança de apurações. E tais fatos existem por haver indícios que sustentam as investigações. Fernando Color de Mello, no caso, ainda teve o constrangimento de ver carros importados que são seus, conforme as investigações, serem conduzidos à PF e causarem diversos questionamentos e piadas nas redes sociais.
O conjunto da obra - incluindo a exposição do IPVA atrasado dos veículos - levou Collor a classificar a ação como midiática. Na tribuna, na tarde de hoje, 16, o senador petebista de Alagoas foi enfático e voltou a atacar o procurador-geral de Justiça, Rodrigo Janot. “Abusos como esses não podem voltar a acontecer”. Collor mais uma vez escolheu como alvo a mídia e Janot, deixando de lado os delatores.
Vale ressaltar: as denúncias que Collor faz em relação a Janot são graves e precisam ser apuradas. Desde que Collor as fez, cobro do procurador-geral os devidos esclarecimentos para cada ponto apontado pelo senador. Afinal, Janot é também uma figura pública. Não se encontra acima da lei. Todavia, isto não exclui a necessidade de se apurar o possível envolvimento de Collor com a Lava-jato diante do muito que foi dito. Não exclui se cobrar o mesmo do senador. Fernando Collor de Mello se revoltou com o fato da ação ter - em sua avaliação - deixado de lado o que determina o Supremo Tribunal Federal (STF): discrição.
Há muito que nossa República não é discreta. Seja nas cifras, seja nas ações. O Brasil ainda um samba doido, desafinado e que assusta diante do que se avizinha nos compassos do futuro…
O discurso de Collor também teve momentos de exageros. Talvez em função da dor da exposição pública e por conta dos excessos que ele mesmo denuncia. O senador tem parcela de razão, mas só parcela. As ações da PF eram necessárias. Não se podia permitir que provas documentais, diante dos apontamentos dos delatores se perdessem. Era urgente a ação. Poderia não ser pirotécnica, é bem verdade. Mas não são desnecessárias. Muito pelo contrário. Independente de quem seja, pesa.
O petebista deu a entender que nas ações da Lava-jato, as demais instituições democráticas estariam submissas ao aparato policialesco do Ministério Público Federal (MPF). O que não é uma verdade, na humilde opinião deste blogueiro. As ações estão possuindo um trâmite, inclusive com a abertura dos inquéritos sendo analisadas pelo próprio STF, que julgou se estes deveriam seguir ou não a partir do que ficou conhecido como a “lista de Janot”. Os exageros foram pontuais, o que não significa que não devam ser criticados.
Todavia, para Collor o que está sendo promovido com as ações das quais ele foi o alvo é uma “cultura do apedrejamento”. “Aquela (a cultura do apedrejamento) em que se causa um dano à pessoa e, depois, ela que procure reparar o dano. Isso é degradante. Isso é atitude de covardes, de facínoras que se dizem democratas mas que, na prática, aplicam e se aproveitam de sua autocracia”, bravejou. É exagero collorido.
O senador ainda frisou que tais atos foram mais graves do que os que ocorreram nos tempos da ditadura. Um passeio pela história mostrará claramente - até mesmo em respeito dos que foram torturados, mortos e dos que desapareceram - que se trata de mais um exagero. Mas Collor tem o seu direito à interpretação dos fatos, ainda mais quando ele é o alvo e precisa mesmo prestar esclarecimentos à opinião pública e ter direito ao amplo contraditório: “Não sei do que estão querendo me acusar. Repito, não me permitem vista aos autos das investigações. Não tenho sequer o direito de prestar depoimento e dar explicações quando julgo necessário. Não há sequer denúncia feita. E, mesmo assim, tentam usurpar o meu direito à presunção de inocência, uma cláusula pétrea da Constituição subjugada pelo Ministério Público Federal”, acrescentou.
Eis a acusação mais grave de Collor em minha opinião: “o MPF está deformando o Estado de Direito e desvirtuando os fundamentos e os princípios da democracia brasileira, e até mesmo dos direitos humanos”. Com a palavra o órgão ministerial. Fernando Collor fala de um “ambiente criado pela mídia”. Eis que o ambiente não foi criado pela mídia, mas sim por um governo que permitiu um esquema criminoso nunca antes visto dentro da Petrobras. Parte da mídia tem sido até benevolente com tudo que precisa ser divulgado e cobrado, na exata proporção necessária de cobranças e divulgações. Obviamente, quem for podre que se quebre. Quem for inocente, que tenha sua inocência devidamente reconhecida. Que a Justiça diga em qual dos grupos Collor estará. O que não cabe - evidentemente - é pré-julgamento.
