Campus Party reforça: ser humano é o motor da tecnologia

13/02/2012 18:06 - Internet
Por Redação
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Se você pisou pela primeira vez na Campus Party Brasil em 2012, é possível que tenha se surpreendido. Batizado de maior evento geek do planeta, a 5ª edição - que contou com mais de 7 mil computadores conectados a 80 mil metros de cabos de internet e de fibra ótica somados - deixou a tecnologia em segundo plano. Ao final da maior edição de todos os tempos no País, a Campus traz um recado claro de que, para evoluir tecnologicamente, é necessário deixar aspectos técnicos de lado e voltar mais os olhos para o ser humano. É o homem quem irá liderar o mundo para um futuro mais justo, e não as máquinas.

Julien Fourgeaud, um "nativo digital" que é um dos desenvolvedores do famoso jogo para a web, Angry Birds, é categórico ao afirmar a importância do homem dentro da tecnologia. "Eu vim até o Brasil não para falar de um aplicativo de sucesso, mas para reforçar a idéia de que existe um grupo de pessoas, com emoções e sentimentos, por trás de uma ferramenta digital. Elas é que são o sucesso de um aplicativo", afirmou. O professor indiano Sugata Mitra, da Universidade de Newscastle, na Inglaterra, acredita que o ser humano precisa ser mais valorizado como tal, principalmente aqueles que têm a responsabilidade de repassar o conhecimento. "Os professores não podem somente responder a perguntas. Isso a tecnologia, o Google, já faz. O homem precisa instigar a imaginação e usar a criatividade - algo que um robô jamais poderá fazer", explicou.

O tom humanístico do evento seguiu com a presença do veterano de Campus Party, casado com uma brasileira de Curitiba (PR), o americano Kul Wadhwa, diretor-geral da Wikimedia Foundation. Após anunciar a abertura de um escritório no Brasil ainda em 2012, ele se dedicou a apresentar a nova rede social Ayoudo, que pretende aproximar as pessoas pelos laços "humanos" da bondade e da solidariedade ao permitir que os usuários "se ajudem", por meio do site, em tarefas que vão de "precisa-se de mecânico" a "tenho dois dias para aprender a usar o photoshop, alguém me ajuda?". Para reforçar a exaltação do ser humano na atual configuração mundial, a ativista sírio-espanhola Leila Nachawati, o espanhol Olmo Gálvez e o americano Charles Lencher foram uma importante ferramenta para o posicionamento do homem no privilegiado posto central deste evento tecnológico.

"A ação em redes sociais ajuda a furar o poder das grandes corporações midiáticas e dá voz ao povo, que consegue dizer ao mundo o que acontece, fazer vídeos e postar no YouTube", afirmou Lencher, do movimento Occupy Wall Street. Se até o momento, a importância do ser humano frente à tecnologia não estava tão evidente, Nachawati foi certeira ao afirmar que "a luta é feita com sangue, não com a web. A realidade não é um videogame. Tem sofrimento, pessoas sendo torturadas e massacradas". "As revoluções não nasceram com a internet", falou Gálvez, ao ser complementado por Lencher, que afirmou que os três estavam na Campus "para falar dos 99% das pessoas que não têm acesso à comida, à educação e que sofrem todos os dias."
Criatividade e inovação incomodam àqueles a quem a ordem agrada
Outro grande destaque do evento foi o britânico Neil Harbisson, que precisou se tornar o primeiro ciborgue oficialmente reconhecido por um governo para mostrar a importância de o homem lutar pela sua existência. Diagnosticado com acromatopsia, o tipo mais avançado de daltonismo, ele, atualmente, "ouve" as cores por meio de uma webcam que reconhece as cores e emite uma freqüência sonora referente à cor para um chip instalado no crânio, tornando possível o reconhecimento. A intenção dele, no entanto, é contrária à de tornar seres humanos mais computadorizados. Ele quer que os homens tenham mais consciência das possibilidades para tornar a existência mais satisfatória. "Eu não quero vender olhos. Eu quero que as pessoas busquem novas maneiras de enxergar as coisas", afirmou.

A criatividade também é ameaçada por grandes corporações, como a Microsoft e a Apple. O defensor ferrenho do software livre e presidente da Linux International, Jon "Maddog" Hall, afirmou que as companhias que trabalham com softwares proprietários, como as fundadas por Bill Gates e pelo falecido Steve Jobs, são as grandes vilãs da internet. "Elas prendem o usuário", disse, salientando que tais empresas fornecem pouco espaço para que os usuários realmente consigam imaginar algo diferente, uma vez que o "prendem" cada vez mais dentro do seu próprio círculo de produtos.

