A notícia divulgada na última terça-feira de que a luta poderá ser excluída das Olimpíadas a partir de 2020 surpreendeu os amantes da modalidade e especialistas dos Jogos, que esperavam o possível corte do pentatlo moderno ou até mesmo do taekwondo. No entanto, a já provável saída da modalidade deverá ter uma grande influência sobre o quadro de medalhas e desempenho de alguns países dentro da principal competição esportiva do mundo.

Nas últimas edições olímpicas, as categorias de luta livre e greco-romana distribuíram 72 medalhas, em 18 pódios por Jogos (cada prova rende dois bronzes). Para 2020, a luta disputa com outras seis modalidades o direito de estar na Olimpíada: squash, escalada, caratê, wushu, beisebol/softbol, wakeboard e patinação de velocidade. Nenhum desses esportes, porém, terá um número tão grande de medalhas a oferecer. O wushu seria o único a se aproximar, com até 66 premiados.

Diminuir o número de medalhas com a exclusão da luta proporcionaria, indiretamente, o enfraquecimento de algumas potências do esporte. O fato de esta modalidade premiar tantos atletas ao mesmo tempo, na visão dos críticos, não democratiza o esporte, já que as medalhas ficam concentradas em poucos pólos. E são justamente essas nações que mais têm a perder com a provável decisão do COI, a ser revista em maio e referendada em outubro de 2013.

Essa é uma preocupação assumida do Comitê Olímpico Russo. Mais do que acabar com uma tradição, excluir a luta seria diminuir ainda mais a força do país no quadro de medalhas. Antiga oponente dos Estados Unidos pela liderança, agora a nação se contenta com o terceiro lugar ou até mesmo o quarto, como aconteceu em Londres-2012 graças à força do anfitrião Reino Unido.

A União Soviética é a segunda maior detentora de medalhas da luta na história olímpica, ainda que o bloco extinto tenha participado dos Jogos pela última vez na distante Seul-1988. Até hoje, o grupo de países que dominou a Europa até o final dos anos 1980 soma 56 medalhas nesta modalidade, atrás apenas dos Estados Unidos, com 114. Mas a verdade é que a Rússia manteve a tradição do bloco que liderou durante décadas.

Embora a força russa venha se desmantelando em Olimpíadas, nas lutas ela continua sendo uma potência. Foram 48 medalhas nos últimos cinco Jogos, sendo 24 delas de ouro. Em Pequim-2008, por exemplo, se não houvesse as lutas (em um cenário hipotético no qual a Rússia não venceria nenhuma prova de um outro esporte substituto), o país teria caído do terceiro para o quarto lugar na classificação geral.

Em Londres, as medalhas de luta significaram mais de 13% das conquistas russas. Em Pequim, foram 15%. Considerando apenas os ouros, foram 16% de representatividade em 2012 e incríveis 16% na China.

Para alguns russos mais radicais, a decisão do COI de submeter a luta a uma disputa com seis modalidades novatas tem como intenção justamente prejudicar a ex-potência vermelha. “Em Jogos Olímpicos, lutadores soviéticos e russos conquistaram 77 ouros. Claramente, muita gente não gostava disso. Não estou criando uma teoria da conspiração, mas na minha opinião, essa relevância é óbvia”, comentou Alexander Karelin, tricampeão olímpico e hexa mundial.

Com o maior número de medalhas da história da modalidade, os Estados Unidos devem pouco sofrer caso a decisão do COI seja referendada. Isso porque grande parte dos 114 pódios conquistados pelo país ao longo das Olimpíadas foram conquistadas nas primeiras edições dos Jogos e nas competições sediadas pela própria nação, em Saint Louis e duas vezes em Los Angeles. Em Londres, foram apenas dois ouros (dos 46 conquistados por atletas americanos em toda a competição).

Quem realmente aparece como grande perdedor com a exclusão das lutas do caderno olímpico é o Japão. Perdendo suas forças a cada nova edição olímpica, o país asiático, que em Londres-2012 já sofreu o baque conquistar apenas um ouro no seu esporte mais tradicional, o judô, tem calcado suas conquistas na luta. Foi dela que vieram mais de 50% das medalhas douradas no ano passado. Sem elas, o Japão despencaria do 11º para o 21º lugar.

Mais do que minguar as medalhas japonesas, a exclusão da luta ainda poderia colocar em risco a campanha de Tóquio para sediar justamente a Olimpíada de 2020. Saori Yoshida, tricampeã olímpica, é um dos principais rostos da candidatura japonesa, e perder os pódios considerados ‘garantidos’ poderia minar as expectativas de uma boa atuação dentro de casa.

Longe de serem potências do esporte, outros dois países podem ficar diretamente afetados pela exclusão da luta. Uma das forças da modalidade, o Irã soma 6 ouros nas últimas 5 edições olímpicas, mais de 50% das 11 medalhas douradas do total do país. Em Atlanta-1996, por exemplo, os iranianos foram premiados apenas na luta. O caso do Uzbequistão é ainda mais perigoso. Todos os quatro ouros somados pelo país ex-soviético nas últimas três Olimpíadas vieram desta modalidade.

“Será uma grande perda para os esportes do nosso país”, lamentou Mohammad Ali-Abadi, presidente do Comitê Olímpico Iraniano. “A luta é um dos nossos esportes mais populares e dominantes”.

Tanto americanos, quanto russos, japoneses e iranianos já manifestaram o desejo de enviar pedidos oficiais ao COI para repensar a decisão de tirar a luta do quadro olímpico. A Fila, entidade que coordena a modalidade no mundo, vai se reunir em caráter de emergência nesta semana para decidir o que fazer. As autoridades do esporte têm até maio de 2013 para mostrar ao COI razões pelas quais a luta não pode sair dos Jogos.