E digo isto com a consciência de quem não olha partidos. Por exemplo, já disse antes e repito, por mim se investigaria também o tucano Aécio Neves (PSDB), citado logo no início.
No entanto, culpar a mídia pela exposição de um escândalo que enoja todo e qualquer brasileiro de bem é um pouco demais. Claro que há jornais que se excedem e até mesmo os que mentem, mas em relação a Collor, os jornais que se mantiveram pautados pela honestidade intelectual divulgaram acusações graves feitas por delatores deste esquema criminoso. Nestas delações surgiram o nome de Collor. Ora, é um senador. Uma figura pública. Precisa prestar esclarecimentos - como diria Renan Calheiros - à luz do dia.
Collor alega inocência e deu sua versão dos fatos várias vezes. Todas foram publicadas em muitos jornais nacionais e locais. Imprensa não deve se calar, nem se omitir diante de graves fatos. Deve cobrar as devidas explicações e ressaltar que há sim a presunção da inocência. Como digo aqui: o senador petebista pode sim ser inocentado. Mas é fato que ele é alvo de uma investigação que abala o país com base em indícios e delações premiadas. Isto é notícia aqui e alhures.
A monta dos fatos não se deve à imprensa, mas ao governo federal e seus aliados que - por fisiologismo em nome da governabilidade - se instalaram nas estatais e perpetuaram esquemas que, conforme a Polícia Federal, serviram para robustecer cofres partidários. As estatais viraram empresas privadas de partidos políticos da base aliada e do próprio PT. Repito: quem tem culpa nisto, que pague. Acho que todos os alagoanos - envergonhados com o ocorrido - torcem para que nossos senadores sejam inocentes. Restará - ao cabo do processo - conhecer se são ou não.
Agora, um ponto que quero chamar atenção: um jornalista de Veja - Reinaldo Azevedo - que é tão execrado quando convém aos da base aliada pelas críticas que faz ao governo no exercício de sua liberdade de expressão foi usado como base das argumentações, ao menos no texto da assessoria de imprensa de Collor, como subsídio para defender a visão de que o Estado Democrático de Direito está ameaçado com as ações da PF.
Quem diria, hein?! Aquele que antes estava em uma revista que sequer merecia credibilidade é agora o detentor de argumentos que merecem destaque. Azevedo - assim como Collor - fazem ponderações que obviamente merecem ser lidas. Mas veja como o mundo dá voltas. Nunca pensei de um dia ver o jornalista Reinaldo Azevedo servindo de inspiração para quem quer que seja da base governista.
Eu particularmente sou leitor de Azevedo. Gosto dos textos dele. Acho que ele tem um poder argumentativo impressionante e tem uma didática primorosa ao explicar o que pensa. E digo isto mesmo quando discordo de Azevedo, e discordo dele em vários momentos. Quando convém, nossos bravos guerreiros governistas sabem reconhecer os méritos daqueles que já o criticaram.
Eis um dos trechos da matéria oficial da assessoria de Collor: “para Collor, de divulgação em divulgação, de vazamento em vazamento, de indução em indução, de coerção em coerção, de busca em busca, de espetáculo em espetáculo, forma-se todo um ambiente aparentemente democrático, um cenário supostamente com ares de justiça. Ele apontou que toda uma história, todo um conto contado pelas palavras e ações planejadas única e exclusivamente pelo MPF e executadas em parceria com os meios de comunicação, são usados, segundo o senador, nesses casos, como meros instrumentos de formação – “de forjamento” – de uma versão com a sociedade, porém, da maneira e do feitio como eles mesmos desejam”.
Collor também traz uma ideia ao plenário: “Diante destes fatos, Collor informou que propôs a criação, no âmbito do Congresso Nacional, de uma agenda suprapartidária, isenta política e ideologicamente, com objetivo de atuar de forma a garantir que o Ministério Público retome suas atribuições e competências originais, com plena autonomia e liberdade. No entanto, esclareceu o senador, estritamente dentro de suas prerrogativas, dentro dos limites constitucionais e dos princípios fundamentais do Direito”. O problema é confiar em uma ação isenta política e ideologicamente quando estão no jogo os interesses direto de um Executivo que teme que a Lava-jato suba a rampa do Planalto.
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