Vinte agentes da Polícia Federal (PF) cercaram na última
sexta-feira (5) uma boate no em Bento Gonçalves, no Rio Grande
do Sul, à procura de jovens mantidas como escravas sexuais. No
local, que é endereço de uma casa de prostituição investigada
por fazer parte de um esquema de tráfico de pessoas, foram
encontradas 16 garotas.
A denúncia foi feita pelo Fantástico. Depois de
assistir, domingo passado, à reportagem em que uma mãe pedia R$
500 para vender a própria filha, uma jovem procurou o
Fantástico. Por telefone, ela denunciou que vivia em cárcere
privado na boate gaúcha e que fazia programas sexuais para pagar
dívidas com os donos do lugar.
Por telefone, ela contou que tem uma dívida. Ela
foi aliciada na cidade em que vivia, no Pará, a mais de dois mil
quilômetros de Bento Gonçalves. Ela conta que está na boate
“Recanto das Camélias”.
No local, além dos quartos para programas sexuais,
os donos mantêm nos fundos da boate um alojamento. São pequenos
dormitórios, onde as jovens podem passar a noite ou ate morar.
Não há ventilação, nem higiene e o espaço é mínimo. Era assim
que vivia a moça que pediu ajuda. Ela estava na boate dividindo
um dos quartos com outras duas garotas de programa. Ela estava
assustada, chorando muito, mas convicta.
Se a polícia não tivesse chegado, a jovem teria
que pagar R$ 1,5 mil para conseguir a liberdade de volta. A
origem da dívida estava ali mesmo, dentro da casa de
prostituição.
“Hoje, neste momento, nós temos reféns em vários
lugares do Brasil, dentro de casas de prostituição, de massagem
ou em vários lugares”, afirma a deputada federal Maria do
Rosário (PT-RS), relatora da CPI contra a exploração sexual.
O que também chamou a atenção dos agentes foi uma
espécie de loja que fica atrás da boate, com maquiagem, perfume
e roupas – produtos que seriam vendidos apenas para as garotas
de programa. A lojinha tem preços altos. Uma calça, por exemplo,
custa R$ 219; uma sandália, R$ 320; um casaco, R$ 350.
Cadernos encontrados na boate revelam que, mesmo
fazendo vários programas por noite, as garotas recebiam pouco. A
maior parte do dinheiro era pra abater as dívidas. Só de uma
jovem, os donos queriam receber R$ 10 mil.
“Eu fiz um acordo pra pagar por mês R$ 200 ou R$
300”, diz a menina.
“Essa divida é impagável. Dessa forma elas acabam
vivendo numa situação semelhante mesmo a escravas”, afirma o
delegado da Polícia Federal Noerci da Silva Melo.
O dono da boate e a mulher dele já tinham sido
presos em 2005, acusados de tráfico de pessoas e de manter
mulheres em condições de escravidão. Foram absolvidos em
primeira instância, mas o Ministério Público recorreu.
O dono da boate, Roque Milani, que agora foi preso
em flagrante, tentou se defender. “Tem tanta gente errada nesse
mundo aí. Se eu estou errado, me condene”, disse.
As garotas de programa prestaram depoimento e
receberam ajuda para voltar para casa. Para a polícia, o
silêncio é a maior dificuldade para combater esse tipo de crime.
“Quem me garante que eu vou embora e eles não podem me procurar
depois?”, pergunta uma jovem.
A jovem que pediu socorro está no programa de
proteção à testemunha e foi levada para outro estado. Ela diz
que enfrentou tudo por um único motivo. “Saudade do meu filho”,
diz.
“A esperança que se tem é de que essas pessoas
sejam efetivamente punidas e que isso sirva como lição. Não só
para elas como para outras também que tentem praticar essas
atividades ilícitas”, afirmou o delegado da Polícia Federal
Noerci da Silva Melo.