“Apesar de apresentar decréscimo em todo o Brasil, inclusive em Alagoas, a mortalidade materno-infantil ainda está longe do ideal. No caso do nosso Estado, há um agravante: não houve melhora na assistência obstétrica nos últimos 10 anos”. O desabafo é do presidente do Conselho Regional de Medicina de Alagoas, Fernando Pedrosa, lamentando que as promessas de melhora do setor não sinalizam para concretização, e da meta preconizada pelo Ministério da Saúde, de 22 óbitos para cada 1000 nascidos, estamos com 46,4.
Ele explica que o problema está na precarização da assistência obstétrica. Para se ter uma ideia, na última vistoria feita pela médica fiscal Carmem Lúcia Passos de Carvalho (da equipe do CREMAL) na Casa de Parto Denilma Bulhões, da rede de saúde de Maceió, foram constatadas diversas irregularidades. “Notificamos a Secretaria de Saúde de Maceió sobre a situação de inconformidade. Passados mais de 30 dias os gestores não se pronunciaram e não deram retorno ao CREMAL. Tudo continua em péssimas condições. Não foi tomada uma providência sequer para sanar os problemas”, critica Pedrosa.
Segundo o relatório da médica fiscal Carmem Lúcia de Passos Carvalho a legislação autoriza casa de parto, mas há de se cumprir uma série de requisitos. Um deles é de que a unidade se estabeleça a cerca de 500 metros de um hospital ou maternidade. No exemplo da Denilma Bulhões, no Benedito Bentes, a referência é o Hospital Universitário, situado a quase cinco quilômetros de distância. Além disso, de acordo com a Portaria 371/2014, do MS, toda casa de parto deve ter médico pediatra e obstetra 24 horas, mas na Denilma Bulhões apenas enfermeira, parteira e técnicas de enfermagem trabalham na assistência às parturientes. “Em termos de infraestrutura não existe um item que atenda as recomendações para o atendimento médico. Falta medicação básica como misoprostol (indicado para dilatar o colo uterino e trabalho de parto, de modo geral), anticonvulsivo (indispensável para tirar a gestante de uma convulsão), ergometrina (útil para controlar a pressão arterial), material de reanimação e, enfim, até soro fisiológico”, diz o relatório do CREMAL.
De acordo com o presidente do Conselho de Medicina, na rede estadual a deficiência na área obstétrica também é absurda. “Não acreditamos que a obra de reforma da Maternidade Santa Mônica, por exemplo, seja concluída neste ano. Recentemente fizemos uma visita ao local e não observamos um avanço significativo nos serviços. Era para ter sido entregue a população em setembro, mas na prática ninguém sabe ao certo quando a maternidade reabrirá”, afirma Pedrosa, acrescentando que se na Capital a realidade é precária, no interior é ainda pior. “Infelizmente, como parto não dá lucro, na hora de parir as mulheres contam somente com a sorte”.
Ainda sobre a Casa de Parto Denilma Bulhões, que é da rede municipal de saúde, Fernando Pedrosa explica que o gestor municipal recebe incentivo financeiro federal por fazer parte do Programa Hospital Amigo da Criança. Mesmo assim, não tem nem roupas para os leitos, equipamento de proteção individual nem batas para as parturientes. Não há serviço de apoio diagnóstico e terapêutico, cardiotocógrafo, oxímetro de pulso, nada.
Diante dessas condições, Pedrosa pede as autoridades competentes, como os representantes do Ministério Público, que tomem atitudes cabíveis junto aos gestores porque o Conselho já fiscalizou e vem notificando as respectivas Secretarias de Saúde dos Municípios onde são detectadas irregularidades. “Nossa autarquia não tem o poder de punir. Nós fiscalizamos, orientamos como deve ser feito, e denunciamos quando há descaso. Esperamos que a Justiça adote medidas duras contra esse tipo de negligência”, dispara Fernando Pedrosa, lembrando, ainda, que de modo geral, desde 2004 o Brasil vem registrando decréscimo na estatística de óbito neonatal e materno infantil, incluindo Alagoas.
De acordo com os dados do Estado no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM, do Ministério da Saúde), de janeiro a agosto de 2014 foram registradas 449 óbitos infantil e fetal. Se observarmos apenas o índice de morte materna constam no SIM 647 óbitos – basta acessar o painel 2014 de monitoramento de mortalidade materna disponível no site do Ministério da Saúde. “Comparado aos anos anteriores houve redução, mas o número ainda é preocupante, e se a assistência obstétrica não avançar em nível local esses indicadores podem até subir novamente”, alertou Fernando Pedrosa em entrevista coletiva concedida ontem, antes da abertura da programação comemorativa da semana do médico.