Rachel Crosby, representante de vendas em Los Angeles, fala do seu telefone BlackBerry como se estivesse se referindo a um parente incômodo. "Tenho vergonha dele", disse Rachel, que parou de usar seu aparelho em festas e conferências. Ela diz que, nas reuniões, coloca seu BlackBerry escondido sob o iPad, temendo que os clientes o vejam e a julguem.

Antes o BlackBerry era exibido orgulhosamente pela elite e os abastados, mas aqueles que ainda o usam dizem que o aparelho virou imã para zombarias e escárnio das pessoas que usam o iPhone e os mais novos aparelhos Android. A RIM - Research in Motion pode ainda ter sucesso vendendo seus aparelhos BlackBerry em países como Índia e Indonésia, mas, nos Estados Unidos, a companhia detém hoje menos de 5% do mercado de smartphones - uma forte queda em comparação com os 50% de três anos atrás.

O futuro da RIM depende do novo telefone que será lançado no próximo ano; ela registrou um prejuízo de US$ 753 milhões no primeiro semestre, em comparação com um lucro de mais de US$ 1 bilhão há um ano.

Eis alguns dos mais recentes sinais da perda de prestígio: uma dos primeiras medidas que Marissa Mayer adotou ao ser nomeada presidente do Yahoo para restaurar a imagem da companhia foi trocar os BlackBerrys dos seus funcionários por aparelhos iPhone e Android. Os BlackBerrys ainda persistem em Washington, Wall Street e entre advogados, mas no Vale do Silício são tão raros quanto uma gravata.

À medida que encolhe a lista de amigos que outrora se comunicavam usando o serviço de mensagem do BlackBerry, o BBM, muitos proprietários do aparelho não têm papas na língua quanto ao que sentem com relação ao seu telefone. "Tenho vontade de arrebentá-lo", disse Rachel Crosby, depois de esperar o navegador do telefone carregar por três minutos e perceber que a bateria acabou. "Você não consegue fazer nada com ele. Deveria, mas é tudo uma grande mentira".

Concorrência. A divisão cultural entre os adeptos do BlackBerry e os outros aumentou ainda mais quando as empresas que antes forneciam estes aparelhos para os funcionários - e apenas estes - se renderam às demandas por iPhones e smartphones com o sistema Android.

O Goldman Sachs recentemente deu aos funcionários a opção de usar o iPhone. O grande escritório de advocacia Covington & Burling fez o mesmo, por insistência dos seus associados. Mesmo a Casa Branca, que usava o BlackBerry por motivos de segurança, recentemente acabou adotando o iPhone.

Mas os insultos continuam, Victoria Gossage, corretora de fundos hedge, de 28 anos, disse ter participado há pouco tempo de uma convenção da empresa no Piping Rock Club, um clube de campo de luxo em Locust Valley, Nova York, quando pediu à recepcionista um carregador de telefone. "Primeiro ela disse, 'mas claro'. Depois viu meu telefone e, num tom desagradável, acrescentou, 'não, para esse aí não'. E você se habitua a este tipo de rejeição."

Os rejeitados do BlackBerry dizem que se expõem cada vez mais à vergonha e à humilhação pública quando observam seus colegas usando aplicativos para redes sociais que não estão disponíveis para eles, tiram fotos em alta resolução e navegam pelas ruas e pela internet com facilidade, com um GPS melhor e um navegador mais rápido.

E a afronta ainda é maior quando precisam recorrer a sócios, colegas, amigos com iPhones e aparelhos Android para algumas tarefas como obter endereços, marcar uma viagem, fazer reserva em restaurantes e ver resultados esportivos. "Sinto-me absolutamente impotente", disse Victoria Gossage. "Você observa constantemente as pessoas fazendo tudo isso com seus aparelhos e tudo o que tenho é meu grupo de família batendo papo pelo BlackBerry."

Mas alguns usuários do BlackBerry dizem estar apegados ao aparelho, principalmente por causa do teclado físico, eficiente, do aparelho.

"Uso meu BlackBerry por opção", disse Lance Fenton, investidor de 32 anos que viaja constantemente e precisa sempre enviar e-mails no caminho. "Não posso digitar e-mails em telefone com tela sensível ao toque."

As mais recentes medidas adotadas pela RIM para conseguir a fidelidade dos clientes e também os dos desenvolvedores de software que estão criando aplicativos para sua próxima geração de telefones, que será lançada no próximo ano, provocou sobressaltos generalizados. Num vídeo promocional recente, Alec Saunders, vice-presidente da RIM para a área de relações com os desenvolvedores, aparece cantando aos berros uma música de rock intitulada, "Devs, BlackBerry vai continuar te amando", refrão de uma balada de 1981 da banda REO Speedwagon, Keep on loving you.

"Isto é sinal de uma empresa desesperada", disse Nick Mindel, analista de investimentos. "Ora, BlackBerry, sempre fui fiel, mas acabaram de perder um cliente. E francamente, não acho que eles podem se permitir perder muitos mais."

Depois de oito anos com um aparelho, Mindel disse que agora entrou na lista de espera pelo iPhone 5. "Quando o aparelho chegar", disse ele, "acho que vou remover a bateria do meu BlackBerry, encher o aparelho de cimento e usá-lo como peso de papel". /