O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) afirmou nesta quarta-feira que vê uma possível "crise séria" entre Brasil e Itália em consequência da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela não extradição do ex-ativista Cesare Battisti. As informações são da Agência Ansa.

Segundo Buarque, que é vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, sua impressão é de que essa crise não vai ser tão passageira. Para o senador, os ânimos estão muito exaltados a ponto de haver "um clima de Copa do Mundo" em torno de Battisti.

Buarque ainda afirmou que teme que Battisti corra algum perigo, não só por causa da possibilidade de ter algum italiano exaltado e queira armar alguma represália, mas também porque, segundo ele, pode haver brasileiros descontentes com a estadia dele no País.

Em sinal de protesto contra a decisão do STF, o governo do primeiro-ministro Silvio Berlusconi convocou, na semana passada, seu embaixador em Brasília e anunciou que levará o caso ao Tribunal de Justiça Internacional, em Haia.

Hoje, o chanceler da Itália, Franco Frattini, informou que, "até 25 de junho, será apresentada a demanda ao Comitê de Conciliação", que representa uma "pré-condição ao recurso" em Haia.

Apesar disso, o governo brasileiro tem insistido que as diferenças em relação ao caso não afetam os "excelentes" vínculos com o país italiano. Na segunda-feira, o embaixador brasileiro na Itália, José Viegas Filho, afirmou que as desavenças não vão alterar os laços entre Roma e Brasília.

Caso Battisti
Ex-integrante da organização de extrema-esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), Cesare Battisti foi condenado pela Justiça italiana à prisão perpétua por quatro assassinatos, ocorridos no final da década de 1970. O italiano nega as acusações. Depois de preso, Battisti, considerado um terrorista pelo governo da Itália, fugiu e se refugiou na América Latina e na França, onde viveu exilado por mais de 10 anos, sob proteção de uma decisão do governo de François Miterrand. Quando o benefício foi cassado pelo então presidente Jacques Chirac, que determinou a extradição de Battisti à Itália, o ex-ativista fugiu para o Brasil em 2004. Encontrado, ele está preso no País desde 2007.

O então ministro da Justiça, Tarso Genro, sob o argumento de "fundado temor de perseguição", garantiu ao italiano o status de refugiado político, o que em tese poderia barrar o processo de extradição que o governo da Itália havia encaminhado à Suprema Corte brasileira. Ainda assim, o caso foi a julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) no final de 2009, quando os magistrados decidiram que o italiano deveria ser enviado a seu país de origem, mas teria de cumprir pena máxima de 30 anos de reclusão, e não prisão perpétua como definido pelo governo da Itália. Na mesma decisão, no entanto, os ministros definiram que cabe ao presidente da República a decisão final de extraditar ou confirmar o refúgio a Battisti.

No dia 31 de dezembro de 2010, último dia de seu governo, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu não extraditar Battisti à Itália, com base em parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que levantava suspeitas de que a ida do ex-ativista a seu país de origem poderia colocar em risco a sua vida. Segundo o documento, a repercussão do caso e o clamor popular tornariam o futuro de Battisti "incerto e de muita dificuldade" na Itália.

Três dias depois da decisão de Lula, a defesa de Battisti entrou com um pedido de soltura no STF, mas o governo italiano pediu ao Supremo o indeferimento da petição alegando "absoluta falta de apoio legal". Na ocasião, o presidente do STF, Cezar Peluso, negou a libertação imediata e determinou que os autos fossem encaminhados ao relator do caso, ministro Gilmar Mendes. No dia 3 de fevereiro, o governo italiano encaminhou STF um pedido de anulação da decisão de Lula, acusando-o de não cumprir os tratados bilaterais entre os dois países.

Os recursos foram julgados no dia 8 de junho de 2011. Primeiro, O plenário decidiu que o governo da Itália não tinha legitimidade para contestar a decisão de Lula. Em seguida, o STF determinou a liberdade imediata do italiano por entender que não cabe ao Supremo contestar a decisão "soberana" de um presidente da República. Com o fim da sessão, o alvará de soltura de Battisti foi encaminhado para a penitenciária da Papuda, em Brasília, de onde ele saiu nos primeiros minutos do dia 9 de junho, após quatro anos preso.