Fernando Portugal é capitão da Seleção Brasileira de rúgbi desde 2007. Tem 29 anos, muitos deles dedicados à modalidade, mas nunca viu o esporte que ama viver um momento parecido ao atual. Desde o ano retrasado, quando foi integrado ao programa dos Jogos Olímpicos de 2016, o rúgbi do Brasil viu seu orçamento decolar. E com isso atinge resultados históricos.

De acordo com Antônio Martoni, diretor da Confederação Brasileira de Rugbi (CBRu), os incentivos recentes chegam a quase R$ 2 milhões se totalizadas as verbas para os times masculino e feminino. Os responsáveis pelos aportes são o Comitê Olímpico Brasileiro e o Ministério dos Esportes (para mais detalhes, ver links relacionados).

Mas não é só isso: grandes empresas como a Topper e o Bradesco se juntaram para apoiar a Seleção. Surgiu ainda uma associação (Grupo de Apoio ao Rúgbi Brasileiro) formada por notáveis simpatizantes do esporte, que tentam usar sua influência para angariar recursos. "Em 2007, a ESPN transmitiu a Copa do Mundo e já houve um aumento de praticantes. O filme Invictus (sobre Nelson Mandela, com Morgan Freeman e Matt Damon) e as propagandas da Topper ajudaram muito também", acredita Martoni.

Esse cenário de evolução e com recursos financeiros parece até um sonho para Fernando Portugal, um dos poucos de sua geração que seguem em atividade no rúgbi brasileiro. Em sua essência, o capitão da Seleção tem uma história de vida toda dedicada ao esporte que, no Brasil, é praticamente desconhecido. Até como servente de pedreiro, na Itália, Fernando já se aventurou. "Já passei por maus momentos de grana. A família faz pressão, a namorada. 'E aí, não vai trabalhar?'. Sou bom no que faço, consigo fazer bem, mas ninguém me paga", reclama.

Pagava, talvez, seja a afirmação precisa. Fernando Portugal tem o auxílio do bolsa atleta, que significa R$ 1500 por mês. "Ainda comento jogos, dou treinos para duas equipes e coordeno um projeto na base do Bandeirantes", conta o capitão, que até tem um site próprio - o Rugby Spirit. Ainda assim, o esporte não atingiu a era do profissionalismo no Brasil. "Digo que a gente é amador de luxo. Ninguém ganha nada". Na modalidade, os treinos são noturnos, pois cada jogador tem sua própria fonte de renda alternativa.

As aventuras do capitão

Em 2005, Fernando se cansou da falta de possibilidades em evoluir como jogador de rúgbi no Brasil. Não tinha recursos, mas partiu para a Itália. "Fui sem grana nenhuma. Sem conhecer ninguém. Fui batendo na porta dos outros, literalmente camelando. Consegui um time semi profissional para jogar, mas não pedi um salário com medo que me dispensassem. Os outros estrangeiros recebiam, mas fui humilde", lembra.

O jeito então foi pagar as contas com um novo ofício. Os atributos físicos ajudaram e então ele iniciou um trabalho incomum para atletas: servente de pedreiro. "Trabalhava carregando sacos de cimento. Foi um ano assim. Eu quebrava a casa toda, tirava os entulhos e trazia o material todo para o pedreiro", lembra. Com mil euros mensais, Fernando só conseguia pagar as contas. Sequer tinha carro.

Depois de toda uma temporada jogando sem ser pago, então ele resolveu conversar. Falou com o presidente: "nunca faltei em treino, joguei todos os jogos, cumpri meu contrato e me acharam um jogador sério. Como eu tinha ido bem, resolveram me pagar". A experiência mudou Fernando Portugal: "passei dificuldades, tive uma grande luta e, como ser humano, também foi demais".

Na ocasião, ele começou a ensinar rúgbi para crianças em escolas italianas, o que abriu um novo horizonte em sua vida. Na volta ao Brasil, ele se desvinculou da fisioterapia, que já havia estudado, e passou a se dedicar à educação física. Assim, agregou conhecimento para viver com recursos do esporte pelo qual era apaixonado.

Os resultados históricos da Seleção Brasileira

No último Sul-Americano, disputado em fevereiro, a Seleção Brasileira masculina de rúgbi conquistou resultados jamais atingidos. Venceu a Argentina, o que não ocorria com qualquer equipe do continente há 85 anos. Com um comemorado terceiro lugar, também se garantiu nos Jogos Pan-Americanos de Guadalajara. No feminino, ampliou sua hegemonia com o heptacampeonato.

Na avaliação de Fernando Portugal, há relação direta entre o crescimento dos recursos e os recentes bons resultados. "Hoje, podemos treinar mais com a Seleção. Antes só nos juntávamos um fim de semana antes do início de competições", compara. As diferenças existem até em questões aparentemente básicas.

"Pagávamos estadia, treino, viagens. Mudou totalmente o perfil da preparação e fizemos três torneios antes do Sul-Americano. Não havia preparo psicológico e a gente não sabia como se comportar. Com meses de incentivo, e nem foram muitos, já vimos um resultado". Nos Jogos de 2016, quando o rúgbi efetivamente entra no calendário olímpico, Fernando terá 35 anos. Ele só espera poder desfrutar um pouco mais.