Houve uma grande transformação na internet nos últimos dois anos, desde que o jornalista, escritor e ex-empreendedor do Vale do Silício Andrew Keen lançou seu manifesto contra o idealismo da web 2.0, o livro O Culto do Amador (Zahar, R$ 39). Na época, mal havia Twitter, e o Facebook ainda contava seus primeiros milhões de usuários. Hoje, ambos são grandes sucessos exatamente porque focaram no que Keen mais criticava: o amador, o usuário da web.

 

Keen, no entanto, não recuou. Ele esteve em São Paulo há duas semanas e, em conversa com o Link, disse que muito do que aconteceu nestes dois anos comprovou que O Culto do Amador estava certo. “A incapacidade de capitalização da maior parte da web 2.0 prova meus argumentos. A decisão da Wikipedia de ter editores reais para checar os verbetes e a preocupação com o aumento do poder do Google também”, enfatiza.

 

O Andrew Keen ao vivo é menos radical e raivoso do que o Keen crítico do livro, ainda que mantenha a posição de que o conhecimento e a cultura da sociedade – representados pela indústria cultural pré-internet – estão sendo minados pelo “culto” ao conteúdo produzido por qualquer pessoa na internet.

 

Keen reconhece que muitos de seus argumentos são exagerados e pondera que há, sim, conteúdo bom na internet. “Eu deveria ter explicado que a mídia tradicional também tem uma parte ruim que alimenta o ‘culto ao amador’. Esse lado ruim, que inclui reality shows, enfraquece autoridades, especialistas e a credibilidade dos profissionais.”
Ele sabe também que, além de amadores, há novos profissionais se formando na internet. Os blogs, que Keen sempre criticou, ficaram muito mais parecidos com sites de notícias. “Se o Techcrunch, que tem uma equipe de escritores contratada, é um blog, então tudo é um blog. Então o <CF576>New York Times</CF> é um blog. A palavra não faz mais sentido, da mesma forma que falar em ‘web 2.0’ se tornou redundante. ”

 

 

CAUDA CURTA

 

Não faltam pontos em comum entre Keen e Chris Anderson, autor de A Cauda Longa (Campus, R$ 49,90). Mas enquanto o primeiro critica o conteúdo na web, o segundo mostra como a rede cria oportunidades de negócios baseadas na oferta infinita de produtos. Keen confessa que escreveu o O Culto do Amador como uma “resposta clara” à Cauda Longa, mas concorda com o argumento do livro mais recente de Anderson, (Free!, Campus, R$ 49,90), de que a economia digital é “a realidade” e que é cada vez mais difícil proteger cópias com direitos autorais.

 

“O que eu critico é a ideia de que não há nada além do mercado livre, que não há espaço para a cultura já que livrarias, museus, jornais serão extintos. O que sobrará são superlojas digitais. A digitalização tira os custos, mas também tira o dinheiro da jogada. Há um sentimento de que o consumidor ganha por causa da conveniência, mas, na verdade, ele perde porque não haverá como cobrir os custos de fazer um produto com qualidade.”

 

Ou seja, a cultura digitalizada – sejam filmes, músicas ou livros – traz consequências graves. Com preços baixos, o trabalho daqueles que ficam entre o consumidor e o autor, os intermediários, é menosprezado. E são estes que fazem com que estes bens culturais cheguem às prateleiras com qualidade. “A tecnologia se tornou uma espécie de religião”, diz, referindo-se ao fervor de entusiastas do conteúdo digital.

 

Seu próximo livro será feito de críticas a outra “religião”: o entusiasmo com a mídia social. Keen quer comparar os efeitos das redes sociais na sociedade – “de isolamento, solidão e desigualdade” – com as mudanças ocorridas depois da Revolução Industrial. E promete que não será tão radical desta vez.