Longe do mundo da tecnologia, os músicos Emicida, Gaby Amarantos e MV Bill têm uma visão similar à de "Maddog", mas aplicada ao universo musical. "A revolução tem que começar de cima para baixo. A gravadora tem que sofrer, não o povo", falou Emicida sobre a discussão de leis que, ao tentarem proteger a propriedade intelectual do autor, acabaram por beneficiar as grandes corporações, que visam o lucro, como é o caso do Sopa e do Pipa nos Estados Unidos. "Para mim, não é pirataria quando eu compartilho a minha música sem um grande selo. O artista é dono da música", complementou Amarantos, que encontra coerência na ideia de Bill de que a internet precisa se manter livre em benefício das pessoas.

O discurso é, ainda, compartilhado pelos representantes do Partido Pirata do Brasil, que será fundado em 2012 e tentará concorrer às eleições gerais de 2014. Acompanhado de Leandro Chemalle, Carlos Braga reforçou a noção de que o camelô, no Brasil, é o grande promotor da cultura e da internet para as grandes massas. "Eu ando de trem no Rio de Janeiro. A maior parte das pessoas que estão lá usa os celulares chineses e baixa conteúdo. Elas estão tendo acesso e aprendendo. Se você cortar isso, você fará com que o povo tenha um retrocesso na cultura", evidenciou.

E o homem sobreviverá ao final do universo
Desenhando um futuro em que as máquinas farão o trabalho braçal no mundo e a nanotecnologia terá se desenvolvido a um estágio tão avançado que o câncer deixará de existir, o "físico do impossível", Michio Kaku, falou que a humanidade não chegará ao fim com o "congelamento" do universo, que deve acontecer dentro de alguns bilhões de anos. "Quando o nosso universo chegar ao fim, teremos desenvolvido certamente uma tecnologia para que continuemos vivos e perpetuando a espécie", falou, indicando que é possível que haja "passagens" entre diversos universos que coexistem com aquele em que a humanidade vive.

Para isso, porém, o homem precisará lutar pela sobrevivência com o uso da criatividade, emoção, talento, inovação - qualidades que robôs jamais terão, porque "afinal, eles têm o cérebro de um inseto", brincou o físico. O ser humano precisa, segundo Kaku, tomar a frente dessa nova onda de inovação e colocar o homem como o líder que usa o "bem intelectual" como moeda de troca.

A 5ª edição da Campus Party não negou a vocação tecnológica da humanidade ou do evento, tampouco minimizou a importância das conquistas lideradas pela tecnologia para um futuro cada vez mais justo e igualitário. O que ela fez, em 2012, foi, com uma tônica mais social, posicionar o homem no centro do processo evolutivo, como único motor capaz de controlar os acontecimentos, porque, como disse Kadhwa, da Wikimedia, "os homens precisam saber que eles têm o direito de controlar o próprio futuro". Os homens, e não as máquinas tecnológicas.

Campus Party 2012
A Campus Party, o maior evento geek do planeta, realizado em mais de sete países, aconteceu entre os dias 6 e 12 de fevereiro de 2012. A sede foi o Pavilhão de Exposições do Anhembi Parque, na zona norte de São Paulo (SP). Pelo quinto ano consecutivo no Brasil, a edição de 2012 já começou batendo recordes: todas as entradas foram vendidas em 22 dias em setembro do ano passado.

Com 7,5 mil participantes, sendo 5,5 mil acampados no local, a Campus Party ofereceu neste ano mais de 500 horas de conteúdo. Os principais nomes desta edição foram Michio Kaku, conhecido como o "físico do impossível", Sugata Mitra, pesquisador e professor de Tecnologia Educacional da Newcastle University, Julien Fourgeaud, gerente de produtos e negócios da Rovio e Vince Gerardis, co-fundador da Created By, entre outros.

A programação do evento teve transmissão ao vivo pelo http://live.campus-party.org e aqueles que quiseram interagir com a transmissão pelas redes sociais puderam enviar perguntas para os palestrantes. As hashtags exclusivas para cada uma das áreas de conteúdo eram: Ciência - #cpbrCI; Cultura Digital - #cpbrCD; Entretenimento Digital - #cpbrED; Inovação - #cpbrIN e Palco Principal - #cpbrMainStage. A hashtag oficial do evento é #cpbr5.

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