Trajando aparadores nas duas mãos, o técnico da Seleção Brasileira feminina de boxe, Cláudio Aires, andou entre as atletas e se voltou para Roseli Feitosa. "Quer fazer, Rose?", perguntou, mostrando as luvas. A atleta franziu a testa e respondeu polidamente: "meu ombro está ruim hoje". Então virou e voltou a distribuir socos no saco de pancada. Esse é o relacionamento entre comandante e a principal comandada tentando voltar aos trilhos após momento conturbado.

Cláudio e Roseli se desentenderam em outubro de 2011, durante os Jogos Pan-Americanos de Guadalajara. A atleta, campeã mundial em 2010, chegou à competição como favorita, mas foi eliminada na primeira luta e terminou com a medalha de bronze - havia sido beneficiada pelo sorteio, começando direto na semifinal. O técnico a criticou publicamente por treinar pouco, e ela devolveu dizendo que os treinos eram uma porcaria.

"Isso já foi superado, foi uma coisa do calor do momento, da vontade de vencer. Aí você acaba comentando uma ou outra coisa, mas foi tudo resolvido", afirmou Cláudio Aires, que foi dar atenção à atleta em meio ao treinamento conjunto com as seleções da Argentina e Grã-Bretanha. O comando das atividades estava a cargo do técnico argentino Juan Ledesma, o que o deixou livre para orientar devidamente as atletas.

"Nós sentamos e conversamos. Somos todos profissionais, temos que deixar a vaidade de lado um pouco e pensar no boxe. Hoje, a harmonia do grupo todo é muito boa", complementou o treinador, que não se importou em abordar o assunto. Roseli Feitosa, também não. Ela contou que a retomada do contato foi recente, e por necessidades profissionais: "até a luta de sexta-feira (combate organizado contra argentinas e britânicas), a gente nem estava se falando".

"Agora voltamos porque um precisa do outro. Eu vou ter que ouvir ele falando quando subir no ringue. Acho que aquilo teve que acontecer. Nós dois erramos, foi errado eu ter falado aquilo, ter divulgado tudo. A gente não pode mais ficar pensando nisso. O mais importante agora é o Mundial", decretou a atleta, de olho na competição, disputada em maio, que vai definir as classificadas para os Jogos Olímpicos de Londres.

"Hoje, a minha cabeça está diferente e a cabeça dela também. Estamos focados em um só objetivo, que é ir para a Olimpíada de Londres", concordou Cláudio Aires. Espera-se que a retomada do contato profissional reestruture e fortaleça também o laço pessoal entre os dois. A possível classificação para a primeira participação do boxe feminino em uma Olimpíada pode elevar os ânimos para todos de novo. Em Guadalajara, isso foi prejudicial para os brasileiros.