Uma carta escrita pelo ex-editor do tabloide "News of The World" Clive Goodman afirma que as escutas ilegais --que levaram ao fechamento da publicação e a um inquérito público-- eram discutidas abertamente na redação e endossadas expressamente pelos jornalistas na chefia da publicação.
Goodman estava no centro do primeiro momento escândalo de escutas ilegais realizadas pelo tabloide para obter informações exclusivas. Em 2006, ele e o detetive particular Glenn Mulcaire foram condenados a quatro e seis meses de prisão respectivamente por grampear funcionários e membros da família real.
A carta, obtida pelo jornal britânico "The Guardian", foi escrita por Goodman há quatro anos, depois do fim de sua sentença.
Nela, Goodman alega que as escutas ilegais de mensagens de voz deixadas nos celulares eram feitas com "total conhecimento e apoio" da liderança do jornal.
Na época, os executivos do "News of the World" disseram ao governo britânico que não havia evidência de que ninguém além de Goodman usava grampos ilegais. O repórter foi demitido da empresa e o problema foi considerado resolvido.
A carta de Goodman foi direcionada ao diretor de RH do conglomerado News International (do qual o tabloide fazia parte), Daniel Cloke, e datada de 2 de março de 2007. Nela, ele argumenta que nunca deveria ter sido demitido porque agia com apoio da chefia.
Goodman afirma ainda que outros membros da equipe do "News of the World" estavam hackeando telefones, acrescentando que "esta prática era amplamente discutida na reunião editorial diária, até que referência explícita a ela foi banida pelo editor".
O "Guardian" diz que os nomes dos envolvidos foram removidos da carta pela polícia, que está investigando as denúncias. Na época da primeira investigação, em 2006, a polícia afirmou que não havia indícios de outros repórteres usando a prática --o que levou a suposições de que o jornal teria pago os agentes para encerrar a investigação.
Em julho, o escândalo ganhou novas proporções com denúncias de que vítimas de crimes e até familiares de soldados mortos nas guerras do Afeganistão e Iraque foram grampeados. Há ainda relatos de que o tabloide teria pago propina a policiais por informações.
A comandante da Operação Weeting, que investiga os grampos, Sue Akers admitiu ao Parlamento que há uma lista de 3.870 nomes, 5.000 telefones fixos e 4.000 celulares, de pessoas que podem ter sido vítimas das escutas ilegais. A polícia investiga separadamente as denúncias de suborno de policiais.
O "News of The World" pertencia ao grupo News Corporation (News Corp.), um dos maiores conglomerados mundiais de mídia, pertencente a Rupert Murdoch.
Diante do Parlamento, Murdoch, seu filho James, e a ex-presidente-executiva da News Corporation Rebekah Brooks negaram saber das escutas ilegais e disseram estar chocados com a extensão do escândalo.
O tabloide era o jornal mais vendido aos domingos no Reino Unido, com uma circulação média de quase 2,8 milhões de exemplares. Sua última edição, com o título "Obrigado e Adeus", circulou no dia 10 de julho, após decisão de Murdoch de fechar a publicação de 168 anos.
O escândalo também teve repercussão nos negócios de Murdoch. Ele se viu obrigado a retirar a oferta de adquirir a totalidade das ações do canal pago BSkyB, da qual já possui 39%.
O "Guardian" alega que a carta faz parte de vários documentos que serão publicados pelo Comitê de Cultura, Mídia e Esportes do Parlamento, que investiga o novo escândalo de escutas.