Diante de um crime emblemático, envolvendo personagens do cenário político no Brasil, o surgimento de uma nova versão sobre as mortes de PC Farias e Suzana Marcolino marcou o caso de maior repercussão nacional da década de 90. O laudo pericial confeccionado pelo médico legista George Sanguinetti foi na contramão das investigações e apontou para um duplo homicídio ocorrido dentro da casa de praia do empresário, na noite do dia 23 de junho de 1996. “O crime não foi passional, passional foi o primeiro inquérito”, pontuou.
Como era um caso sem possíveis testemunhas, baseado somente em provas técnicas e cientificas, Sanguinetti derrubou a tese do médico legista Badan Palhares, que apontava o caso como um crime passional, onde Suzana teria assassinado PC e se matado logo em seguida. Após 17 anos do crime, que mudou sua vida, Sanguinetti recebeu a reportagem do CadaMinuto em sua residência e lembrou de pontos que o ajudou a comprovar sua tese.
O médico legista entrou nas investigações dois anos após as mortes, mas sempre contestou a versão oficial da Polícia alagoana. A pedido do juiz Alberto Jorge de Barros, Sanguinetti realizou diversos estudos usados para escrever livro “A Morte de PC Farias: O Dossiê de Sanguinetti”, que lhe rendeu o prêmio Jabuti de literatura, em 1998.
Sanguinetti afirma que vários indícios encontrados na cena do crime e nos corpos das vítimas o conduziram para a conclusão de um duplo homicídio. Em uma das ilustrações de sua obra, o legista argumenta que pela projeção da bala que atingiu PC Farias e a posição do corpo, Suzana estaria levitando ao efetuar o disparo.
Segundo ele, o empresário não foi morto no quarto e os corpos foram arrumados na cama. “Quem praticou o crime fez uma maquiagem muito grosseira, tão grosseira que consegui descobrir”, enfatizou Sanguinetti acrescentando que pela posição que supostamente Suzana efetuou o tiro em seu peito, o projétil teria atingido, no mínimo, o assoalho da cama e não a parede com uma altura de 80 cm.
Outro ponto questionado pelo legista foi a falta de impressões digitais na arma do crime. O revólver calibre 38 pertencia à Suzana, que segundo familiares, a época, comprou para a sua segurança. “A arma estava em distância de quase dois metros do corpo de Suzana e não apresentava digitais, nem da própria Suzana, que teria deflagrado os disparos. O tiro no corpo de Suzana foi à queima roupa e um tiro à queima roupa é característica de homicídio”, enfatizou.
“PC foi morto logo após o jantar e Suzana passou mais de cinco horas sendo torturada. Durante a perícia no corpo de Suzana foram encontrados sinais de espancamento no seu rosto, tanto que na época a família questionou um hematoma em sua testa, mas o Badan Palhares justificou dizendo que era livores cadavéricos. Mas, os livores cadavéricos não desaparecem após 16 hora da morte e Badan só chegou a Alagoas 15 dias após o crime. Suzana foi vítima de uma grande farsa, ela estava no local errado e na hora errada”, acrescentou.
As investigações sobre o caso PC Farias mudaram os hábitos de vida do legista e isso se reflete até hoje. Coronel reformado da Polícia Militar de Alagoas, Sanguinetti lembra que logo após a conclusão do laudo passou a receber ameaças e se considera um arquivo vivo, devido a provas coletadas sobre o crime. “Na época a Polícia Militar concedeu que oito homens fizessem a minha segurança e da minha família. Os meus filhos cresceram nesse ambiente e até hoje a segurança na minha casa é reforçada”, contou.
Segundo ele, a possibilidade de uma solução para o crime do PC Farias incomodava muita gente, e o próprio estado não tinha interesse de que os autores do crime fossem identificados. “A minha contribuição para o caso PC Farias foi dada. Provei que houve um duplo homicídio. Mas há forças poderosas que não queriam que o caso de PC fosse solucionado”, afirmou o médico legista garantindo que o empresário foi silenciado com sua morte, já que se preparava para prestar um depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
Diante das ameaças, Sanguinetti elaborou um dossiê sobre uma possível linha de investigação caso acontecesse algum atentado contra sua vida. O documento está em posse de três autoridades de fora do estado. “Meu nome jamais será esquecido. Prestei um serviço à nação”.