O que seria de Sherazade sem suas fábulas? Talvez nenhum outro livro tenha demonstrado de forma tão inequívoca o poder de uma boa história quanto “As mil e uma noites”, clássico da literatura mundial. Tal fascínio sobrevive ao tempo e preserva na memória aquela primeira vez, geralmente na infância, onde nos descobrimos como o Rei Shariar: apaixonados pela narrativa, seja ela lida, contada ou filmada. Real ou imaginária.
Para celebrar nossa paixão por contar histórias e comemorar o Dia das Crianças, o CadaMinuto convidou adultos de profissões, idades e histórias de vida diversas a revelarem qual livro marcou sua infância, aquele que foi o início de um amor que perdura até hoje. Entre os clássicos de Monteiro Lobato e “O pequeno Príncipe”, de Saint Exupéry, há também tesouros desconhecidos que sempre podem ser descobertos.
Longe de ser uma espécie de guia, as impressões reunidas aqui mostram um pouco daquilo que ajudou a moldar os gostos e até o caráter de tantos adultos e poderão servir de inspiração para essa e para as gerações futuras. Ao final da leitura, o rei ordenaria: – Conte-me outra! Ao que a esposa responderia: - Já amanheceu...
Sherazade em espanhol
Por falar nas Mil e uma noites, foi justamente essa obra que marcou a infância da escritora Yara Cecy, autora de diversos livros. Ela conta que o presente dado pelo pai era escrito em espanhol, o que também a ajudou a conhecer a se familiarizar com a língua, com apenas sete anos.
“Fiquei fascinada pelos contos populares árabes, indianos e persas. E saber que Sherazade tinha sempre que inventar uma história para o rei todas as noites para não morrer na manhã seguinte me deixava extasiada. Li repetidas vezes”, relembra, citando ainda as obras de Monteiro Lobato e Júlio Verne como fundamentais em sua primeira fase de leitora.
Boneca de pano
A jornalista e professora universitária Amanda Machado, conta que sua primeira relação de amor com a literatura e com a História se deu por meio de uma coletânea de Monteiro Lobato, presente dos pais: “Lembro que na época passava o Sítio do Pica-Pau Amarelo na televisão, então eu não só lia como assistia àquelas aventuras. Eu tinha adoração pela Emília e pelas viagens que ela fazia no antigo Egito, na mitologia... Eu sonhava com o labirinto do Minotauro”.
Amanda conta que sua paixão por história, principalmente a grega, perdura até hoje. Livros com essa temática estão entre os seus favoritos, muito em parte graças a uma adorável boneca de pano.
O blogueiro de cinema e jornalista Chico Firemann também elegeu uma obra de Monteiro Lobato como a mais marcante: Reinações de Narizinho. “Eu amava o Sítio do Pica-Pau Amarelo da TV e ler as aventuras daquela turma foi uma extensão natural. Monteiro Lobato sempre trabalhou com a imaginação infantil, criava um universo meio mágico, meio lúdico, mas que falava sobre o ser humano. Pedrinho era um herói que todo menino queria ser. E aquela magia era extremamente sedutora”, derrete-se o blogueiro, até hoje apaixonado por contar, ouvir (e principalmente) assistir histórias.
Curiosidade e otimismo
Também convidado a responder a pergunta, o prefeito de Maceió, Rui Palmeira, não pensou duas vezes para escolher a obra que marcou sua infância: “A curiosidade premiada”, de Fernanda Lopes de Almeida. “O livro é bastante interessante e conta a história de uma menina muito curiosa, que perguntava a razão de tudo. Inclusive, a personagem lembra muito a minha filha, que está nessa fase de perguntar o porquê das coisas”, conta, demonstrando que o amor pelos livros é algo que pretende cultivar.
“Pollyanna”, de Eleanor H. Porter foi o eleito da jornalista Eliane Aquino, que resumiu a escolha: “O otimismo e a generosidade dela ficaram para sempre em meu coração”.
Já o odontólogo Walmar Brêda conta que “O pequeno Príncipe“, o preferido de "dez entre dez misses”, como ele mesmo faz questão de frisar, foi também o seu escolhido: “Eu devia ter uns 7 ou 8 anos e li estimulado por minha mãe. Lembro claramente de cada ilustração e de ter lido em poucos dias. Porém, só fui entender a profundidade da história e as metáforas de seu conteúdo ao reler na adolescência”.
Bíblia e aquarela
Quando ainda nem sonhava em conquistar importantes títulos mundiais e olímpicos, o paratleta Yohansson Nascimento se apaixonou pela versão infantil da Bíblia: “As histórias recheadas de imagens prendiam a atenção e faziam com que eu me imaginasse na época”.
Com formação cristã, Yohansson revela que sempre gostou de livros bíblicos, mas também não abria mão dos quadrinhos da Turma da Mônica, do desenhista Maurício de Souza, sucesso ainda hoje no Brasil e no mundo.
Já a cantora Elisa de Carvalho trouxe uma novidade para a lista: o livro “Lilás”. “Era um livro de rimas com arte aquarelada. Lembro de gostar muito dele, porque o nome da personagem, Lilás, era o mesmo de uma prima minha e pelo fato da menina (do livro) de tão pouca idade ser tão independente”.
Polêmicas e poemas
A lembrança mais rápida que veio a mente da cientista política Luciana Santana ao ouvir a palavra “preferido”, foi “O estudante”, de Adelaide Carraro: “Foi marcante porque era um drama que tratava de assuntos polêmicos, como as drogas, que atingiam muitos adolescentes, mas estavam longe da minha realidade, já que quase não ouvíamos relatos de pessoas próximas e víamos poucas notícias veiculadas sobre o assunto. Estava entrando na adolescência e aquela leitura virou um alerta vermelho. Gostei tanto, que depois li os outros dois da série”.
“Literatura infantil nunca me seduziu, nem na infância”, destaca a empresária cultural Sue Chamuska, sem medo de polêmicas. Ela conta que a literatura que a marcou foi Fernando Pessoa, com os poemas de Álvaro de Campos.
“Os responsáveis por essa escolha foram minha mãe e Maria Bethânia. Explico: mamãe tinha um amigo que foi a Portugal e trouxe um disco com poesias de Pessoa, interpretadas por um ator português chamado Sinde Filipe. Eu ouvia mais que eles. Maria Bethânia, com seus discos fenomenais, onde Fernando sempre esteve e está presente”, relembra a empresária.